
Menos de 11% dos eleitores curitibanos dizem achar justo que os ex-governadores recebam aposentadorias especiais após o encerramento de seus mandatos. No entanto, mais da metade (53%) aceitariam receber o benefício caso tivessem direito ou ao menos cogitariam aceitá-lo. Para especialistas, a contradição mostra uma sociedade que tem dois pesos e duas medidas: o mesmo ato é julgado de duas maneiras diferentes, dependendo de quem é o beneficiado na situação.
As respostas dos eleitores foram dadas ao Instituto Paraná Pesquisas, em levantamento de opinião encomendado pela Gazeta do Povo. Foram ouvidas 508 pessoas na capital entre os dias 27 e 29 de janeiro, depois que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) iniciou uma onda de protestos públicos contra o benefício dado a ex-governadores de 17 estados que pagam as pensões vitalícias. No Paraná, nove ex-governadores e quatro viúvas de ex-chefes do Executivo estadual recebem R$ 24,8 mil mensais da pensão especial. Por considerar o pagamento ilegal, a OAB está entrando com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar o benefício em todo o país.
Injusto ou justo?
Quando indagados sobre o que pensam da aposentadoria dos ex-governadores, só 10,8% dos eleitores curitibanos dizem considerar o benefício justo. Outros 84,4% classificam-no como injusto.
Mas a situação muda completamente de figura se o beneficiário, hipoteticamente, fosse o próprio entrevistado. Nessa situação, apenas 42,7% dizem ter certeza de que não pediriam a aposentadoria especial. Pediriam o benefício com certeza 20,7% o que já representa o dobro dos que consideram o pagamento justo. E outros 32,3% dizem que iriam pensar no caso.
Para o cientista político Luiz Domingos Costa, da Faculdade Uninter, o resultado do levantamento não chega a ser uma surpresa. "Outras pesquisas nacionais já mostraram essa dubiedade de parte do eleitorado. Quando se trata de julgar os políticos, o critério é um. Quando a situação polêmica chega mais perto do cidadão, ele acaba relativizando o seu julgamento inicial", afirma.
Apesar disso, Costa considera o fato lamentável. "Não é esse o tipo de valores que constroem uma sociedade mais consciente." A "moral dupla" já havia aparecido, por exemplo, na pesquisa do cientista político Alberto Carlos Almeida para seu livro A Cabeça do Eleitor. No estudo, os eleitores eram levados a responder o que consideravam aceitável e o que era condenável. "Há muitas pessoas que acabam considerando que o que é válido para elas não é para os outros. É um duplo julgamento que acontece constantemente", afirma Almeida.
Segundo ele, é desse eleitorado que responde de maneira dúbia que sairão "os novos governadores do país". Afinal, os políticos acabam refletindo, pelo menos parcialmente, o pensamento da sociedade. "Considere que esse cidadão que respondeu [que poderia pedir a aposentadoria especial] é eleito. Ele não vai mudar seu jeito de pensar só porque foi eleito. E as coisas se perpetuam assim", diz Almeida.
O diretor do Instituto Paraná Pesquisas, Murilo Hidalgo, afirma que o resultado do levantamento acaba sendo até uma mensagem para os políticos. "O eleitor está dizendo que a defesa de quem pede benefícios especiais não vai ser tão difícil nem vai abalar a sua próxima campanha eleitoral. Mostra que o eleitor é capaz de relevar esse tipo de comportamento."




