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Nova CPMF, velha metamorfose

Nem bem chegou ao nono mês no Palácio do Planalto e Dilma Rous­­seff parece ter contraído o mesmo vírus que abateu Lula quatro anos atrás. Trans­­tornado pela possibilidade de perder R$ 40 bilhões na arrecadação com o fim da CPMF, o então presidente definiu-se na época como uma "metamorfose ambulante". O autorretrato era uma tentativa de justificar o fato de ter sido um ferrenho opositor à cobrança do tributo no governo Fernando Henrique Cardoso, mas que de repente mudou de ideia.

Durante a campanha eleitoral de 2010, Dilma jurou de pés juntos que era favorável à regulamentação da Emenda 29 e que não patrocinaria a criação de um novo imposto para financiar a saúde. Desde a última segunda-feira, no entanto, passou a dar sinais camaleônicos de que também tem exagerado nas doses de Raul Seixas. Deixou claro que não é mais favorável à emenda do jeito que está, apenas com uma nova fonte de recursos para o setor.

De volta ao passado, vale re­­­cordar que Lula ficou ensandecido quando a oposição conseguiu barrar a CPMF no Senado. Em dezembro de 2007, o governo precisava de 49 votos para prorrogar a cobrança por mais quatro anos. Conseguiu apenas 45.

Vários artífices da derrota entre os 35 senadores que votaram contra a proposta acabaram perseguidos pessoalmente por Lula nas eleições do ano passado. Entre eles, não se reelegeram os tucanos Arthur Virgilio (AM) e Tasso Jereissati (CE). Em parte por remorso da CPMF, o ex-presidente também chegou a falar em extirpar o DEM da política.

Está certo que o PSDB tem pouca autoridade no assunto (o governo FHC tirou várias lasquinhas da CPMF), mas é terrível aceitar que o debate seja interditado pelos maus bofes do governante de plantão. Como Lula fez há quatro anos, Dilma dá a deixa de que vai tratar o tema como uma guerra entre pobres e ricos. Uma pena.

Em um ambiente político dominado por denúncias de corrupção, é mais do que interessante aprofundar a discussão sobre carga tributária e saúde. Seria um sinal de evolução democrática. É aí que se distinguem (ou pelo menos deveriam se distinguir) as ideologias.

Não há problema no fato de o PT, um partido originalmente de esquerda, defender um novo imposto para a saúde. A deformação é prometer uma coisa na eleição e fazer outra quando chega ao poder. Exemplo: será preciso explicar à nova classe média da qual o partido tanto se orgulha o motivo de mais um tributo, apesar dos sucessivos recordes de arrecadação.

Do outro lado, sem os sociais-democratas do PSDB, não sobra muita gente para apimentar a discussão. O DEM até vem tentando se articular como legítimo herdeiro da direita liberal, mas tropeça pelos pecados recentes e pelo mais do mesmo. Caberá a setores da sociedade civil fazer pressão – como já aconteceu em 2007.

De qualquer jeito, o episódio será um excelente estudo de caso sobre como se comportam as atuais lideranças políticas brasileiras. Como Dilma vai justificar a mudança repentina de posição? Lula era Lula e a paródia com a metamorfose ambulante era só mais um capítulo do seu enorme anedotário.

Durona e técnica, a atual presidente vai precisar tirar outro coelho da cartola. Se fosse para apostar, diria que ela vai se fazer de estátua – a enorme base aliada no Congresso, aquela tão agraciada com ministérios, emendas e cargos, que se vire nos 30 com o novo imposto. A população, como sempre, vai pagar a conta.

Mas será que dessa vez vai deixar barato?

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