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Tratoraços

Pode fingir quem quiser, mas democracia não se faz a portas fechadas no Gabinete da Assembleia Legislativa. Nesta semana o presidente da Sanepar, Fernando Ghignone, foi prestar esclarecimentos sobre o projeto que autoriza a estatal a lançar novas ações no mercado. A imprensa ficou do lado de fora. Também não é próprio da democracia realizar seguidas votações relâmpagos, como tem ocorrido na Assembleia. Eleitor, não esqueça dos tratoraços impostos pelos parlamentares quando for votar em outubro. Nem deixe também que seus conhecidos esqueçam disso.

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É ingênuo pensar que o governante eleito democraticamente será o mais preparado para governar. Assim pensa Juan C., um escritor octogenário, personagem de J. M. Coetzee na obra "Diário de um ano ruim". Segundo o personagem, a regra de sucessão numa democracia não é uma fórmula para identificar o melhor governante; "é uma fórmula para atribuir legitimidade a um ou outro e assim evitar o conflito civil". "O eleitorado – o demos – acredita que sua tarefa é escolher o melhor, mas na verdade sua tarefa é muito mais simples: ungir um homem, não importa qual", sentencia o Juan C..

O texto provocativo de Coetzee serve como ponto de partida para uma discussão relevante. Suponha que o personagem esteja certo. Nessa hipótese as eleições não seriam eficientes em ungir o candidato mais preparado, mas apenas legitimariam o procedimento de escolha do governante. Porém, ainda assim haveria uma boa margem para a sociedade conseguir bons frutos do sistema democrático, já que ela pode firmar compromissos com os representantes eleitos.

Um desses compromissos que traria bons resultados para a democracia é o de ampliar os mecanismos de transparência e controle sobre o uso de bens públicos. Ora, se não conseguimos escolher o mais preparado, podemos, ao menos, escolher aqueles que se comprometem em tornar os atos do Estado mais transparentes.

Hoje o Paraná vive a farsa da transparência. Se você já teve a boa vontade de entrar em um Portal de Transparência no estado, certamente desistiu de procurar qualquer coisa. Se quiser, por exemplo, saber a remuneração de um membro do Ministério Público, ou de um alto funcionário de estado, você precisa fornecer seus dados, incluir nome e CPF. Se quiser comparar gastos de deputados, vai ter de abrir dezenas de tabelas e extrair cada um dos dados desejados. A sociedade prossegue impedida de acessar bancos de dados do estado para download. Falta didatismo. Tudo é feito para ser chato, difícil e obscuro.

Vivemos num cenário de desprezo ao ideal republicano de transparência. Esse panorama, entretanto, pode ser mudado em outubro. Mas isso depende dos cidadãos. E aqui está o desafio para todos os eleitores do estado. Que tal mobilizar a sociedade paranaense em favor da transparência? Não da retórica da transparência, mas da verdadeira, em que a administração se preocupa em apresentar informações de forma didática e disponibilizando bases de dados públicos sem obstáculos.

Entidades de classe, sindicatos, movimentos sociais e cidadãos interessados podem organizar um amplo movimento e fazer a diferença ao reivindicar que todos os candidatos a governo do estado assinem um documento em que, caso sejam eleitos, se comprometem a adotar todos os procedimentos necessários para que o Paraná seja um modelo de transparência pública.

Associações de classe estão­ acostumadas apresentar uma pauta de reivindicações do setor a cada eleição, o que é legítimo. Mas, em vez de defender apenas interesses setoriais, poderiam alavancar esse ambicioso projeto que vai beneficiar toda a sociedade. O personagem de Coetzee traz reflexões incômodas, mas muito oportunas para que a sociedade saia dessa zona de conforto em que se encontra. Em outra passagem da obra, Juan C. diz que "você tem a todo momento de relembrar a si mesmo como é ver-se cara a cara com o Estado na pessoa do funcionário estatal. Então pergunte a si mesmo: Quem serve quem? Quem é servidor, quem é senhor?"

Sem o compromisso pela transparência, nós, cidadãos, vamos continuar vivendo como servos, tendo de implorar para que administração pública forneça informações que são da sociedade, mas que os dirigentes recusam a fornecer de bom grado. Nesse cenário, os detentores de cargos públicos continuarão sendo nossos senhores.

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