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O corregedor nacional de Justiça, Francisco Falcão, relatou a jornalistas as irregularidades que estão sendo investigadas no Tribunal de Justiça do Paraná | Antônio More/ Gazeta do Povo
O corregedor nacional de Justiça, Francisco Falcão, relatou a jornalistas as irregularidades que estão sendo investigadas no Tribunal de Justiça do Paraná| Foto: Antônio More/ Gazeta do Povo
  • Lauro de Melo, corregedor do TJ do Paraná (TJ-PR)

Ao fim da correição comandada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ), o corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão, confirmou que dois desembargadores do estado estão sendo investigados por tráfico de influência e venda de sentença. Entre eles, o atual presidente do TJ, Clayton Camargo. Segundo Falcão, a sindicância envolvendo o caso, que deve durar pelo menos 45 dias, será rigorosíssima. Se ficarem comprovadas as acusações contra os magistrados, o plenário do CNJ poderá decidir pela perda do cargo. "Vamos agir com mão de ferro, doa a quem doer", disse.

Na passagem pelo Judiciário paranaense, o conselho identificou preliminarmente uma lista de problemas, que irão constar no relatório final da inspeção feita ao longo desta semana. Além da baixa produtividade no número de processos julgados pelo TJ, o CNJ recomendou que o tribunal desista de preencher as recém-criadas 25 novas vagas de desembargador. Isso diante do "sucateamento" da 1.ª instância, diz o conselho. Também foram identificadas falhas nas Varas de Falência, no pagamento de precatórios e na divulgação da folha salarial da instituição (leia ao lado).

Favorecimento

Protocolada no CNJ em 2011, a denúncia que está sendo investigada envolve Clayton Camargo e o desembargador Rafael Augusto Cassetari – aposentado no início do ano. A denunciante é uma advogada que representava uma das partes em uma disputa de guarda de filhos. Segundo a representação, Camargo teria influenciado o colega a decidir em favor de uma das partes em troca de dinheiro – R$ 200 mil, que teriam sido entregues em quatro pacotes de R$ 50 mil.

Relator do processo, que corre em sigilo no CNJ, Falcão confirmou que o caso foi um dos alvos da correição desta semana. Sem querer antecipar qualquer posicionamento, ele disse que já está recebendo documentos da defesa e da acusação para embasar seu parecer, que será levado ao plenário do conselho. "Temos de fazer apurações dando amplo direito de defesa e, ao final, julgar com o rigor que se merece julgar", defendeu. "Chegamos a um ponto no Brasil em que a sociedade não admite mais corrupção. Se essas denúncias forem confirmadas, a Corregedoria vai agir com muito rigor e, para isso, tenho o apoio integral do ministro Joaquim Barbosa [presidente do CNJ]."

Questionado se tratou do assunto com Camargo nas reuniões que teve com ele nos últimos dias, Falcão disse que não.

Procurado pela Gazeta do Povo nesta semana, o presidente do TJ não quis comentar o assunto e disse que não dá entrevistas nem fala com jornalistas. Já Cassetari afirmou que a acusação é um factoide plantado no CNJ. Segundo ele, que disse estar processando a denunciante, sua decisão foi limpa e se baseou em pareceres do Ministério Público.

Baixo número de processos julgados preocupa

Um dos principais problemas detectados pelo CNJ no Judiciário do Paraná foi o baixo número de processos julgados por desembargador no estado: 626 casos contra 1.227 da média nacional – os dados são de 2011. A questão se torna ainda mais preocupante ao se considerar que ainda há 30 mil processos aguardando distribuição. "Tem de se pensar em fazer mutirão e cobrar dos desembargadores", disse o corregedor nacional, Francisco Falcão.

Além disso, o conselho classificou como inadmissível a decisão do TJ de criar mais 25 cadeiras de desembargador, enquanto a 1.ª instância segue "abandonada", sofrendo com a falta de estrutura e de juízes. "A esse passo, teremos um tribunal só de desembargadores e não teremos mais juízes no interior. Há um descompasso entre o que o TJ deveria fazer e o que está fazendo para o conforto do cidadão, para a rapidez com que deve ser levada a justiça ao cidadão", criticou o juiz auxiliar da Corregedoria-geral do CNJ, Jefferson Luis Kravchychyn.

Outras falhas apontadas foram as relações "íntimas" entre síndicos de massas falidas e advogados, além de discrepâncias em relação aos precatórios. Nesta semana, o conselho deu 60 dias para que o tribunal refaça e publique a lista de credores de precatórios e que pague as dívidas respeitando o critério de ordem cronológica.

"Participei efetivamente da correição de 2009 e, com relação ao que foi determinado e às constatações feitas à época, daria nota 5 [hoje ao TJ]", sentenciou Kravchychyn. O relatório final da inspeção será concluído nos próximos meses.

Duas versões

Nota de desagravo a desembargadores ganha "emenda" em site

Chico Marés

Os sites do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) e da Associação dos Magistrados Paranaenses (Amapar) publicaram versões diferentes da mesma nota de desagravo aos desembargadores Clayton Camargo, presidente do TJ, e Rafael Augusto Cassetari, hoje aposentado. Um parágrafo afirmando que matéria com acusações contra os dois desembargadores foi publicada na Gazeta do Povo por represália aparece na nota publicada pelo TJ, mas não consta no site da Amapar.

A Amapar e a AMB saíram em defesa, na quinta-feira, de Camargo e Cassetari. Segundo reportagem da Gazeta do Povo, publicada no mesmo dia, os dois desembargadores estariam sendo investigados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por suspeita de envolvimento em caso de venda de decisões judiciais.

Em nota, as entidades dizem ter "total confiança" na lisura dos julgamentos, afirmam que Camargo não participou do julgamento da questão e diz que "causa estranheza" a reportagem ter sido publicada justamente na visita do Corregedor Nacional da Justiça ao Paraná. Entretanto, a nota que consta no site do TJ recebeu uma "emenda", que diz que a reportagem "trata-se (...) de notícia veiculada em represália" a decisões proferidas por Camargo que teriam contrariado familiares dos proprietários da Gazeta do Povo.

O presidente da Amapar, Fernando Ganem, estava de férias na ocasião e retornou apenas na sexta-feira. De acordo com ele, enquanto não houver uma reclamação dos signatários da nota, a entidade ratifica a versão publicada no site do TJ, mesmo com a alteração. A reportagem tentou entrar em contato com os dois, mas não teve sucesso.

Transparência

Conselheiro reprova reação de Camargo ao trabalho da imprensa

O tratamento dado pelo presidente do TJ, desembargador Clayton Camargo, à imprensa também foi alvo das críticas por representantes do CNJ. Na última quarta-feira, por telefone, ele disse à reportagem da Gazeta do Povo que não tem de dar satisfações à imprensa. "Vai fazer perguntas pra tua mãe", afirmou. Já nos dois últimos dias, sua assessoria dificultou o trabalho dos jornalistas no prédio do tribunal e chegou, inclusive, a expulsar um repórter da Gazeta por não ter autorização para ficar no andar da presidência.

"O Judiciário tem sim de prestar contas à sociedade como qualquer outro poder, mas infelizmente, determinadas pessoas se negam a isso, até pelo hábito. O cachimbo fez a boca torta. São indivíduos que nem conseguem prestar contas dos seus atos", afirmou o conselheiro Jefferson Luís Kravchychyn.

Em nota ontem, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor-PR) repudiaram as atitudes de Camargo. Para as entidades, a truculência do desembargador seria "um sinal claro de preocupação com as informações que possam se tornar públicas".

Outro lado

Lauro de Melo defende tribunal e diz que falhas estão sendo corrigidas

Ao lado dos membros do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na coletiva de imprensa, o corregedor do TJ-PR, Lauro de Melo, defendeu o tribunal dos problemas detectados na correição e admitiu que ainda existem falhas a ser corrigidas. Questionado sobre suposto tráfico de influência e venda de sentenças no tribunal, disse que isso pode ocorrer, mas que não tem conhecimento de casos dessa natureza – somente o presidente do órgão pode determinar a investigação de desembargadores. Como corregedor, porém, Melo apura supostos favorecimentos nas decisões de juízes da 1ª instância. Os casos são "vários", segundo ele.

Melo disse ainda que a produtividade do TJ estaria dentro da média nacional, ao se considerar de forma unificada por cargo os processos julgados por juízes substitutos durante as férias de desembargadores. Sobre a recomendação de não empossar os 25 magistrados nas novas vagas criadas no tribunal, ele afirmou que concorda com a orientação, mas que a decisão final cabe ao presidente Clayton Camargo.

"Foram instaladas mais ou menos 80 varas no interior no ano passado, e o problema agora se restringe ao concurso de juiz. Está faltando juízes, e isso compete à presidência. Imagino que logo abrirá concurso", declarou, em relação aos problemas no 1º grau.

O corregedor do TJ também disse que as orientações do CNJ serão seguidas em relação aos precatórios e defendeu que os salários pagos pelo tribunal deveriam ser divulgados nominalmente. "Acho que o tribunal mereceria uma média melhor. Eu daria uma nota 8,5", finalizou.

Problemas

Veja algumas das falhas investigadas pelo CNJ no Judiciário do Paraná:

– Baixa produtividade no número de processos julgados pelos desembargadores

– Intenção "inadmissível" de criar mais 25 vagas de desembargador

– Abandono da 1ª instância, que continua sofrendo com a falta de estrutura e de juízes

– Existência de relações "íntimas" entre síndicos de massas falidas e advogados

– Irregularidades no pagamento de precatórios, em desrespeito ao critério de ordem cronológica

– Não divulgação do salário de membros e funcionários de forma individualizada

Colaborou Yuri Al’Hanati

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