
O corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Francisco Falcão, defendeu na semana passada que a aposentadoria compulsória deixe de ser punição para juízes condenados administrativamente por irregularidades no exercício do cargo. Relator da reclamação que levou à abertura de procedimento administrativo disciplinar no CNJ contra o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná Clayton Camargo, ele citou o caso para cobrar mudanças na legislação. Alterações nas regras de processos contra magistrados são tema de duas propostas de emenda à Constituição (PECs) que estão em estágio avançado de tramitação no Congresso.
"Num caso como esse [que envolve Camargo], se ficar provado que houve corrupção, que houve desvio de conduta, tinha de ser varrido do Poder Judiciário, sem direito a qualquer aposentadoria. Aposentadoria num caso como esse, se provado, é um prêmio", afirmou Falcão, após a sessão de terça-feira do CNJ. O voto do corregedor apresentou indícios de que o desembargador paranaense teve uma evolução patrimonial incompatível com as funções de magistrado entre 2005 e 2008.
O CNJ também decidiu afastar o desembargador do cargo até a conclusão do processo. Essa decisão foi embasada por denúncias de venda de sentenças, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, corrupção passiva e crimes tributários investigadas pelo Ministério Público Federal.
"Questão moral"
Em processos contra desembargadores, o CNJ pode aplicar apenas três tipos de punições administrativas: remoção compulsória do cargo, disponibilidade (afastamento temporário das funções com recebimento de salários e sem possibilidade de advogar), e aposentadoria compulsória (a mais severa de todas). Caso seja aposentado compulsoriamente, no entanto, Camargo deve manter a mesma remuneração que receberia em caso de aposentadoria voluntária (R$ 25.323,50 mais R$ 727,96 de auxílio-saúde). "Na verdade, [a aposentadoria compulsória] é mais uma questão moral", admitiu Falcão.
Uma das PECs que tratam do fim da aposentadoria compulsória foi aprovada em agosto pelo Senado, no pacote de projetos apresentados pelo presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), como resposta às manifestações populares de junho. A PEC 291/2013 ainda precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados, onde passou a tramitar em conjunto com outro texto sobre o mesmo tema que também já foi aprovado pelo Senado (a PEC 505/2010).
A PEC 291/2013 passou por modificações para atender a demandas de entidades representativas de juízes, como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). "Aposentadoria é benefício derivado de contribuição previdenciária e tempo de serviço, não combina com punição", diz o presidente da AMB, Nelson Calandra.
A proposta, que também trata dos processos contra membros do Ministério Público, acaba com a aposentadoria compulsória como punição, mas não estabelece a demissão como alternativa do processo disciplinar.
Pela PEC, juízes acusados de delitos graves, que sejam considerados culpados ao fim de procedimento administrativo de tribunais de Justiça ou pelo CNJ ficariam suspensos (em disponibilidade) por até dois anos. O resultado do julgamento precisaria ser representado ao Ministério Público, que então deve propor ação judicial para a perda formal do cargo dentro de um prazo de 30 dias. Assim como ocorre atualmente, a demissão do serviço público só ocorreria após a sentença definitiva.
Desde 2007, 59 magistrados foram punidos pelo conselho
Guilherme Voitch
Desde que foi criado, em 2007, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já puniu com medidas administrativas 59 juízes em todo o país. Dessas punições, a mais comum (39 casos) é justamente a mais pesada, a aposentadoria compulsória. As demais punições foram o afastamento temporário (também chamado de disponibilidade, com 5 casos); a remoção para outra instância do Judiciário (4); a censura (9); e advertências (2).
Até o ano passado, discutia-se a possibilidade de o conselho demitir magistrados como punição extrema. Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), porém, negou ao CNJ esse poder, tornando a aposentadoria a pena administrativa a mais dura que o conselho pode aplicar.
Os casos mais extremos envolvem presidentes de cortes. O então presidente do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) Sebastião Teixeira Chaves foi afastado do cargo e depois aposentado compulsoriamente. Já o ex-presidente do TJ Paraíba (TJ-PB) Marco Souto Maior recebeu uma pena mais branda pelo CNJ: foi colocado em disponibilidade medida que, em tese, permite ao magistrado retornar ao trabalho. O estado com maior número de aposentadorias compulsórias é o Espírito Santo. Nove magistrados capixabas já sofreram com a pena máxima do CNJ.
Paraná
No Paraná, nunca houve afastamento de magistrados pelo CNJ como punição administrativa definitiva. O ex-presidente do TJ-PR Clayton Camargo foi afastado preventivamente pelo CNJ na última terça-feira até que as investigações contra ele se encerrem e o processo disciplinar seja julgado conselho. O processo poderá inclusive resultar num novo afastamento de Camargo. Mas isso só após a análise final do caso.



