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Entre a limpeza ética e a étnica

Dilma Rousseff não pode confundir uma limpeza "ética" com uma limpeza "étnica" no governo. O trocadilho partiu do deputado federal Chico Alencar (PSol-RJ) na quarta-feira, horas antes do pedido de demissão do ministro da Agricultura, Wagner Rossi. São palavras quase proféticas.

Rossi despediu-se da Es­­planada com uma carta melancólica. Disse ser vítima de uma "campanha insidiosa", a qual respondeu com "documentos comprobatórios" que a imprensa "solenemente ignorou". Ao final, disse confiar que a "querida" presidente vai superar o período de sordidez.

Dilma respondeu com um comunicado surpreendente. Falou que lamentava a saída de Rossi, "que deu importante contribuição ao governo". Também reclamou que o ex-ministro não contou "com o princípio da presunção da inocência".

De volta ao jogo de palavras, é bom lembrar como foram as notas oficiais do Palácio do Planalto sobre as três demissões anteriores à de Rossi. Um texto divulgado no dia 7 de junho também dizia que a presidente lamentava a "perda de tão importante colaborador". Tra­­­tava-se, é claro, do petista An-­­­ tonio Palocci.

Um mês depois, Alfredo Nas­­­cimento foi varrido do Ministério dos Transportes. Para o presidente do Partido da República (PR), nada de colocações açucaradas. O único comunicado formal sobre o assunto só saiu cinco dias depois – tinha três linhas, não mencionava Nascimento e dizia que Paulo Passos havia aceitado o convite para assumir a pasta.

No dia 4 de agosto, foi a vez de Nelson Jobim ser rifado do Ministério da Defesa. Das quatro baixas, foi a única que não envolveu denúncias de corrupção. Peemedebista, mas sem vínculos com a atual cúpula do partido, Jobim também não foi agraciado com termos de agradecimento por meio de uma nota oficial.

Na prática, esses textos significam muito pouco, mas expõem a questão "étnica" à qual se referiu Chico Alencar. Eles desnudam o tratamento diferenciado na tal faxina de Dilma. Quem é puro-sangue, ou melhor, sangue-azul, é digno de lamentações – já os vira-latas...

Afinal de contas, é bem mais fácil brigar com os cachorros pequenos. Não que o PR não mereça um puxão de orelha, mas o partido não tem condições numéricas de peitar o Planalto no Congresso Nacional. Por isso reagiu vergonhosamente posicionando-se apenas como "independente" (leia-se amigo colorido do governo), ao invés de partir direto para a oposição.

Mas há uma metáfora ainda melhor. A diferença de tratamento fica mais evidente na destinação do material expurgado na limpeza. Quando se trata de PT e PMDB, tudo é reciclável, enquanto o resto é lixo úmido, vai para a vala comum.

Foi exatamente o que aconteceu com a troca na Agricultura. Saiu um apadrinhado do vice-presidente Michel Temer e quem indicou o substituto, Mendes Ribeiro, foi a bancada peemedebista na Câmara dos Deputados. Para quem não lembra, Temer presidia o PMDB e a Câmara dos Deputados até o ano passado.

Assim fica difícil saber até onde vai a faxina de Dilma. É louvável que a presidente se coloque como alguém intolerante à corrupção. Preocupante é não ter certeza do que ela realmente entende como sujeira.

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