O projeto de lei que regulamenta a função do agente político dos deputados estaduais, aprovado pela Assembleia Legislativa do Paraná no último dia 12, é inconstitucional. Essa é a opinião de quatro especialistas consultados pela Gazeta do Povo. A proposta está agora nas mãos do governador Orlando Pessuti para sanção ou veto. Por lei, ele tem 15 dias para tomar uma decisão sobre o projeto. Caso Pessuti perca o prazo, a lei será promulgada pela própria Assembleia e entre em vigor imediatamente.
A proposta cria uma série de normas para a contratação do agente político ou "assessor parlamentar", nome oficial do cargo. Pelo projeto, esse servidor não concursado, de indicação política, está autorizado a trabalhar nas bases dos deputados.
A lei foi aprovada como uma resposta para "moralizar" a Assembleia, após a série de reportagens "Diários Secretos", da Gazeta do Povo e da RPC TV, ter denunciado a existência de assessores parlamentares que não trabalhavam ou que atuavam como cabos eleitorais dos deputados em suas bases políticas.
Apesar de a intenção da proposta ter sido acabar com o desvio de função, o projeto está cercado de polêmicas. Ele não define exatamente quais são as atribuições do cargo, critérios para a contratação e quem deve controlar o trabalho do agente político (resultados do trabalho, frequência, etc.). O projeto ainda autoriza os servidores a terem duplo emprego na iniciativa privada, desde que a carga horária dessa função paralela não chegue às 40 horas semanais.
Tarefas detalhadas
Para o advogado André Barbi, diretor do Instituto Gamma de Assessoria a Órgãos Públicos (IGAM), que trabalha com Direito Governamental e de Direito Parlamentar, a criação de um cargo se sujeita ao princípio constitucional da eficiência no setor público. "Argumentos evasivos, como o de que o Senado e a Câmara também procedem dessa ou de outra forma [como foi feito por alguns deputados estaduais], não dão lastro técnico para a criação dos cargos. É necessário que haja a descrição detalhada das tarefas a serem desempenhadas, conforme a natureza e as respectivas complexidades", diz Barbi.
O advogado salienta que não é possível o servidor controlar a si próprio mediante a produção de relatórios a serem enviados à Assembleia, como prevê a lei. "É a Assembleia quem deve estabelecer mecanismos de controle que sejam eficientes, eficazes e efetivos no atendimento do interesse da sociedade", enfatiza o advogado.
Por isso, segundo ele, não seria suficiente a indicação genérica do que cabe ao assessor fazer. É necessário que as tarefas sejam claramente definidas, inclusive para que se tenha condições de aferir o grau de instrução de quem poderá ser nomeado.
"A criação dos cargos está sujeita ao princípio da eficiência, a justificação social e institucional dos cargos e somente será legítima e juridicamente válida se restar claramente demonstrada a necessidade prática dos resultados desencadeados pelas tarefas a serem executadas, tendo em conta o interesse da sociedade", diz Barbi. Para ele, o cargo de assessor parlamentar parece mais ter sido criado para atender interesses pessoais dos deputados do que objetivos institucionais do Legislativo.
O professor de Direito Constitucional Egon Bockmann Moreira, da UFPR, afirma que foi dada uma ornamentação jurídica ao projeto de lei. "Mediante o uso de algumas palavras-chave, tenta-se transformar o ilegal em legal", afirma Bockmann. "Mas o problema não está só nas palavras, mas na natureza jurídica do cargo a ser criado. Trata-se de cargo em comissão extraordinário, para que a pessoa de confiança realize tarefas incertas e não sabidas, distantes do deputado. Trata-se de cargo de confiança para agente público que 'criará' a atividade a ser desempenhada e não se situará na necessária relação hierárquica que rege a natureza dos cargos públicos."
Juliano Jaronski professor de Ciências Políticas e Direito Constitucional e mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Coimbra (Portugal) também salienta que a especificação das funções a serem desempenhadas são essenciais para a legalidade da criação de cargos. Ele também demonstra preocupação com as formas imprecisas de avaliação do trabalho. "A quem competirá analisar os relatórios dos assessores? De que modo será realizado o controle de horário? Pelo que posso observar, não existirá qualquer análise, salvo relatórios que não sabemos de que modo serão elaborados."
Veja todas as denúncias feitas pelo jornal Gazeta do Povo e pela RPCTV sobre os Diários Secretos da Assembleia Legislativa.



