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Para  alguns especialistas, consumidores poderiam  pedir indenização por ter entrada proibida por usar chinelos. - Imagem ilustrativa | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Para alguns especialistas, consumidores poderiam pedir indenização por ter entrada proibida por usar chinelos. - Imagem ilustrativa| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Um desentendimento na entrada de um restaurante de Curitiba acabou gerando um misto de indignação e bom humor nas redes sociais. A cliente queria entrar usando uma sandália do tipo rasteirinha, e o segurança a impediu dizendo que não era permitido entrar com chinelo de dedos no local. O bate-boca indignou a consumidora que acabou indo desabafar na internet. Ela argumentou que não estava usando chinelo e que mesmo que fosse, seria um absurdo ser impedida de entrar por isso. Mas, independentemente do tipo de calçado no caso em questão, um estabelecimento pode colocar regras que impeçam alguém de entrar por causa da roupa? E a pessoa que for impedida tem direito a receber indenização?

Especialistas em direito civil e direito do consumidor e um representante do setor de gastronomia entrevistados pelo Justiça & Direito dividem opiniões. Confira alguns dos argumentos jurídicos.

Discriminação

O presidente da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), Antônio Carlos Efing, explica que um estabelecimento pode indicar normas sobre vestuário como forma de orientar os clientes. “Pessoas não se sentiriam bem se não estivessem no traje”, observa Efing. O problema, para ele, é quando se proíbe a entrada com determinado vestuário.

“[ Esse tipo de restrição]dá a entender que existe uma orientação [aos funcionários] para restringir a entrada de alguns tipos de pessoa. Isso significa discriminação”, avalia o presidente da Comissão de Direito do Consumidor. Ele cita o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor que veda aos fornecedores de produtos ou serviços “recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento”.

Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Sergio Staut, a conduta de restringir a entrada em um local por causa do calçado é discriminatória e “exagerada”. “Se a pessoa estivesse sem trajes, com uma fantasia ou roupa que ofenda o local, aí sim caberia a restrição”, explica.

Sem analisar o caso concreto, mas falando em tese, ele considera que esse tipo de circunstância pode envolver uma série de condutas que podem resultar em ofensa aos direitos de personalidade, conforme o Código Civil, e à dignidade, previsto na Constituição Federal. Tais ofensas gerariam necessidade a ressarcimento por dano moral.

Aviso na porta

Ao falar em tese sobre esse tipo de situação em que a entrada é proibida de acordo com o traje do cliente, Luciana Pedroso Xavier, doutora Direito das Relações Sociais da UFPR e professora de Direito do Consumidor do Unicuritiba, avalia que, se o consumidor for informado sobre as exigências, não há abuso.

“Em teoria, é possível que bares e restaurantes estabeleçam um código de vestimenta (ou dress code). Para tanto, é importante que o deixem claro na entrada do estabelecimento, sites e mídias sociais para que o consumidor possa ser informado. Trata-se de aplicação prática do direito à informação previsto no art. 6º, III do CDC”, analisa a professora. De acordo com a interpretação dela, “a ausência de informação pode configurar prática abusiva de recusar demanda do consumidor sem justa causa, nos termos do art. 39, II do CDC”.

O presidente do Sindicato das Empresas de Gastronomia, Entretenimento e Similares de Curitiba (Sindiabrabar), Fábio Aguayo, argumenta que “os estabelecimentos têm regras claras fixadas na entrada para evitar constrangimento e qualquer situação”.

“Não tem discriminação social ou sexual. O local [onde ocorreu a polêmica] não era bar, é um l ounge, uma casa noturna. Se não quer ir de acordo com as normas, tem outros restaurantes para escolher”, diz o presidente do Sindiabrabar.

Mas, para o professor Staut, mesmo que o estabelecimento imponha regras, dever ser levada em consideração a lei: “Regras [internas] não têm prevalência sobre a legislação vigente”, diz o professor.

Tratamento dos funcionários

Assim como clientes podem requerer indenização por ofensas à personalidade, funcionários dos locais também podem caso sejam ofendidos pelos consumidores. No caso divulgado no Facebook, por exemplo, a consumidora afirmou que, após se sentir tratada com deboche pelo atendente, lhe disse palavras de baixo calão, e ele respondeu com os mesmos termos.

Aguayo observa que é comum clientes tratarem mal funcionários “que só estão cumprindo ordens”. Ele afirma que o SindiAbrabar já acompanha casos de discriminação racial e sexual contra trabalhadores do setor e que, a partir do caso que está repercutindo nas redes sociais, também deve ii mais a fundo em situações de discriminação social ou assédio moral. “O cliente tem sempre a razão, mas não tem razão em humilhar funcionário”.

Conheça a lei

Constituição Federal

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III - a dignidade da pessoa humana;

Código de Defesa do Consumidor

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

[...]

IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais

Código Civil

Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

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