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Engana-se quem pensa que a crise afeta apenas a vida política do país. A sociedade brasileira vive uma grave crise de valores que precisa ser trazida à consciência. É isso que explica o motivo de parte dos brasileiros aceitar que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), permaneça na direção daquela Casa legislativa.

A sociedade precisa se pautar por valores republicanos. O grande desafio não é escolher entre petistas e tucanos. O grande desafio é ser intolerante com a apropriação de bens públicos.

Há dois meses a sociedade aguarda o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, decidir se aceita ou não a denúncia por corrupção proposta pelo Ministério Público Federal contra Eduardo Cunha. Ontem o MPF ampliou a denúncia, anexando ao processo o teor da delação premiada do lobista Fernando Soares, em que o delator afirma que Cunha foi beneficiado por pagamento de propina a partir de contratos da Petrobras. Como se isso não bastasse, as autoridades suíças confirmaram na semana passada que bloquearam cerca de US$ 2,4 milhões que estariam em contas secretas de Cunha e familiares naquele país.

Por muito menos, no ano passado, o então deputado federal pelo PT André Vargas foi cassado, após ser descoberto que ele voou com a família em jato particular pago pelo doleiro Alberto Youssef. Já no caso de Cunha, embora uma representação contra ele tenha sido assinada por 46 deputados de sete partidos, há gente da oposição e da base aliada articulando para manter o peemedebista no cargo.

Os motivos não são nada republicanos. A oposição acha que vai convencer Cunha a aceitar a abertura do pedido de impeachment. A base aliada acredita que consegue fazer um acordo com o peemedebista para manter Dilma no cargo de presidente da República. E Cunha acena para os dois lados, mas nada entrega. Condutas igualmente lamentáveis que demonstram a pobreza ética da política brasileira.

Cunha não tem condições de permanecer no cargo por causa dos fatos que vão se avolumando contra ele. Afinal, para a moralidade pública não interessam as cores partidárias. Tampouco interessa se as consequências da saída de Cunha serão benéficas para oposição ou para a presidente Dilma Rousseff.

O jornalista André Gonçalves, da Gazeta do Povo, em seu blog Conexão Brasília, resumiu bem a situação: “enquanto ética for uma questão de conveniência, o país não vai para frente”.

O problema é que essa falta de consciência ética não é exclusividade de parlamentares. Ela é partilhada por parte da população que vê em Cunha um “guerreiro do povo brasileiro” cuja missão seria remover o PT do poder. Os que pensam assim, acreditam, em sua ingenuidade, que defender a saída de Cunha da presidência da Câmara é um “artimanha petista” para evitar a queda de Dilma. Menos, pessoal, menos.

Com as provas coletadas contra Cunha, a permanência dele na direção da Câmara ofende o Estado Democrático de Direito. O cargo que ocupa confere a ele poder suficiente para criar obstáculos às investigações em trâmite. É irrelevante que Cunha nada tenha feito para prejudicar o andamento da denúncia que está nas mãos de Zavascki. A sua mera permanência como chefe de poder já causa estragos suficientes à imagem da Câmara e da República brasileira.

A sociedade precisa se pautar por valores republicanos, deixar a ignorância do pragmatismo partidário e compreender que o grande desafio não é escolher entre petistas e tucanos. O grande desafio é ser intolerante com a apropriação de bens públicos por aqueles que estejam ocupando posições de poder. Independentemente do partido político a que pertençam.

Enquanto essa consciência não se tornar dominante, influenciando especialmente as militâncias que são manipuladas ou coniventes, a crise ética na sociedade vai permanecer assombrando o país.

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