Despreocupação com a opinião pública e pouco caso com a democracia. Não há outra conclusão possível para o que fez a Assembleia Legislativa ontem à noite. Em sessão extraordinária, no meio do recesso parlamentar, os deputados aprovaram o projeto de lei que autoriza o Tribunal de Justiça (TJ) a fazer o repasse de 30% dos depósitos judiciais não tributários para os cofres do governo do estado. Não fosse a atuação ágil do Conselho Nacional de Justiça, que na noite de ontem proferiu decisão liminar impedindo o TJ de transferir quaisquer valores ao governo, o fato estaria consumado.
O projeto foi aprovado em tempo recorde. Na segunda-feira o Órgão Especial do Tribunal de Justiça aprovou a proposta. Na terça-feira, o projeto chegou à Assembleia e no mesmo dia foi realizada a convocação da sessão extraordinária. Na quarta-feira, os deputados votaram o requerimento para transformar a sessão de quinta-feira em comissão geral e, assim, dispensar o trâmite da proposta nas comissões da Casa. E na sessão de ontem aprovaram o projeto. O episódio nada mais é que uma demonstração da força imperial do governo do estado e da fraqueza servil dos deputados estaduais.
O trâmite relâmpago do projeto ocorreu dentro das regras do jogo e, não fosse a decisão do CNJ, a aprovação estaria legitimado pelo procedimento. Mas, no que se refere à conduta dos deputados, a democracia saiu perdendo.
Em prazo tão curto, é quase impossível analisar a conveniência, a legalidade e os impactos futuros de um projeto como esse. O projeto permite que o TJ repasse ao governo do estado dinheiro que não lhe pertence, a fim de atender as necessidades de caixa. Por essa razão, havia motivo suficiente para que o assunto fosse alvo de discussão aprofundada e responsável. Sem pressa, podiam tranquilamente aprovar o projeto de interesse do governo.
A impressão que fica é que a proposta foi empurrada "goela abaixo". Os deputados recusaram o debate do projeto com a sociedade de forma aberta e transparente. Só que a democracia tem seus custos e eles não se restringem a manter deputados com bons salários. A democracia exige respeito no trato da coisa pública, o que para um parlamento significa precisamente estar disposto a discutir com serenidade projetos relevantes, em especial aqueles que podem atingir diretamente interesses de todos os cidadãos.
A Assembleia Legislativa vem aos poucos se tornando mais aberta e transparente, mas quando ocorre episódios como o de ontem as expectativas são frustradas. A essa altura cabe aos eleitores ter boa memória e lembrar da conduta dos parlamentares nas próximas eleições, daqui pouco mais de um ano.



