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Memória

Curitiba queria votar para presidente

Há exatos 30 anos, capital paranaense realizava o primeiro grande comício das Diretas Já. Movimento não conseguiu emplacar a emenda para viabilizar eleição para presidente, mas enfraqueceu ainda mais o regime militar

Multidão no calçadão da Rua XV de Novembro: comício, organizado em apenas 12 dias, foi um sucesso. Fontes diferentes falam de 10 mil a 60 mil participantes | Rubens Vandresen/ Gazeta do Povo
Multidão no calçadão da Rua XV de Novembro: comício, organizado em apenas 12 dias, foi um sucesso. Fontes diferentes falam de 10 mil a 60 mil participantes (Foto: Rubens Vandresen/ Gazeta do Povo)
Peemedebistas no palanque: Enéas Farias, Tancredo, Ulysses Guimarães, José Richa e Franco Montoro (a partir da esquerda) |

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Peemedebistas no palanque: Enéas Farias, Tancredo, Ulysses Guimarães, José Richa e Franco Montoro (a partir da esquerda)

Vista da Boca Maldita durante o comício: relato de pessoas felizes em poder reivindicar o direito de votar para presidente |

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Vista da Boca Maldita durante o comício: relato de pessoas felizes em poder reivindicar o direito de votar para presidente

Milhares de curitibanos compareceram ao comício de 12 de janeiro, que abriu a campanha pelas Diretas |

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Milhares de curitibanos compareceram ao comício de 12 de janeiro, que abriu a campanha pelas Diretas

Tancredo Neves, governador de Minas Gerais, era um dos astros da campanha. Eleito presidente, ele morreu antes de tomar posse, em 1985 |

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Tancredo Neves, governador de Minas Gerais, era um dos astros da campanha. Eleito presidente, ele morreu antes de tomar posse, em 1985

Enéas Farias, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães |

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Enéas Farias, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães

Caravanas do interior participaram do comício. Oposição dizia que PMDB inflou manifestação pagando para que pessoas participassem |

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Caravanas do interior participaram do comício. Oposição dizia que PMDB inflou manifestação pagando para que pessoas participassem

O senador Alvaro Dias, organizador do comício, era presidente do diretório do PMDB no Paraná |

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O senador Alvaro Dias, organizador do comício, era presidente do diretório do PMDB no Paraná

Comandado pelo PMDB, comício teve apoio de outros partidos de apoio à ditadura militar |

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Comandado pelo PMDB, comício teve apoio de outros partidos de apoio à ditadura militar

Comícios se espalharam pelo Brasil de janeiro a abril, quando emenda Dante de Oliveira foi votada e derrubada no Congresso Nacional |

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Comícios se espalharam pelo Brasil de janeiro a abril, quando emenda Dante de Oliveira foi votada e derrubada no Congresso Nacional

Comício gigantesco tomou as ruas de São Paulo em 25 de janeiro, treze dias após o de Curitiba. Manifestação ocorreu na Praça da Sé |

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Comício gigantesco tomou as ruas de São Paulo em 25 de janeiro, treze dias após o de Curitiba. Manifestação ocorreu na Praça da Sé

Dante de Oliveira, autor de emenda que previa as eleições diretas |

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Dante de Oliveira, autor de emenda que previa as eleições diretas

Capa da Gazeta do Povo de 13/01/1984, com chamada sobre o comício |

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Capa da Gazeta do Povo de 13/01/1984, com chamada sobre o comício

Reportagem publicada na edição de 14/01/1984 da Gazeta do Povo repercute o comício |

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Reportagem publicada na edição de 14/01/1984 da Gazeta do Povo repercute o comício

O ano de 1984 começou com a certeza de que a ditadura instalada no Brasil 20 anos antes estava à beira do fim. Mas ainda havia dúvidas: como e quando a democracia voltaria? E um problema mais imediato: quem escolheria o próximo presidente, responsável pela transição? Os militares e o PDS, partido herdeiro da Arena no apoio ao regime, defendiam escolha indireta, via colégio eleitoral. A oposição resolveu sair às ruas para pedir que se restituísse o direito ao voto imediatamente. "Diretas Já" era o que se exigia. E a primeira vez em que o grito se fez ouvir foi em Curitiba, há exatos 30 anos, no 12 de janeiro de 1984.

SLIDESHOW: Veja mais fotos do comício histórico de Curitiba e outras manifestações das Diretas Já

Três décadas depois, a importância do movimento iniciado pelo comício da Boca Maldita é clara. Sabe-se que a campanha pelas diretas se transformou em um dos grandes marcos cívicos da República, principalmente pela mobilização de multidões nas principais praças do país. A pressão popular, incentivada pelo PMDB e por outros partidos de oposição, não conseguiu fazer com que o Congresso aprovasse a emenda Dante de Oliveira, que viabilizaria as eleições diretas para presidente. Mas foi fundamental para enfraquecer ainda mais o regime e para sepultá-lo poucos anos depois.

Tensão e festa

No entanto, até o início da noite de 12 de janeiro, quando o povo começou a se juntar perto da Praça Osório, era difícil saber o que se seguiria. Não havia quem arriscasse dizer que o comício seria um sucesso. Curitiba, que nunca foi conhecida pela participação política, estava esvaziada pelas férias. E a população, que não tivera liberdade para se manifestar por duas décadas, lia nos jornais notícias de que, se houvesse quebradeiras ou tumultos nos comícios, haveria risco inclusive de retrocesso na redemocratização que já estava em curso. Falava-se inclusive em Estado de Sítio.

Mas, quando a praça começou a encher e os gritos se elevaram, houve alívio dos organizadores: havia interessados em apoiar a causa. E gente feliz por poder se manifestar daquele jeito.

"O que mais marcava era a emoção das pessoas, a alegria estampada no rosto", diz o fotógrafo Carlos Ruggi, que rodou calçadão da Rua XV em busca de imagens da noite histórica para o jornal O Estado de S. Paulo. Experiente na cobertura política, ele conta que até quem estava lá por outros motivos se impressionou com a manifestação. "A gente sabia quem eram os P2 [serviço reservado da PM], que iam às manifestações para informar o governo. Um deles, no meio da noite, passou por mim e elogiou o comício. ‘Bonita manifestação’, ele falou para mim", conta o fotógrafo. Rubens Vandresen, fotógrafo da Gazeta do Povo, diz que as pessoas sabiam estar presentes em um evento histórico.

Publicitário responsável por criar a campanha das Diretas Já e os filmes que convocaram a população para o comício, Ernani Buchmann lembra que havia receio de que tudo pudesse dar errado. "Quando bota um general no palácio, o povo imediatamente fica com medo. E imaginamos que podia ir pouca gente porque tivemos só 12 dias para organizar tudo. Mas, quando começou, subi no Hotel Braz e vi a cena: havia gente até depois da Travessa Oliveira Belo", diz.

Disputa numérica

O número de presentes ao comício foi uma das grandes disputas nos dias seguintes. Havia quem falasse em 60 mil manifestantes. Outros, que só havia 10 mil. De qualquer jeito, era uma pequena multidão que só se via na cidade em Atletibas, diz Ruggi. O PDS, tentando desmerecer a manifestação, dizia que boa parte havia sido trazida a soldo pelo PMDB em caravanas saídas do interior. E um editorial do jornal O Estado do Paraná dizia que, mesmo se houvesse 40 mil pessoas, o número desmentia Ulysses Guimarães, o símbolo das Diretas. Como podia Ulysses dizer que 90% da população era favorável às Diretas se só 3% dos curitibanos foram às ruas?

Ulysses, que fez o discurso mais importante da noite, comemorou não só a presença da multidão, mas a calmaria do comício, que foi protegido por 3,5 mil policiais do governo paranaense, na época nas mãos do próprio PMDB. "Quando se dizia por aí – as corujas agourentas – de que isso era subversão, desordem e que iria ocorrer depredações, nós verificamos que não ocorreu qualquer incidente. Eu quero dizer que foi numa festa", disse Ulysses, segundo relato da Gazeta do Povo. E a festa estava apenas começando.

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