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Embargos infringentes não mudam percepção dos juristas sobre o STF

Operadores do direito receberam com naturalidade a decisão do Supremo de aceitar os embargos de infringência no caso do mensalão

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Apesar de ter sido um resultado que desagradou à sociedade brasileira, que de uma forma geral ficou com uma sensação de impunidade (qual jurista não teve de explicar no seu meio social que aceitar o recurso não é necessariamente sinônimo de absolvição?), a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela aceitação dos embargos infringentes no julgamento do mensalão não modificou a imagem da mais alta corte do país diante dos operadores do direito. Os especialistas ouvidos pela reportagem consideram que não houve danos pelo resultado da semana passada à reputação da corte, pois quem conhece as leis sabe que o processo, para garantir a ampla defesa e o devido processo legal a todos os réus, costuma ser cheio de recursos.

Para o professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Egon Bockmann Moreira, a imagem do Supremo continua a mesma. Segundo ele, o STF é muito mais do que o processo do mensalão. "A imagem do Supremo pode sofrer um arranhãozinho de nada, mas ele é uma instituição que está muito acima de qualquer incidente que possa ter ocorrido nesse processo, que tem uma importância política momentânea. O Supremo é muito mais do que isso", afirma ele.

Além disso, juristas, pelo conhecimento técnico que possuem, obviamente não têm as mesmas expectativas e percepção da população em geral, como explica o professor da Direito GV de São Paulo, mestre e doutorando em filosofia do Direito, Rubens Glezer. Segundo ele, devido a isso, o resultado não foi um choque para quem é do meio. Outra razão apontada pelo professor é o fato de o STF estar sempre envolvido com questões polêmicas, a respeito da moralidade política, seja de um lado garantindo medidas já tomadas pelo Poder Legislativo, envolvidas em controvérsias, seja em algumas poucas vezes ele mesmo avançando na sua atuação diante da inércia do Legislativo. "O envolvimento do STF com temas de moralidade política e de fortes controvérsias é algo da rotina jurídica."

Na mesma toada, o professor da UFPR Luiz Edson Fachin afirma que a imagem do STF não foi arranhada. Segundo ele, a comunidade jurídica, está avaliando a decisão no seu sentido técnico e não no político. "Os juristas de modo geral entenderam que, na dúvida, o Supremo deveria julgar em favor da possibilidade dos embargos infringentes. Nessa dimensão, a imagem do Supremo não saiu arranhada na comunidade jurídica."

Ação reabre debate sobre foro privilegiado

A Ação Penal do mensalão é vista pelos especialistas como uma oportunidade para discutir a forma do foro privilegiado. E há mais de uma razão para isso. A primeira é o fato de não existir a possibilidade de duplo grau de jurisdição em ações originárias no STF, uma vez que o órgão é a instância máxima do Judiciário e a aceitação dos embargos infringentes garante apenas o reexame da matéria pelos 11 ministros que já participaram do julgamento. "A troca de dois ministros é irrelevante. O réu não é julgado por 11 pessoas, ele é julgado por 11 ministros", explica o professor da UFPR Egon Bockmann Moreira.

Outro ponto importante é o seguinte: quem tem essa prerrogativa acaba tendo o privilégio de ser julgado, a priori, pelas pessoas que teriam o maior conhecimento jurídico do país, afinal fazem parte da suprema corte. O professor emérito da Universidade Mackenzie Ives Gandra Martins explica que o foro privilegiado existe para garantir que pessoas que ocupem cargos do alto escalão, como o presidente da República, não sejam julgadas por alguém que possa ter interesse em subir na carreira. "Pelo fato de [O juiz de 1º ou de 2º grau] ainda ter outras ambições que o ministro do Supremo não tem, o nosso constituinte entendeu que há cargos no topo que só podem ser julgados por um tribunal com imparcialidade absoluta."

Apesar de não haver esse julgamento por uma corte diferente da originária, o professor da UFPR Luiz Edson Fachin ressalta que não há que se falar em cerceamento de defesa. "Não podemos esquecer que esse julgamento feito pela suprema corte é diferente de um julgamento de primeiro grau, que admite recursos para instâncias superiores. A prerrogativa de foro é um bônus que também tem um ônus [a falta do duplo grau de jurisdição]." Além disso, seria importante que o número de cargos que têm direito a esse foro fosse reduzido, defende Fachin.

Uma forma de resolver isso, sugere Egon, seria fazer com que a ação fosse julgada por uma turma do STF ou pelo Superior Tribunal de Justiça. Assim caberia recurso ao pleno do STF, o que resolveria o problema da falta de duplo grau.

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