Como todo brasileiro deveria saber, no meio dos palácios do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF) há a Praça dos Três Poderes. Trata-se de um lugar pouco aprazível, sem árvores, uma espécie de limbo no núcleo de Brasília. É o lugar simbolicamente reservado ao povo no centro das principais decisões da República.
Pois a proposta idealizada pelo urbanista Lúcio Costa acabou sendo ainda mais representativa do que ele pensava. Enquanto as pessoas comuns tomam sol na cabeça, juízes, parlamentares e presidente refrescam-se no ar condicionado, isolados do que ocorre lá fora. Muitas excelências pensam que a situação deve continuar desse jeito.
Na semana passada, o presidente do STF, Cezar Peluso, disse que os magistrados brasileiros têm sofrido uma "pressão imprópria", recheada de manifestações de "autoritarismo" e "desrespeito à convivência democrática". Mais além, afirmou que apenas uma "nação suicida" se colocaria por vontade própria contra as decisões do Judiciário. As declarações foram feitas horas antes de o Supremo começar a julgar o alcance dos poderes de investigação de juízes por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Depois, Peluso não esteve entre os seis ministros que derrubaram a liminar que impedia o CNJ de apurar, antes das corregedorias locais, denúncias de desvios cometidos por magistrados. Claro que o presidente do STF tem o direito e o dever de defender o Judiciário com unhas e dentes. Mas isso não pode significar que a opinião pública deve se calar.
A pressão social faz parte do jogo. Foi legítimo, por exemplo, o papel exercido pela Ordem dos Advogados do Brasil, Associação Brasileira de Imprensa e Conferência Nacional dos Bispos do Brasil a favor do CNJ. E se os ministros tivessem se colocado contra a prerrogativa de investigação do conselho, todas essas entidades teriam de acatar a decisão aí sim, sem pressões impróprias.
Em muitos aspectos o episódio se parece com o julgamento sobre a validade da Lei da Ficha Limpa para as eleições de 2010. Na ocasião, os ministros já haviam rachado entre os que supostamente eram suscetíveis à opinião pública e os que permaneceram inabaláveis. Só que o resultado foi de 6 a 5 contra a lei, nascida de uma iniciativa popular.
Vale lembrar que toda a polêmica envolvendo o CNJ começou quando a atual corregedora do conselho, Eliana Calmon, disse que existem "bandidos escondidos atrás da toga". A colocação atingiu o âmago do corporativismo entre os magistrados. Era como afirmar que eles seriam comparáveis ao pessoal da praça.
É injusto, no entanto, falar que essa é uma característica apenas do Judiciário. Na Câmara dos Deputados, também conhecida como a "Casa do Povo", raramente o povo tem vez. Dentre 12 mil propostas legislativas transformadas em normas jurídicas desde 1988, apenas quatro nasceram de projetos idealizados pela sociedade.
No Executivo, a presidente Dilma Rousseff até tem aceitado a pressão para demitir ministros envolvidos em corrupção. Mas no sistema de loteamento partidário do governo ela não mexe. Ou seja: joga de um jeito para a torcida e de outro para o público interno.
Do lado de fora, o único jeito de melhorar essas situações é gritando, pressionando. Cabe à sociedade equilibrar os três poderes. Mesmo que esse malabarismo nem sempre seja fácil.



