No mau sentido, maquiavélico. Na sentido exato, antidemocrático e autoritário. O pacote de aumento de tributos do governo estadual está prestes a ser aprovado na Assembleia Legislativa do Paraná em mais um tratoraço. Para quem ainda desconhece, a manobra consiste em transformar a sessão plenária do Legislativo em "comissão geral" uma medida prevista no regimento interno do Legislativo e que permite aprovação relâmpago de projetos de lei. Já virou rotina. A fim de evitar que o debate aconteça, os deputados aprovam medidas impopulares ou polêmicas em uma só tacada. É provavelmente o que deve acontecer na próxima semana, na votação dos projetos de aumento tributário.
O cálculo político dos deputados estaduais lembra a raposa das fábulas conhecida pela astúcia e pelo alta capacidade para analisar o comportamento de outros animais. O tratoraço impede a discussão de meios alternativos à imposição de mais carga tributária aos cidadãos. E a sociedade fica impedida de participar da solução ao problema de caixa do governo, apesar de serem os cidadãos que vão pagar a conta.
Parlamentares não discutem a possibilidade de reduzir drasticamente cargos comissionados no Executivo e no Legislativo, verbas de ressarcimento de deputados e outras benesses concedidas a uma elite de altos funcionários de estado. Não discutem onde estão os gargalos administrativos. Apenas desejam que a sociedade financie a máquina pública, sem reclamar e sem refletir sobre as opções existentes. Pode até ser justificável o aumento tributário que está sendo proposto, mas esse argumento necessariamente precisa ser discutido amplamente.
A teoria política que fundamenta a república considera a cobrança de tributos somente ser possível porque o povo, por meio de seus representantes, aceita que o Estado capture parte de seus recursos para realizar os fins que a comunidade política considera justo perseguir. É a teoria da autotributação, tão cara às repúblicas democráticas. É o debate público que vai dar legitimidade à cobrança de impostos. Por essa razão, o tratoraço, ainda mais quando diz respeito a novos tributos, é um atentado contra a democracia.
É possível que algum astuto justifique que a razão de violar a república seja o pouco tempo que falta para acabar o ano. Se o aumento não for aprovado agora, o projeto de governo ficaria inviabilizado. Mas o argumento somente poderia ser aceito por ingênuos. O governo estadual passou o ano todo com dificuldades financeiras. Poderia ter feito a discussão democrática antes, mas evitou fazê-lo.
Ao aprovar o aumento da carga tributária no tratoraço, o aspecto raposa estará se manifestando nos parlamentares. Ao mesmo tempo, os eleitores estarão vestindo a carapaça de patos e avestruzes. Patos, aqueles que aceitam sem exigir o debate democrático. Avestruzes, aqueles que insistem em permanecer ignorando que um tarifaço vai pesar sobre seus ombros, sem nem mesmo saber por quais razões.
A sociedade, por meio de seus cidadãos e entidades de classe, precisa ser envolvida na discussão de aumento de impostos, a fim de se dar legitimidade à política de tributação. Aceitar a aprovação relâmpago é admitir as consequências do fabulário das raposas, dos patos e das avestruzes. Certamente os personagens do ano.
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