
As chamadas "cartas de compromisso" têm se tornado as principais armas da sociedade civil organizada em ano eleitoral para fazer com que os candidatos atendam a uma lista de reivindicações. Entidades e sindicatos elencam os problemas e os políticos passam a caneta em um documento, que, teoricamente, deveria ser analisado e, se possível, implantado no plano de governo. Mas especialistas alertam: as assinaturas pouco valem, e podem servir apenas como plano eleitoreiro.
Cético diante das inúmeras propostas apresentadas no Paraná, o cientista político e professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) de Foz do Iguaçu, Bruno Bolognese, enfatiza que o eleitor não deve ser ingênuo ao creditar um pedido de melhoria ao candidato no calor da campanha. Para ele, até mesmo os políticos se perdem diante do emaranhado de pedidos e como consequência, as cartas acabam engavetadas.
"Político que não promete não leva. É uma ingenuidade achar que o candidato vai mudar sua plataforma de governo, previamente estabelecida, para beneficiar uma região só porque ele disse que ia [ajudar]. Essas cartas não revertem nenhum tipo de pressão", argumenta.
Menos descrente, o cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Mário Sérgio Lepre, pontua que algumas reinvindicações até podem ser absorvidas e incorporadas em uma agenda de governo, desde que englobem uma demanda geral de necessidades, como saúde, por exemplo. "Os gargalos sociais são previamente medidos, planejados e alinhavados na pauta governamental e podem, sim, sofrer alguma alteração devido à manifestação. Mas pedidos pontuais como de alguns sindicatos, esses certamente acabam descartados, pois destoam do eixo do governo."
Quem elabora o material diz que a discussão é necessária, e mesmo que não haja cumprimento total das demandas, ainda assim é uma maneira de a sociedade pressionar os governantes. "A mudança de cultura precisa acontecer. A sociedade deve acompanhar o candidato e cobrá-lo. Isso só é possível por mecanismos como as cartas de compromisso", diz a presidente do Observatório Social de Maringá (OSM), Fábia dos Santos Sacco. Segundo ela, a sociedade deveria assumir o "lado A" da política, deixando o "lado B" para os candidatos. "Nós somos os responsáveis pelos nossos passos, começando pelo voto."
A instituição ajudou a escrever a "Agenda Maringá" carta elaborada por várias entidades do município e entregue aos postulantes ao Palácio do Iguaçu. Como pedido, o observatório solicitou transparência completa nos portais do governo, para garantir informação sobre gastos e investimentos no estado. Além do OSM, a Arquidiocese e o Sindicato Empresarial da Indústria e do Vestuário (Sindvest) também elaboraram uma lista de demandas.
"Mesmo que nem todos os nossos pleitos sejam atendidos, esperamos que seja criada uma ponte entre a moda paranaense e o governo para que tenhamos um espaço permanente para debater o setor", diz o presidente do Sindvest, Cássio Murilo Almeida.
Educação também foi tema dos documentos. Em Londrina (Norte) e em Curitiba, entidades reforçaram os problemas enfrentados no estado. E mesmo que o tamanho da promessa não chegue nem perto do orçamento, diz o presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Técnicos Administrativos da Universidade Estadual de Londrina (Assuel), Arnaldo Mello, ainda vale insistir no diálogo. "Se eles [os candidatos] não tiveram nenhum compromisso assinado, fica mais difícil ainda para cobrar."
Padre de Catanduvas desabafa e pede: "Olhem por nós"
Em Catanduvas do Sul falta um pouco de tudo, diz o padre Leocárdio de Oliveira. Responsável pela paróquia do município há quatro anos, ele conta que a comunidade se sente esquecida pelos governantes. E, para fazer com eles prestem atenção na localidade, o povo resolveu pular a etapa da carta e ir logo para o protesto pacífico, como o fechamento da principal praça da cidade.
Uma das reivindicações é na área da segurança. De acordo com o padre, a cidade não tem efetivo policial. "Se tiver que chamar a polícia, tem que ser de Contenda, que fica a 12 quilômetros, ou Araucária, mais longe ainda, 18 quilômetros. E o pior é ter que ir por estrada de terra, pois não há asfalto que ligue as cidades", diz o religioso, que também elenca a falta de rodovia como outro tormento.
Ainda na lista estão problemas estão a iluminação pública, ausência de um posto de combustíveis, de uma farmácia e até o sinal de celular. "Para fazer uma ligação é preciso encontrar o ponto que fica em frente à igreja. Não estamos pedindo muito, apenas que olhem por nós", desabafa o padre.



