
A interferência do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no processo que tramita contra ele no Conselho de Ética da Casa é nítida. Desde 19 de novembro, o colegiado tenta analisar a admissibilidade do pedido de cassação de Cunha, mas manobras regimentais e políticas evitam a votação. Entretanto, isso não deve resultar em seu afastamento da presidência da Casa. Para especialistas em Direito Constitucional consultados pela reportagem, o Supremo Tribunal Federal (STF) não teria competência para agir nesse caso.
Mesmo assim, opositores de Cunha tentam afastá-lo pela via jurídica. PSol e Rede apresentaram, na quarta-feira (9), um pedido de afastamento cautelar à Procuradoria Geral da República (PGR). Caso considere o pedido procedente, a PGR pode acionar o STF para agir. Além disso, na quinta-feira (10), o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Coelho, declarou que a instituição tem uma ação pronta para ingressar no STF visando a garantir o funcionamento do Conselho.
Veja como está sendo a tramitação da representação contra Cunha
Mas eventuais ações contra Cunha, por esse motivo específico, não devem prosperar. Presidente do Conselho da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri avalia que a análise do decoro parlamentar é uma questão exclusivamente política, e não jurídica. Assim, desde que o regimento da Câmara seja respeitado, trata-se de uma questão interna da Casa. “O STF não tem legitimidade nem competência para afastá-lo neste caso”, afirma.
Egon Bockmann, professor de Direito Constitucional da UFPR, diz que o STF não pode impedir que Cunha desempenhe sua função principal, de presidir o processo Legislativo, mesmo que esteja interferindo indevidamente em uma questão administrativa da Câmara – no caso, um processo disciplinar. “Seria uma interferência muito forte de um poder [Judiciário] sobre as competências do outro [Legislativo]”, afirma.
Além disso, a interferência de Cunha, na maioria dos casos, não foi direta – o que dificulta a caracterização de que ele manobrou o processo. Quando o primeiro relator, Fausto Pinato (PRB-SP), foi afastado do caso, o responsável oficial por isso foi o vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA). Além disso, foram seus aliados, e não o próprio Cunha, que tumultuaram as sessões do Conselho de Ética e impediram que o processo se iniciasse.
Sem efeitos
Para o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília, o simples afastamento cautelar temporário de Cunha pouco alteraria o cenário. Com a perspectiva de voltar a assumir o comando do Congresso, Cunha continuaria a contar com aliados para seguir atrapalhando o processo. Isso mudaria somente caso ele perdesse de forma definitiva a caneta de presidente – e com ela, uma parte considerável de seu capital político.



