
Enviado pelo governo federal ao Congresso há dez dias, o projeto que cria o Marco Civil da Internet é elogiado por especialistas e tem grandes chances de ser aprovado ainda neste ano. A proposta estabelece princípios, direitos e deveres no ambiente virtual. Determina ainda regras sobre o armazenamento dos registros de conexão dos usuários e a responsabilidade por conteúdos publicados na rede.
Antes de ser formalmente elaborado pelo Ministério da Justiça, o projeto passou por consultas públicas e debates realizados na própria internet entre 2009 e 2010, período durante o qual recebeu mais de duas mil contribuições.
Análise
Um dos principais pontos da proposta determina prazo de um ano para que os provedores armazenem os registros sigilosos de conexão dos usuários atualmente, não há nenhuma regra que defina isso. Para Demi Getschko, diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação, do Comitê Gestor da Internet no Brasil, a guarda desses dados não oferece perigo aos usuários, pois não envolvem informações de caráter privado. "São dados muito curtos IP e hora do acesso , cujo armazenamento não é oneroso. Um ano é um prazo razoável para que a Justiça examine cada caso, até porque o processo judicial geralmente demora", afirma.
Outro ponto bastante elogiado do projeto é a neutralidade da rede, ou seja, a previsão de tratamento isonômico a todos os pacotes de dados. Isso significa que os provedores de acesso não poderão de forma alguma privilegiar determinados sites da internet, por exemplo, fornecendo a eles uma banda mais rápida que a de outras páginas.
Na avaliação do professor de Direito da Informática Thiago Tavares, diretor-presidente da ONG SaferNet, interferir indevidamente na "plenitude da conexão" viola o direito do consumidor. "Hoje há operadoras de telefonia tornando mais lentas, de propósito, as conexões de Skype ou Voip [sistema de telefone pela internet]. Não cabe ao provedor estabelecer rotas mais rápidas ou mais lentas", diz ele.
Já Eduardo Neger, presidente da Associação Brasileira de Internet, destaca que a neutralidade sempre garantiu que novas empresas surgissem na rede, mesmo sem ter por trás a infraestrutura das grandes empresas de telecomunicações. "Esse é um ambiente fértil para o empreendedorismo, que permite o desenvolvimento de uma boa ideia sem grandes investimentos", explica. Ele só faz uma ressalva ao trecho do projeto que abre exceções à neutralidade para "requisitos técnicos necessários (...), conforme regulamentação". "Isso é um cheque em branco deixado pela lei, que precisa ser retirado."
Os especialistas ressaltam ainda a importância da isenção de responsabilidade a provedores por conteúdos publicados na internet por terceiros caso de sites como o Facebook e YouTube. "É importante que, ao mesmo tempo em que responsabilize o sujeito que causou dano, a lei isente o resto da estrutura. A internet não é a culpada do que acontece, mas sim quem coloca as coisas na rede", afirma Demi Getschko.
Mas Thiago Tavares alerta: "É válido e superimportante preservar a liberdade de expressão e atribuir apenas à Justiça o poder de determinar que um conteúdo seja removido. Mas, se o provedor não tiver uma política de responsabilidade e não se preocupar com o usuário que eventualmente seja vítima de um crime, isso pode acabar sobrecarregando o Judiciário".



