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Os deputados que foram reembolsados pela Câmara por gastos excessivos com gasolina serão investigados pela Corregedoria da Câmara e poderão vir a responder a processo de cassação de mandato. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), disse que encaminhará ainda hoje para a Corregedoria a denúncia publicada ontem pelo GLOBO de mau uso do dinheiro da verba indenizatória — os R$ 15 mil mensais a que os deputados têm direito para ressarcimento de gastos com a manutenção do escritório parlamentar nos estados.

Um dos investigados será Francisco Rodrigues (PFL-RR), o deputado que mais recebeu reembolso por supostas despesas com gasolina este ano: R$ 60 mil. Em entrevista, Rodrigues admitiu que apresenta notas de consumo de combustível para justificar outros gastos. E foi acusado pelo gerente de um posto de gasolina em Boa Vista, Roraima, de abastecer os caminhões de sua empresa com o combustível que posteriormente cobra da Câmara.

No ano passado, a Câmara repassou R$ 41 milhões para os deputados como reembolso de despesas com combustível. Até o momento, Rodrigues foi o único parlamentar que admitiu que usa notas fiscais de combustível para justificar despesas como almoços e aluguel de barcos.

— Vou mandar o que foi publicado para a Corregedoria analisar — disse Aldo.

Aldo não comenta gastos do corregedor

O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), cobrou ontem explicações do deputado Francisco Rodrigues (PFL-RR) sobre o uso de notas fiscais de combustíveis para justificar outros gastos:

— É ilegal fazer isso e está fora do padrão que se espera de um deputado. As denúncias são graves e precisamos de uma explicação urgente da parte dele. Cabe à direção da Casa tomar as providências cabíveis no caso dele e de outros deputados que tenham gastos irregulares de recursos.

Para Maia, se as explicações de Rodrigues não forem satisfatórias, os órgãos da Câmara responsáveis têm de investigar e decidir quais as punições cabíveis.

— Mas, de fato, a situação é grave. No limite, ele terá de devolver os recursos e a direção terá de avaliar que punições cabem em relação ao mandato — acrescentou Maia, ressalvando que vai ouvir as explicações do deputado sobre o assunto.

O próprio corregedor da Câmara, Ciro Nogueira (PFL-PI), é um dos que concentram os gastos em combustível e é reembolsado em valores entre R$ 9 mil e R$ 12 mil mensais. Aldo evitou entrar no mérito da denúncia contra Ciro, ressaltando que esse é o papel da Corregedoria:

— Não posso considerar ninguém impedido ou desimpedido. Essa é a função da Corregedoria.

No Tribunal de Contas da União (TCU) a expectativa é que o processo aberto no órgão denunciando os gastos excessivos e injustificados da verba indenizatória pelos deputados, que está parado há dois anos e meio, tenha andamento com a reportagem de O GLOBO. Provocada pelo procurador federal Ronaldo Pinheiro Queiroz, a fiscalização pelo TCU estava paralisada nas mãos do relator Lincoln Magalhães da Rocha, aposentado na semana passada por idade. Agora, um novo relator será nomeado para o processo.

— É possível que, em razão da reportagem, o processo ande — disse o procurador-chefe do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Furtado.

Incorporar a subsídio não é consenso

Segundo ele, a criação da verba indenizatória não é ilegal, mas o sistema de verificação implantado pela Câmara "favorece a fraude":

— Não existe um sistema para verificação da autenticidade das notas. A maioria é fria. O máximo que o TCU pode fazer é sugerir um mecanismo de controle mais eficaz.

O presidente da Câmara disse acreditar que a discussão sobre a verba indenizatória e o sistema de controle será aberta. O deputado tem de apresentar notas fiscais das despesas até o limite de R$ 15 mil e assinar a prestação de contas, responsabilizando-se pelos dados. Uma das alternativas, segundo Aldo, é incorporar o valor aos vencimentos dos deputados, que ficariam em R$ 27.847,20. Mas a proposta não tem consenso nem mesmo na Câmara.

— Nesse caso, seria pago Imposto de Renda sobre o valor total e a fiscalização não ficaria submetida ao sistema atual, que envolve muitos funcionários para controlar tudo. Eles agem de boa-fé e não têm como achar que uma nota é falsa — disse Aldo.

Os desvios no uso da verba indenizatória foram condenados por líderes partidários, que cobraram providências da direção da Câmara. O líder do PSDB, Jutahy Júnior (BA), acredita que as denúncias podem pôr em risco o funcionamento do sistema de ressarcimento, que ele considera fundamental para a atividade parlamentar.

— O ressarcimento foi instituído na presidência do Aécio Neves (em 2001), para permitir que os deputados se movimentassem pelos estados, na sua atividade parlamentar. O fundamental é que isso seja feito com lisura. Quem praticou irregularidades tem de ser responsabilizado pela fraude e fraude é crime — disse o tucano.

Ele acredita que a Câmara tem os instrumentos para punir os deputados que cometeram abusos com a verba de gasolina, e que caberá à Mesa Diretora da Casa a abertura de procedimentos disciplinares e de investigação contra estes deputados.

O líder do PT, Henrique Fontana (RS), disse que a apuração da denúncia de uso irregular de notas fiscais para ressarcimento da verba de auxílio de combustível tem de ser ampla e não pode ficar restrita ao Conselho de Ética:

— Esse caso tem de ser analisado pelo Conselho de Ética, pela Corregedoria, pelo Tribunal de Contas da União e até pela Justiça Eleitoral. Esse gasto é facilmente verificável. Nos Estados Unidos, os parlamentares prestam contas dessa verba à sociedade, que cobra a forma como é gasta.

O líder do PSOL, Ivan Valente (SP), afirmou que todas as denúncias são um absurdo e que a Mesa Diretora da Câmara tem a obrigação de abrir um procedimento na Corregedoria da Casa com as informações da reportagem.

— Temos de ver qual o tamanho da ilegalidade dessas denúncias. Politicamente é um absurdo. É bom apurar tudo e punir os culpados, senão desmoraliza o uso da verba que é necessária à atividade parlamentar. Os gastos devem ser razoáveis.

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