
Reflexões sobre a filosofia do direito, o direito constitucional, a filosofia moral e a filosofia política fizeram de Ronald Dworkin um intelectual reconhecido por sua obra e segundo aqueles que tiveram contato mais próximo com ele admirado por seu carisma. O filósofo esteve atento às principais questões da sociedade atual e está entre os autores mais citados do direito contemporâneo. Abatido por uma leucemia, Dworkin faleceu no dia 14 de fevereiro deste ano. As homenagens ao autor no meio jurídico trouxeram à tona, também, ponderações e debates sobre sua obra e a contribuição que ele fez para a compreensão da relevância dos princípios para o direito.
A obra de Dowrkin traz a ideia de que os princípios têm peso de norma vinculante. Assim, o que ele chamava de "casos difíceis", que não têm resposta explícita na legislação, nem na prática jurídica, podem ser resolvidos por meio de princípios. Como liberal que era, o autor abordava principalmente os princípios relacionados aos direitos fundamentais e individuais a partir de uma dimensão moral e política. A igualdade é um dos princípios considerados mais relevantes em sua teoria e que também balizava muitos de seus posicionamentos com relação a questões sociais.
O advogado constitucionalista Luiz Roberto Barroso conta que Dworkin foi o autor que mais o influenciou tanto na prática profissional, quanto na vida acadêmica. Ele destaca no trabalho do filósofo do direito a superação do positivismo jurídico, para o qual só há direito onde há norma legislada. "A visão dele, pós-positivista, é de que existe direito fora da norma. Inclusive o direito que decorre dos valores morais. E os valores morais ingressam no direito pela porta dos princípios", explica Barroso.
A dimensão moral que Dworkin dá aos princípios, segundo a professora de direito constitucional da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Vera Karam, faz com que se traga para o âmbito do direito "compromissos que são irredutíveis, mas não são abstratos e sim conquistados historicamente". A professora ressalta que, quando se fala em leitura moral, não se trata de algo jusnaturalista ou moralista, mas sim no tipo de norma que resulta de um acordo que a comunidade faz em torno daquilo que considera absoluto, como a liberdade e a igualdade.
Para o juiz federal Eduardo Appio, a grande contribuição de Dworkin é que ele reforça a ideia de que existe um direito de verdade e nega o entendimento de que há apenas o operador que interpreta ou até mesmo inventa o direito. Dessa maneira, os princípios têm de ser aplicados em vez de se criar uma mera convenção. Appio considera que, no Brasil, grande parte das teorias do filósofo norte-americano foram distorcidas ao serem equiparadas às ideias do filósofo alemão Robert Alexy de que tudo é uma relativização de princípios. O juiz explica que Dworkin defendia que havia um princípio maior, a chamada "resposta correta" e que esta sim deveria ser base para a decisão.
Um homem do mundo
Dworkin conquistava as pessoas não apenas por suas ideias filosóficas, mas por sua delicadeza e educação. Foi por meio de aulas ministradas pelo norte-americano, em seminários de que participou nos EUA, que a professora da UFPR Vera Karam teve a oportunidade de conhecer um pouco mais de perto aquele que define como "um dos mais importantes juristas do século 20", a quem ela chamou também de um "gentleman", que a recebeu com muita generosidade em suas aulas. Ela lembra que ele foi um defensor dos direitos civis nos Estados Unidos e que era fonte recorrente nos jornais para opinar sobre questões da política ou da sociedade norte-americana.
Depois de ser anfitrião de Dworkin durante um evento no Rio de Janeiro, o advogado Luiz Roberto Barroso foi recebido pelo filósofo em suas casas de Londres e de Nova York. Segundo o brasileiro, o reconhecido autor não era um intelectual fechado em seus estudos, mas "um homem do mundo", que apreciava artes boa comida e boa bebida. Barroso presenteou Dworkin com um livro de Fernando Pessoa traduzido para o inglês e o filósofo retornou dizendo que gostara muito da obra.





