
O ato da presidente Dilma Rousseff que criou formalmente a Comissão da Verdade, em 18 de novembro do ano passado, completa no próximo domingo 100 dias sem que tenha havido qualquer novidade na formação do grupo. A comissão, criada para investigar crimes contra os direitos humanos no país entre 1946 e 1988, e especialmente nos anos da ditadura militar (1964-1985), ainda não tem nenhum integrante nomeado, e o assunto teria se tornado indigesto para o governo.
As informações no Palácio do Planalto são de que nem os primeiros passos foram dados. Mais que isso: foi imposta uma mordaça sobre o assunto aos auxiliares da presidente. Procurada pela reportagem por dez dias seguidos, a Secretaria dos Direitos Humanos que deveria tratar do assunto não se manifestou. O máximo que os auxiliares da ministra Maria do Rosário disseram foi que ninguém estava autorizado a falar a respeito da Comissão da Verdade. E que a ministra não se manifestaria naquela hora, por achar que não era conveniente.
As raras revelações sobre a comissão não são divulgadas pelo Palácio do Planalto ou pelos ministérios que deveriam cuidar do tema, mas por pessoas interessadas em saber o que está ocorrendo Uma delas é a deputada Luiza Erundina (PSB-SP). "O tempo está passando e ninguém diz nada a respeito da formação da comissão", disse a deputada à reportagem.
Ela contou que ouviu falar que alguns auxiliares de Dilma teriam procurado o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para saber se ele aceitaria coordenar a comissão. Também teriam chegado sondagens aos ex-ministros José Carlos Dias e José Gregori (ambos da Justiça, no governo de FHC) e ao diplomata e acadêmico Paulo Sérgio Pinheiro a respeito da disponibilidade deles de participar da Comissão da Verdade. No entanto, pessoas ligadas aos nomes que teriam sido procurados não confirmam a informação.
A demora do governo federal em montar a Comissão da Verdade poderá levar o país a presenciar uma situação inusitada. É que a partir de março será criada a Subcomissão Verdade e Justiça, um desmembramento da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara, cuja função será assessorar no Legislativo a Comissão da Verdade do Executivo.
A subcomissão poderá fazer convites, tomar depoimentos, ouvir testemunhas sobre assuntos relativos ao que ocorreu no Brasil na parte de desrespeito aos direitos humanos de 1946 a 1988. Desse modo, a subcomissão poderá iniciar seus trabalhos antes mesmo que o órgão a ser auxiliado venha a existir.
Importância
Ao sancionar a lei que criou a Comissão da Verdade, Dilma chegou a dizer que aquele 18 de novembro entraria para a História. "É o dia em que comemoramos e partir de agora iremos comemorar a transparência e celebrar a verdade", disse. No mesmo dia, sancionou a Lei do Acesso à Informação.
Quando for criada, a Comissão da Verdade será composta por sete integrantes. Como a aprovação da lei foi negociada com os setores que apoiaram a ditadura militar e os que a combateram, eles não poderão pertencer a nenhum dos lados; não poderão ter cargos de direção em partidos (à exceção dos de natureza honorária); e não poderão estar em cargo em comissão ou função de confiança em quaisquer esferas do poder público.
A comissão poderá apenas investigar. Não tem autorização para punir. Seu trabalho terá de ser concluído dois anos depois de constituída. O que for apurado será entregue ao Arquivo Nacional para integrar o Projeto Memórias Reveladas.



