
Contrariando sentença do Supremo Tribunal Federal (STF), a União vai depositar hoje na conta dos governos estaduais a primeira parcela do Fundo de Participação dos Estados (FPE) deste ano. Encontrar uma argumentação jurídica para "driblar" o Supremo e fazer o depósito foi a solução encontrada pelo governo federal para que muitos estados não quebrassem. Será uma solução paliativa, já que quase todos os governos estaduais enfrentam problemas de caixa devido, em grande medida, às distorções do federalismo brasileiro, que concentra na União a arrecadação nacional.
Em 2010, o STF havia declarado inconstitucionais as regras de divisão do FPE e determinado que uma nova partilha fosse votada pelo Congresso até 31 de dezembro de 2012. Sem consenso, isso acabou não sendo feito pelos parlamentares o que, em tese, significaria que os repasses da União teriam de cessar a partir deste mês. Mas o governo federal decidiu fazer o depósito com base no argumento jurídico de que o repasse de hoje se refere à arrecadação de dezembro e que, nesse caso, as regras ainda seriam válidas.
Ainda há dúvida sobre o que a União fará em fevereiro. Mas ganhou tempo para não desagradar aos estados. A perda do dinheiro do FPE traria um imenso desgaste político para a presidente Dilma Rousseff diante de todos os governadores. Eles já reclamam fortemente de que os incentivos fiscais concedidos pelo governo federal para estimular a economia provocam perdas também para a arrecadação dos estados. Quando a União abre mão de um tributo, obriga os governos dos estados a também renunciar àquela receita, pois os uma parcela dos impostos federais necessariamente tem de ser partilhada com os estados e os municípios, que também enfrentam dificuldades financeiras.
As desonerações tributárias da União vêm sendo rotineiras desde que eclodiu a crise econômica internacional, em 2008. No ano passado, elas somaram R$ 45 bilhões, quase o mesmo valor do FPE de 2011, cujos repasses aos estados chegaram a R$ 48 bilhões.
No início dessa política de desonerações, o Planalto se mobilizou para dar compensações aos estados. Mas isso não ocorre mais. Além disso, a União consegue perder arrecadação de impostos porque compensa com as contribuições sociais tipo de tributo que, legalmente, não precisa partilhar com estados e municípios. É o caso da Cide, o imposto sobre os combustíveis.
O economista Gabriel Leal de Barros, do Ibre/FGV e autor de um recente estudo sobre pacto federativo no Brasil, explica que os tributos que fornecem as principais receitas que alimentam o FPE e o FPM (Fundo de Participação dos Municípios) são o Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados. Mas, ao longo dos anos, o maior esforço de arrecadação da União tem sido justamente sobre as chamadas contribuições sociais. Segundo cálculos da FGV, de 1997 a 2011, a arrecadação com impostos federais subiu 1,9 ponto porcentual algo como R$ 203 bilhões. Já a arrecadação das contribuições subiu 2,1 pontos, chegando a R$ 175 bilhões.
O economista José Roberto Afonso considera que a União precisa ser mais generosa na divisão dos tributos. Ou seja, incluir no bolo do FPE e do FPM as contribuições e não apenas impostos. "É preciso discutir o tamanho do bolo e como se distribui esse bolo", diz o economista.
Outro problema dos estados e municípios é o perfil de seus gastos. Enquanto a União tem margem para usar a arrecadação com políticas públicas e investimento, governos estaduais e prefeituras têm usado grande parte da receita para fazer funcionar programas nacionais e cumprir as premissas da Constituição para depesas em saúde e educação.




