
Não há asfalto que chegue para atender a todos os pedidos dos moradores na Regional Boqueirão. Muitas das centenas de ruas esburacadas que dominavam o cenário dos quatro bairros da região (Boqueirão, Alto Boqueirão, Hauer e Xaxim) receberam melhorias nas últimas semanas. Se isso trouxe alegria para uma parte da população, atiçou ainda mais a raiva daqueles que moram nas vias não contempladas com novo recapeamento. "As ruas estão que é um buraco só. Agora, com a política, melhorou pra uns, mas na minha não fizeram nada, nem sinal", conta o aposentado Antonio Nunes da Silva, 66 anos.
Na Rua da Cidadania do Carmo, uma senhora de idade, ao ver a reportagem entrevistando Silva, anuncia aos quatro ventos, sem parar para se identificar: "Na Rua Padre Deon não foi feito nada, ali tem muito buraco, você sai de casa de carro é uma tremedeira só. Não dá para fazer milagre, mas alguma coisa tem de ser feita".
A aposentada Geni Marcondes Soares, 64 anos, teve sorte. Ela mora na Rua das Carmelitas, uma das que recebeu novo pavimento, e diz que está satisfeita com o "postinho", oficialmente unidade de saúde. "Vou lá para cuidar da pressão e pegar meus remédios. Sempre entregam, sem problemas." Mas a demora no atendimento de urgência no Boqueirão quase lhe tirou a vida um ano atrás, conta. "Fui lá porque estava com princípio de infarto, mas me deixaram 24 horas sentada num sofá. Eles não tinham onde me internar. A pressão estava acima dos 20. Quando melhorei um pouco, saí de lá e fui atrás de um convênio."
Transporte
O Boqueirão é privilegiado em alguns aspectos de mobilidade urbana. Nos quase 6 quilômetros da Avenida Marechal Floriano Peixoto que cortam a regional, o biarticulado Ligeirão faz a ligação com o Centro. Quem mora no Xaxim também conta com a rapidez do veículo azul, que não precisa enfrentar os constantes congestionamentos da Linha Verde. Além disso, na Marechal há uma ciclofaixa ao longo de quatro quilômetros. O que os moradores acham disso?
"Você quer que eu responda em tópicos?", rebate o estudante de engenharia cartográfica Alexandre Guilherme Boza, 26 anos, que usa a ciclovia todos os dias. "Parece que a preocupação maior foi com visual, não com a praticidade. Vai contra todas as leis do Código de Trânsito Brasileiro", reclama. Ele diz que acompanhou todas as discussões em torno dos erros na obra, como a construção de trechos com apenas 72 centímetros internamente quando o mínimo deveria ser de 100 cm, segundo o Ministério das Cidades.
Para Boza, que usa a bicicleta diariamente há cerca de dez anos, o zigue-zague na ciclovia da Marechal Floriano é muito perigoso às vezes ela está do lado esquerdo da rua, às vezes do lado direito. "A iniciativa foi boa, mas o método não. Há bastante gente usando a ciclovia, isso é bom, mas a parte ruim é que a gente fica que nem zonzo indo de um lado para o outro, pode ocorrer um acidente grave", avalia.
Na Praça Menonita, jovens correm atrás de sonhos
Futebol é o que motiva um grupo de jovens a se dedicar aos estudos pela manhã e a treinar duro na Praça da Colonização Menonita, no Boqueirão, duas vezes por semana. A recompensa é atuar no time de juniores do Vila Hauer e, um dia, quem sabe, virar jogador profissional.
"É uma maneira de ocupar o tempo ocioso da garotada. Assim eles não têm tempo para drogas ou para ficar em casa sem rumo. Junto com isso podemos descobrir talentos para o futebol", diz o coordenador do projeto, Sergio Donizetti Luciano, 50 anos, professor da rede estadual. Cerca de 60 jovens participam da atividade, e algumas famílias contribuem com doações.
Luciano diz que cansou de procurar apoio do poder público. "Não queremos contato político. A prefeitura queria que a gente montasse uma associação. Mas a gente quer fazer o trabalho social pelo social, não pelo vínculo. A gente não está aqui para vender o peixe de ninguém", explica. Na praça, entretanto, eles contam com o apoio da unidade da Secretaria de Esporte e Lazer, que cede alguns equipamentos. "Eles gostam que a gente treine aqui, ajuda a valorizar a praça, a torná-la mais segura, mais familiar."
Para o professor, o setor privado também exige muito para dar apoio. "Não entendo por que a empresa precisa aparecer em patrocínio, na camiseta. Se ela deduz do imposto, já está ótimo. Não precisa colocar a marca." Ele diz que acompanha o andamento dos estudos dos garotos. "Todos estudam, mantemos contato com os responsáveis, mas como treinador às vezes fazemos papel de pai e mãe também." Em todas essas funções ele conta com o apoio do treinador Thiago Luciano, 29 anos, e Rafael Luís de Araújo, 24 anos, treinador de goleiros.
Doações são sempre bem-vindas, ele diz, para bancar o treino de alto rendimento. "A nossa esperança é que saiam daqui como atletas. Mas, se não der, pelo menos serão grandes cidadãos. Vão aprender a correr atrás de seus sonhos, mesmo sem apoio."






