
Tranquilo, sempre bem-humorado e às vezes surpreendente, o prefeito interino Padre Roque Neto (PTB) completa uma semana de governo com a calma de um veterano da política que está longe de ser. Diante da imensidão de assuntos que passam pela prefeitura de Londrina da simples pintura de meio-fio às milionárias licitações Padre Roque não se deixa perder, ainda que tenha se preparado para ser apenas mais um vereador entre outros 19. Imerso na complexidade do trabalho que só começou no comando interino do Poder Executivo, Padre Roque enfrenta uma fila diária de populares que de tudo pedem inclusive cargos de confiança e postos de emprego. Sobre a mesa do gabinete na prefeitura, uma pequena pilha de currículos se acumula ao que diz responder com educados e justificados "nãos". Entre uma audiência e outra, concedeu a entrevista a seguir, quando fez um balanço da sua primeira semana completa de governo.
Que avaliação o prefeito faz deste início de governo?
Despachei com vários segmentos da sociedade e ainda recebo pessoas que muitas vezes querem apenas me conhecer. É bom receber o apoio do povo: vi a alegria da população em ter alguém em quem confiar. Não sou da classe política, nem tenho formação nisso e via o povo desanimado. Fiquei um pouco apreensivo na época em que alguns eleitores de Belinati foram à Câmara protestar contra a cassação do registro, quando acabaram quebrando a porta do prédio. Fiquei pensando se o mesmo poderia acontecer na prefeitura se iriam fazer alguma coisa em relação a mim também. Mas não fui eu quem gerou esse processo. Encontro as pessoas nos bairros e elas me dizem "vai em frente", ou "tomara que você fique quatro anos". Sei que tenho que fazer a diferença.
Quantos comissionados o senhor já nomeou?
Perto de mim, seis. Os mesmos que nomearia na Câmara ocuparam os cargos no gabinete na prefeitura. Fazem agenda, atendem a população, respondem ao que for mais urgente. São os mesmos de sempre.
Como recebeu a decisão da Justiça de Londrina de, após revogar o decreto que permitiu o aumento da tarifa dos coletivos de R$ 2 para R$ 2,25, que ela seja fixada em R$ 2,15?
Hoje tenho um carro, mas andei muito de ônibus e logo penso na limitação do povo. Se a cada dia as famílias empobrecem, claro que dá decepção. Espero que a Justiça julgue com sabedoria, de forma plausível e se apresente de fato como é o cálculo da tarifa. É um direito do povo saber. Há muitas coisas na sociedade que não são informadas: os governos apenas dizem "aceitem e pronto". O povo sai de casa cedo toda manhã, em ônibus cheios para ir trabalhar. Somos nós quem pagamos! E se toda a sociedade se mobilizar, é o indicativo de que está chegando a hora de parar de achar que o povo é medíocre, não pensa e engole tudo com facilidade.
O senhor é muito assediado por pedidos de emprego?
De fato recebo pedidos diários, mas não tenho esse perfil. Claro que os mais chegados, que convivem comigo, são mais escutados. Mas deixo claro que se não tem formação, não estudou e nunca se preparou, nada posso oferecer. É preciso preparo para um cargo em comissão. Já tive que dizer muitos "nãos" mas antes converso e explico o porquê nada pode ser feito de forma abrupta. Posso garantir que não tenho favoritismo nem para os meus amigos. Pego o currículo e o máximo que posso fazer muitas vezes é encaminhar a pessoa para o Sine (Sistema Nacional de Emprego).
O senhor teve de comprar roupas novas para se apresentar como prefeito?
Tive. No guarda-roupa tinha ternos mas já estavam um pouco apertados porque a barriga cresceu. Comecei a usar gravata por opção própria, pois agora estou no Executivo. Afinal, sou o representante da cidade.
Qual é o real papel do deputado Alex Canziani (PTB) no governo Padre Roque?
Ele está alegre pelo fato de alguém do partido entrar no governo. Fui eleito para ser vereador e as coisas mudaram. No fundo do túnel tinha uma luz. Nós agarramos. Claro que ele tem o desejo de acertar, de fazer. O Alex tem sido um bom professor, mas não fica me importunando, ligando, me determinando isso ou aquilo. Tenho carta branca. Pela capacidade dele como deputado federal e político experiente, quer o melhor. Certamente que há uma projeção dele sobre mim, mas não respondo como uma vaquinha de presépio nem marionete. Não há nada que ele me imponha. Tenho liberdade, graças a Deus. Londrina merece todos os recursos que podermos trazer e o Alex abre muitas portas no governo federal, principalmente para projetos em Londrina.
E em relação à coalizão dos partidos que o elegeu (PTB-PMDB-PT-PSDB-PSB), qual a autonomia do senhor diante do grupo?
Até mesmo os que não estão juntos vieram conversar e querem me encontrar. Como vereador, pensei que não queria ser oposição porque, se o prefeito tiver boas intenções, apoio, mesmo que não goste dele. Política se faz com racionalidade, não só com emoção e coração. Claro que os deputados e vereadores têm as suas promessas e necessidades vindas da campanha, mas eu não tenho nenhum grupo por trás de mim. Estou completamente livre.
A coalizão deve se repetir na eleição. O senhor será mesmo neutro?
Já falei para todos eles que não tenho compromisso nem com (Luiz Carlos) Hauly nem com Barbosa Neto. Fico neutro com certeza.
O senhor vai ser candidato a deputado em 2010?
O importante agora é fazer esta administração e deixar uma marca. A partir da resposta às ações na prefeitura, o partido e o povo é quem vão definir se fui aceito. Aí, claro, posso sair como deputado e até prefeito. Estou à disposição.
O deputado Antonio Belinati (PP) tem repetido que a coalizão loteou cargos e os partidos fizeram um "banquete dos derrotados". Como o senhor recebe os ataques?
Já conheço o Belinati há anos. Pessoalmente, nada contra. O que percebo é que o homem Antonio Casemiro Belinati tem um coração generoso, capaz de tirar a camisa para doar a outros. Mas, assim como tem qualidades, também tem defeitos. E como político tem falhas e pecados. Se eu estivesse na pele dele, como alguém que ganhou a eleição e não levou, também teceria comentários para o adversário. Como bom político que é, Belinati deveria perceber que a cidade está nas mãos de alguém em quem pode confiar. É o jogo da política. Como não fui eleito como ele, com mais de 138 mil votos tive pouco mais de 2.700 votos tem toda a razão em criticar. Da minha parte, aprendo a absorver. Acredito também que ele possa ser honesto e aprenda a dialogar comigo porque as portas estão abertas. O problema foi criado por ele, não é meu. Se ele ganhar a eleição de fato, voltará à prefeitura porque o povo o escolheu. Não fico irritado quando ouço as críticas dele. Nem de outros.



