
Poucos funcionários, estrutura precária, falta de recursos e submissão aos interesses de um determinado governo não afetam apenas a imagem dos institutos públicos de pesquisa. Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a situação prejudica o planejamento do país, que segue sem projetos de longo prazo em praticamente todas as áreas.
Para José Matias-Pereira, especialista em administração pública e professor Universidade de Brasília, os governos têm deixado as pesquisas econômicas em segundo plano. "Essas instituições são relevantes para a economia e o mercado. Na medida em que vão perdendo fôlego, chega a um ponto em que perdem suas finalidades", diz ele. Matias-Pereira aponta outro problema: a falta de rigor. "No passado, uma pesquisa era submetida ao corpo técnico da instituição, era criticada. Agora, estão divulgado imediatamente, o que é um enorme risco."
O aparelhamento das instituições, com a nomeação de políticos, é outro problema. "Há um processo generalizado, principalmente em estados governados pelo PT e seus aliados. O critério para a entrega dos cargos tem sido político", critica Matias-Pereira. "Isso tem um efeito danoso, pois há o risco pessoas despreparadas gerirem essas instituições e de as pesquisas serem direcionadas para atender os interesses dos governantes. Por outro lado, há o problema do descrédito. O dano que o erro causou à imagem do Ipea, por exemplo, é muito forte", diz ele, se referindo à divulgação equivocada de que 65% dos brasileiros concordam que mulheres que se vestem de forma ousada merecem ser estupradas (o dado correto era 26%).
Sistema híbrido
Para Christian Luiz da Silva, coordenador do Mestrado em Planejamento e Governança Pública da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), os institutos devem ter independência em relação aos governos. "O Ipardes já teve uma participação efetiva no processo de planejamento do estado, mas teve períodos de ostracismo. Os institutos acabam sendo atropelados por decisões de governo", comenta. "Deixar só nas mãos de um governo pode aniquilar o processo de produção científica. O Brasil devia pensar em um modelo híbrido [de gestão]."
O professor avalia que a falta de dados atualizados prejudica o planejamento e a formulação de políticas públicas. "Isso acontece não só por falta de pessoal, mas também devido à falta de continuidade nos levantamentos, o que dificulta qualquer tipo de planejamento", diz. "Uma dificuldade no Brasil é nossa visão de curto prazo, estamos sempre preocupados com o que vai acontecer no ano seguinte ou no máximo em quatro anos. É preciso uma mudança de paradigma de gestão. Sem informações consistentes, o país vai continuar trabalhando sempre em cima da mesma lógica."



