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E se Tancredo tivesse sido presidente?

Nova República começou há exatos 30 anos com a posse de Sarney, o vice que substituiu oeleito – internado às pressas na véspera

Tancredo discursa com Sarney ao fundo:  historiadores dizem que os dois eram semelhantes. | Célio Azevedo/Senado/Arquivo
Tancredo discursa com Sarney ao fundo: historiadores dizem que os dois eram semelhantes. (Foto: Célio Azevedo/Senado/Arquivo)

Há exatos 30 anos, a ditadura militar acabava. Mas não da forma como era esperado. Primeiro presidente civil desde João Goulart, Tancredo Neves seria empossado naquele 15 de março de 1985. Mas foi internado com fortes dores abdominais na véspera. Ele não se recuperou: em 21 de abril, morreu no Hospital das Clínicas, em São Paulo, após sete cirurgias. Oficialmente, ele é considerado o primeiro presidente da Nova República. Na prática, porém, quem assumiu o mandato foi seu vice, José Sarney.

A morte de um presidente eleito às vésperas de ser empossado, ainda mais em um dos momentos mais delicados da história do país, torna o questionamento impossível: e se ele sobrevivesse, o Brasil de hoje seria diferente?

A chapa Tancredo/Sarney era a moderação em estado puro. As mesmas alianças e linhas de força os condicionavam e delas eles dificilmente se livrariam.”

Daniel Aarão Reis, historiador.

Para o historiador Daniel Aarão Reis, autor do livro Ditadura e Democracia no Brasil, Tancredo era um político moderado, que tendia ao diálogo – o que o aproxima de Sarney. Com bom trânsito entre civis e militares, a condução da transição seria muito similar. “Não creio que Tancredo Neves faria um governo substancialmente diferente do de Sarney. Sua tradicional moderação, seu diálogo com os militares, seu trânsito junto às elites dominantes do país colocariam para eles parâmetros incontornáveis”, afirma. “A chapa Tancredo/Sarney era a moderação em estado puro. As mesmas alianças e linhas de força os condicionavam e delas eles dificilmente se livrariam.”

Já o historiador Osvaldo Siqueira, da Universidade Tuiuti do Paraná, avalia que, apesar de ser uma “oposição consentida” pelos militares, Tancredo não tinha vínculos fortes com o regime, ao contrário de Sarney. Isso poderia ter feito a diferença – apesar de ser “impossível” projetar quanto. “Apesar de o regime estar em processo de mudança, nós ainda tínhamos uma mecânica [de poder] que envolvia civis e militares ligados à ditadura”, afirma.

Para Siqueira, Tancredo também não teria tomado decisões “vexatórias” como o congelamento dos preços. Inicialmente, isso gerou um boom de popularidade para Sarney, mas acabou agravando ainda mais o problema da hiperinflação.

Quem assume?

Com Tancredo internado, Sarney tomou posse em 15 de março. Inicialmente, de forma interina. A Constituição previa, na verdade, que o presidente do Congresso, Ulysses Guimarães, assumisse, caso Tancredo morresse – e que novas eleições, também indiretas como a que elegeu Tancredo, deveriam ser realizadas.

Alvaro Dias, que era senador na época, conta que a preocupação com essa indefinição era grande – havia um temor de que a instabilidade política poderia favorecer o retorno dos militares. “Nossa preocupação era de que o consenso prevalecesse. Ouvimos o Supremo, o Exército e o Congresso. Precisávamos de uma definição rápida”, afirma. Decidiu-se que Sarney assumiria. “Foi uma decisão segura e tranquila. Ulysses foi muito compreensivo em não pleitear [a Presidência]. O momento exigia compreensão”, afirma.

Para Aarão Reis, o medo era exagerado. “Naquela altura, não havia mais ameaças de um retrocesso – a extrema-direita já fora desativada e as Diretas Já, embora derrotadas em seu objetivo, haviam conferido uma legitimidade social à transição democrática.”

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