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O recesso branco a que os senadores se dedicaram nos últimos meses ajudou a manter um dos mais antigos e graves apagões que se abatem sobre o Brasil: o apagão da memória. O remédio esta à disposição do Senado faz tempo. Trata-se do projeto que cria a Lei de Acesso a Informações Públicas no Brasil. Coisa que qualquer democracia digna do nome deve ter. Mas o recesso impediu que chegássemos lá, pelo menos por enquanto.

A ideia do projeto não é nova. Lula, em sua campanha pela reeleição, em 2006, garantiu que aprovaria a lei. Com o presidente reeleito, logo se viu qual seria o ritmo de andamento da proposta: é o mesmo de tudo aquilo que não dá benesses aos políticos nem garante voto na próxima eleição. Para se ter uma ideia, o projeto só foi mesmo encaminhado ao Congresso em 2009.

A aprovação na Câmara aconteceu no início deste ano. Se desde lá os senadores tivessem se mexido, Lula a essa altura já teria de novo o projeto na mão para sancioná-lo. Em breve, os brasileiros poderiam, com garantia legal, passar a requisitar documentos importantes sobre a vida do país. Poderiam, por exemplo, solicitar dados sobre os anos de chumbo da ditadura. Ou sobre o funcionamento do Senado, quem sabe?

Pois bem durante a parada para a eleição os senadores se lembraram de indicar um relator para o projeto. Escolheram o suplente José Bezerra, do DEM do Rio Grande do Norte. O titular, Agripino Maia, claro, estava licenciado para a campanha. Bezerra queria levar o caso adiante. "Pensava em fazer audiências públicas, discutir com a sociedade e depois dar o parecer", conta.

Não foi o que aconteceu. O Senado debandou para a campanha. Bezerra não conseguiu nem marcar uma única reunião sobre o tema. Para piorar, no fim de sua interinidade ainda pegou uma pneumonia que lhe impediu o trabalho por mais uns dias. Acabou se rendendo: admitiu que não conseguiria entregar a tempo o seu parecer.

Na semana que entra, Agri­­pino Maia, tendo obtido a vantagem pessoal que desejava [sua reeleição], retoma o mandato com mais oito anos garantidos. Bezerra lhe cede o lugar. E caberá ao presidente da comissão, senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), indicar um novo relator para o caso.

Mas é de se prever que com poucas sessões antes do fim do ano e ainda com todo o trabalho atrasado em função da pausa para as eleições não haverá prioridade para o projeto. Tudo deve ficar para o ano que vem, depois de fevereiro, quando tomam posse os novos senadores.

Até lá, o Brasil permanecerá atrás de países que costumamos tratar como democracias menores, como Honduras, Belize e Panamá. Em todos eles, o cidadão que quiser saber algo sobre o funcionamento de sua república tem seu direito garantido por lei.

No Brasil, se alguém quiser saber algo, corre o risco de ouvir o que ouviu a doutoranda Adriana Satemy. Ao solicitar informações sobre os anos da ditadura ao Arquivo Nacional, ela teve como resposta um sonoro não. A explicação teve tudo a ver com a política brasileira. Jornalistas estariam interessados nos documentos para fins eleitorais.

Mais uma vez, a política partidária ganhou a parada. Quem perdeu? A memória do país. Se fosse em Belize, o final teria sido outro.

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