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Juiz que conduz a Operação Lava Jato reclama de condenação do caso ‘Banestado’ | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Juiz que conduz a Operação Lava Jato reclama de condenação do caso ‘Banestado’| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

“Há algo de errado em um sistema criminal que leva tanto tempo para produzir uma condenação definitiva.” O desabafo é do juiz federal Sérgio Moro - que conduz os processos da Operação Lava Jato - em despacho sobre a execução de pena de prisão para o ex-funcionário do Banco do Estado do Paraná, Aldo de Almeida Júnior, “quase 20 anos desde os crimes” e “quase 12 anos desde a sentença de primeiro grau”. O réu foi o principal condenado entre os agentes públicos do banco no mega esquema criminoso do Caso Banestado.

“Trata-se de processo relativo a um dos maiores crimes financeiros da história recente do Brasil, com a estruturação de esquema fraudulento de remessa de pelo menos R$ 2.446.609.179,56 nos anos de 1996 a 1997 ao exterior, o que favoreceu criminosos de toda a espécie”, resume Moro.

Ainda não havia sido tornado público, mas no despacho do dia 2 de fevereiro, o juiz da Lava Jato recebeu autorização do Supremo Tribunal Federal (STF) para mandar executar a prisão de Almeida Junior, após uma novela infindável de “recursos protelatórios”. No documento, em tom de desabafo, ele ataca a estratégia da defesa - o sistema de recursos judiciais brasileiro é possível e está previsto em lei - e as prescrições de penas no caso.

O juiz da Lava Jato conduziu o processo originário do escândalo do Banestado, que apurou fraude bilionária via envio de recursos para fora do País por meio de contas de residentes no exterior (contas CC5). Na denúncia do Ministério Público Federal - recebida pela Justiça Federal do Paraná no dia 6 de agosto de 2003 -, 14 ex-funcionários do banco foram acusados por evasão de divisas e formação de quadrilha. Os réus foram condenados no dia 2 de agosto de 2004 a penas de prisão que variaram de 4 a 12 anos.

Novela de recursos

Depois da primeira sentença do processo contra os ex-funcionários do banco, apenas dois não apelaram contra a condenação dada pela Justiça do Paraná, Gabriel Nunes Pires Neto e José Luiz Boldrini. Sem recursos, seus processos já transitaram em julgado - foram encerrados - e as penas já executadas.

As defesas dos demais condenados recorreram ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4). A corte, de segundo grau, absolveu todos pelo crime de quadrilha e manteve a condenação por gestão fraudulenta e evasão de divisas - em julgamentos de uma apelação e de embargos infringentes realizados em fevereiro de 2006 e junho de 2008. Além de reduzir as penas, fixou para todos os condenados o regime semiaberto para o início de cumprimento da pena.

Para Moro, desde então, a estratégia das defesas foi recorrer a “recursos protelatórios”. “Desde o acórdão no TRF 4, em 2008, no qual houve redução das penas, foram interpostos somente recursos de caráter protelatório pelas defesas, o que levou ao reconhecimento da prescrição para boa parte dos condenados”, escreve Moro. “Aliás, entre 2014 e 2015, só não houve trânsito pela insistência da defesa em recurso sabidamente inadmissível. A única vitória desde então foi a prescrição parcial.”

O principal acusado no banco, Aldo de Almeida Júnior, teve pena fixada de cinco anos e dez meses de reclusão. Mesmo com a pena reduzida e inocentado pelo crime de quadrilha, ele recorreu da decisão do TRF 4. Valderi Werle e Carlos Donizeti Spricido, que foram julgados no mesmo caso, não apresentaram recursos para contestar a pena. Carlos Donizeti Spricido está foragido desde o julgamento.

Prescrição

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), as defesas dos réus tiveram parte dos recursos especiais e extraordinários admitida, e outra parte não. Um deles, o Recurso Especial nº 1115275, julgado em 13 de setembro de 2011, manteve a sentença do TRF4.

“Diversos dos condenados apresentaram embargos de declaração”, registra Moro. Sete conseguiram, pelo tempo transcorrido, que o STJ declarasse, em 19 de março de 2013, a extinção da punibilidade pela prescrição das penas. Decisão que livrou sete dos condenados: Sergio Eloi Druszcz, Oswaldo Rodrigues Batata, Milton Pires Martins, Clozimar Nava, Alcenir Brandt, Altair Fortunato e Onorino Rafagnin.

Novos embargos de declaração foram apresentados, então, pelas defesas dos réus com condenação passível de execução, sendo que parte deles foi provido, parte não, mas sem alteração das penas.

O próprio STJ assinalou o uso de estratégia protelatória adotada pelas defesas, em 8 de maio de 2014, quando a 5ª Turma rejeitou os embargos, apresentados no recurso especial 111527. O ministro Moura Ribeiro, relator do processo, considerou “que a insistência dos embargantes” contra decisão da 5ª Turma “revela nítido caráter puramente protelatório”.

“Buscando prolongar indevidamente o curso do processo, a fim de evitar o trânsito em julgado da decisão condenatória e o cumprimento da pena imposta, constituindo dessa forma, abuso de direito em razão da violação dos deveres de lealdade processual e comportamento ético no processo, além do próprio desvirtuamento do postulado da ampla defesa”, escreveu o ministro do STJ, em trecho da decisão reproduzido no despacho de Moro.

“Apesar de na esfera penal não ser possível a aplicação de multa por litigância de má-fé, é plenamente possível, antes do trânsito em julgado da condenação, a baixa dos autos para que se inicie o cumprimento da pena imposta”, determinou o relator do caso no STJ.

O caso foi enviado de volta para Curitiba, em 16 de maio de 2014, para execução das penas, com expedição de mandados de prisão contra Aldo de Almeida Júnior, Alaor Alvim Pereira e Benedito Barbosa Neto. Os dois últimos foram presos e a execução corre na 12ª Vara Criminal Federal de Curitiba.

No caso de Aldo de Almeida Júnior, sua defesa apresentou um habeas corpus (HC 122.592) no STF- última instância para recursos - em que buscou “obstaculizar a sua prisão”, nas palavras de Moro. Os autos subiram novamente para a corte suprema e o ministro do STF, Edson Fachin, negou seguimento ao recurso.

O caso teve desfecho só no final de 2015, retornando para Moro. “Seguiram os já patológicos, em nosso sistema processual, embargos de declaração e agravos regimentais até que a Colenda Primeira Turma do STF, julgando os embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário, negou provimento e determinou a certificação do trânsito em julgado diante dos recursos protelatórios”, registra o juiz da Lava Jato.

No despacho em que desabafou sobre o uso de recursos protelatórios e da prescrição de penas, Moro determina que “finalmente vencida essa etapa, expeça-se nova guia para execução definitiva da pena contra Aldo de Almeida Júnior”.

Indulto humanitário

O réu, no entanto, fez um novo pedido ao juiz Sérgio Moro. A defesa alegou elevada idade do condenado e razões de saúde e pleiteou “indulto humanitário”.

“Não houvesse o condenado e sua defesa atrasado, com recursos protelatórios, o trânsito em julgado desde pelo menos 2008, certamente não teria o condenado idade tão elevada para cumprir a pena”, afirma o juiz. “Não parece a este Juízo que, quem deu causa ao problema, deve dele beneficiar-se, máxime diante da elevada gravidade em concreto dos crimes pelos quais foi condenado.”

A decisão ficou sobre a responsabilidade da 12ª Vara Federal, em Curitiba, com os juízes Carolina Moura Lebbos e Danilo Pereira. “A decisão caberá à 12ª Vara, sendo possível o recolhimento do condenado à prisão no Complexo Médico Penal, onde poderão ser avaliadas, por médicos oficiais e não particulares, as suas reais condições de saúde.”

Em 4 de fevereiro deste ano foi expedido mandado de prisão para Aldo de Almeida Junior, para ser recolhido ao Complexo Médico-Penal, em Pinhais. O condenado, no entanto, estava hospitalizado e iniciou nova fase de recursos para conseguir o direito de cumprir pena em casa.

Em abril, a juíza federal da 12ª Vara indeferiu o pedido de “indulto humanitário” e concedeu direito à custódia domiciliar para o condenado, sob monitoramento de tornozeleira eletrônica.

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