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Lista do PCdoB com nomes de supostos torturadores

A lista do PCdoB tem 233 nomes de pessoas que teriam praticado tortura durante o regime militar.

Veja a lista na íntegra.

Integrantes do PCdoB vazaram nomes em 1975

A lista doada pela viúva de Luis Carlos Prestes ao Arquivo Na­­­­cional foi organizada por 35 integrantes do PCdoB em 1975. Presos, eles vazavam os nomes para fora das cadeias e delegacias. Em 1978, o documento chegou a ser publicado em um jornal semanal da esquerda, o Em Tempo. Agora, os documentos estão disponíveis para o público.

De acordo com Narciso Pires, do grupo Tortura Nunca Mais Paraná, a lista de torturadores foi construída num momento em que o presidente Ernesto Geisel começava o longo processo de transição para a democracia – mas em um período em que muitos militares da "linha dura" queriam aumentar o terror contra a esquerda, para dizer que ainda havia o perigo do comunismo e para justificar a ditadura.

"Em 1975, ainda tivemos grandes operações de prisão por motivos políticos, como a Ope­­­ração Bangui e a Operação Bar­­­riga Verde. E a tortura nas instituições do Estado ainda era muito comum", conta ele, que foi presidente do Comitê Bra­­­sileiro pela Anistia e que também foi preso e torturado.

Censura

O coronel Geraldo Cavagnari, que na época fazia parte do Estado-Maior das Forças Arma­­­das, diz que lembra da divulgação da lista e, principalmente, dos esforços para que ela não fosse publicada em veículos de maior circulação. "Na época a repercussão teria sido mais forte. Só não existiu porque não deixaram publicar", conta.

Segundo Vivi Fernandes, edi­­­tora da Revista de História, da Biblioteca Nacional, a decisão de publicar a lista na íntegra no site teve como base o fato de os papéis já estarem sendo encaminhados ao Arquivo Nacional, e portanto se tornarem públicos. "A reclamação de que a publicação partiu de um órgão do governo não procede. A revista é mantida por uma sociedade de amigos da biblioteca", diz.

A lista da dor

A lista do PCdoB tem 233 nomes de pessoas que teriam praticado tortura durante o regime militar. Os primeiros 60, segundo os denunciantes, são aqueles de que se sabia o nome e função completos e que participaram diretamente das sessões em que eles foram vítimas. Do 61 ao 151 estão os nomes de quem os torturados tinham menos informações, mas que também teriam participação direta na tortura dos denunciantes. Do 152 em diante, são nomes de pessoas que trabalhavam nas instituições e que não participaram diretamente da tortura dos denunciantes. A maior parte é do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) e do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops-SP).

A divulgação de uma lista com nomes de 233 supostos torturadores que teriam agido durante a ditadura militar brasileira (1964-1985) causou algum barulho nos últimos dias de 2011. Alguns militares da re­­­­serva estrilaram. Membros de organizações de direitos hu­­­­manos se pronunciaram. Mas não houve maiores repercussões. Isso mesmo se tratando de uma lista elaborada pelos próprios torturados – 35 integrantes do antigo PCdoB fizeram a relação.

Os papéis faziam parte do acervo pessoal de Luís Carlos Prestes (1898-1990), principal líder socialista do país no século 20, e foram divulgados depois que sua viúva, Maria Prestes, decidiu doá-los ao Arquivo Nacional, em dezembro. A Revista de História, da Biblioteca Nacional, fez uma série de reportagens sobre o material em sua edição de janeiro e publicou os 233 nomes.

A reação dos militares se li­­­mi­­­tou à manifestação de alguns oficiais reformados. O general Clóvis Bandeira, vice-presidente do Clube Militar, criticou a postura da revista, por ser ligada a um órgão público, a Biblioteca Nacional. "Não deixa dúvida de que lado está o órgão público", disse. O presidente da Asso­­­ciação dos Oficiais Militares Estaduais do Brasil, coronel Abel­­­­mídio Sá Ribas, disse que a situação criava "um conflito gratuito". Mas foi só.

Especialistas afirmam que a ausência de maiores confrontos entre os militares (incluindo os acusados de tortura) e representantes da esquerda ou de movimentos de direitos humanos mostra que, com o passar do tempo, os ânimos em torno do regime militar arrefeceram. Em parte porque a Lei da Anistia acabou com a possibilidade de punição a quem cometeu crimes políticos. Em parte porque muito tempo já se passou desde o auge da ditadura, e as novas gerações não estariam preocupadas com o tema.

Comodismo

A discordância, porém, é sobre o que isso significa para o país. Há quem acredite que esquecer os crimes do regime militar seja o melhor para o Brasil. Há quem pense, por outro lado, que isso faz parte de um processo de acomodação que não tem apenas aspectos positivos.

O coronel da reserva Geraldo Cavagnari, do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp, por exemplo, diz que não é prudente arriscar a estabilidade já obtida. "É muito cedo para falar nisso. Essa lista não trouxe grandes novidades. Mas quando você começa a mexer na superfície, sempre pode encontrar algo em uma camada inferior. E nem sempre isso é bom", diz.

Por outro lado, lembra o cientista político Adriano Codato, da Universidade Federal do Paraná, a tranquilidade do país com a divulgação de uma lista de torturadores mostra que o Brasil reage com intensidade bem menor a crimes políticos do que ocorre na vizinha Argentina, por exemplo. "Lá existe o que eles chamam de ‘escracho’. Se alguém cometeu crimes políticos, a po­­pulação marca em cima, atormenta a pessoa para deixar claro o repúdio", diz.

Octaciano Nogueira, cientista político da Universidade de Brasília, concorda que falta ao brasileiro a passionalidade sobre o tema. "O tempo ameniza a animosidade em torno desses fatos", diz. Isso faz crer que outras revelações que vem à tona em relação à ditadura, com o início dos trabalhos da Comissão da Ver­­­dade, por exemplo, não deverão ameaçar a tranquilidade do país. "Cada vez os grupos envolvidos nessa discussão são mais restritos", afirma.

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