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 | Luis Macedo/Câmara dos Deputados/Arquivo
| Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados/Arquivo

A Operação Lava Jato chegou com força ao Congresso Nacional na mesma semana em que parlamentares começaram a se movimentar para desengavetar e votar ainda neste ano o projeto de lei que aumenta as penas para o abuso de autoridade. A proposta é vista pela força-tarefa como uma tentativa de dificultar as investigações contra políticos.

O Congresso virou foco da Lava Jato em duas ocasiões nos últimos dias por supostas tentativas de obstruir a operação. Primeiro, na quarta-feira (19), foi a prisão do ex-presidente da Câmara e deputado federal cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A detenção abriu a possibilidade de a operação apurar a extensa rede de influência do ex-parlamentar, que seria de até 160 deputados, além de outras autoridades. No pedido de prisão de Cunha, procuradores da Lava Jato também elencaram uma série de ocasiões em que o ex-presidente da Casa teria usado outros deputados como “laranjas” para tentar barrar as investigações.

Na sexta (21), a Polícia Federal (PF) prendeu servidores da Polícia Legislativa do Senado sob acusação de terem atrapalhado as apurações da Lava Jato. A ação dos policiais da Casa teria beneficiado ao menos dois senadores investigados pela operação – Gleisi Hoffmann (PT-PR), Fernando Collor (PTC-AL) –, além dos ex-senadores Edison Lobão Filho (PMDB-MA) e José Sarney (PMDB-AP). Todos negam ter cometido ilegalidades.

Dentre os detidos pela PF está o diretor da Polícia Legislativa, Pedro Ricardo Carvalho – tido como homem de confiança do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Em princípio, Renan não está envolvido no caso. Mas ele defendeu a ação dos policiais do Legislativo. A Polícia Legislativa é formalmente subordinada à direção-geral do Senado, cuja titular é nomeado pelo presidente da Casa.

Prioridade

Também investigado pela Lava Jato, Renan havia dito na terça-feira (18) considerar prioritário o projeto que endurece as penas para o abuso de autoridade. O presidente do Senado é o autor da proposta. Segundo ele, a votação no plenário vai ocorrer ainda neste ano. Lideranças do Senado já se articulam para reiniciar a tramitação da proposta no início do mês que vem, logo depois do segundo turno das eleições.

Juiz responsável pela Lava Jato na primeira instância da Justiça, Sergio Moro reagiu e afirmou na quinta-feira (20) que o projeto, do modo como está, é um “atentado à magistratura”. Vários integrantes da força-tarefa da Lava Jato já haviam dito anteriormente que a proposta teria o objetivo de dificultar as investigações.

Pontos polêmicos

O projeto prevê punições mais duras para servidores públicos, juízes, procuradores e promotores do Ministério Público que abusem de sua autoridade. Políticos não estão incluídos na proposta.

Dentre os casos previstos estão, por exemplo, o vazamento de informações sigilosas de investigações (algo que tem sido corriqueiro na Lava Jato) e o uso de escutas telefônicas que, além de gravarem investigados, atinjam pessoas que não estejam incluídas formalmente no inquérito ou no processo. Investigadores alegam que é impossível saber para quem um investigado vai fazer uma ligação telefônica. Esse foi o caso do grampo autorizado por Moro contra o ex-presidente Lula que gravou uma conversa dele com a ex-presidente Dilma Rousseff.

Outro ponto controverso é o artigo que prevê punições para o agente público que, com ameaça de prisão, pressionar um réu a depor sobre fatos que possam incriminá-lo. Para muitos, esse artigo será usado para dificultar as delações premiadas. Também há críticas à previsão de punir o juiz que decrete uma prisão que posteriormente, num tribunal superior, venha a ser considerada irregular. Os críticos do projeto avaliam que isso vai limitar a autonomia dos juízes de primeira instância de interpretar a lei para determinar uma prisão.

Força-tarefa e políticos estão num jogo de forças, diz analista

O professor de ética e filosofia política Roberto Romano, da Unicamp, avalia que os acontecimentos dos últimos dias mostram que a Lava Jato e os políticos estão numa espécie de jogo de forças. Segundo ele, já era esperada a reação de autodefesa dos congressistas, exemplificada pelas tentativas de obstruir as investigações e pelo projeto que aumenta a punição para o abuso de autoridade.

“Foi isso que aconteceu na Itália com a Operação Mãos Limpas”, diz Romano. A Mãos Limpas atingiu duramente os políticos italianos, tal como a Lava Jato no Brasil. A reação do Parlamento da Itália foi criar leis para dificultar investigações. O professor diz que o Brasil tem de evitar que isso ocorra.

Remédio tópico

Romano alerta que, embora a Lava Jato cumpra um papel importante, a operação tem sido apenas um “remédio tópico” contra a corrupção no país. De acordo com ele, prisões como a do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) revertem a expectativa negativa que a sociedade tem sobre o funcionamento das instituições brasileiras. Mas não atacam o grande problema: a própria estrutura do Estado, que concentra o orçamento na União.

Essa estrutura faz com que prefeitos e governadores fiquem dependentes do governo federal e do Congresso para obter verbas. E, a partir dessa necessidade, se estabelecem relações de influência que fomentam a corrupção. Romano afirma que o país só vai sair desse círculo vicioso quando modificar essa estrutura.

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