
Há pelo menos uma dezena de livros e textos publicados na internet levando o título "A família em primeiro lugar", bordão que é praticamente uma unanimidade entre a população. No geral, não haveria nenhum problema em seguir a regra ao pé da letra, se, no Brasil, aqueles que assumissem um cargo público não decidissem beneficiar parentes graças ao poder que passam a ter em mãos.
Historicamente o poder público no país é visto como uma possibilidade de enriquecimento. Cientistas políticos e historiadores argumentam que esse tipo de mentalidade se perpetua devido a fatores como a fraqueza das instituições públicas e a impunidade.
Nos últimos tempos, têm se tornado cada vez mais comuns denúncias de parentes de políticos que enriqueceram abruptamente a partir do momento que o familiar entrou na vida pública (leia quadro). Da mesma forma, passou a ser quase praxe cargos públicos serem ocupados por parentes de governantes, mesmo com a aprovação da Súmula 13 do Supremo Tribunal Federal (STF), que, desde agosto de 2008, proíbe a contratação para cargos de confiança de parentes de até 3.º grau por agentes públicos somente a nomeação em cargos de secretário e ministro ficou de fora da proibição.
Instituições fracas
O historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos (SP), é taxativo ao afirmar que o Brasil não é um país politicamente sério. Segundo ele, o princípio básico de que, no serviço público, não deve haver qualquer forma de relação comercial que envolva parentes é ignorado sem nenhum constrangimento. "No Brasil, o poder é visto como um momento ou possibilidade de enriquecimento. Isso não ocorre em um país sério", critica, ressaltando que esse é um problema que atinge os três poderes. "Infelizmente, estamos mais para República das Bananas do que para termos instituições democráticas de fato consolidadas."
O professor de Ciência Política Ricardo Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), segue a mesma linha de pensamento e argumenta que a estrutura política brasileira permite a formação de redes de cumplicidade e troca de favores entre os poderes. Na visão dele, a falta de fiscalização é um dos principais causadores desses problemas. "Muitas vezes, quem deveria fiscalizar é quem mais se beneficia das irregularidades. Nos Tribunais de Contas, por exemplo, os conselheiros devem favores políticos ao Executivo e ao Legislativo, são quem os elegeram", critica. "Essa fragilidade institucional tende a se perpetuar por meio do nepotismo, que gera poder, influência e dinheiro. Quem tem isso nas mãos se reelege e se reproduz."
A impunidade também é destacada por eles como um dos vilões na luta contra o nepotismo legal e ilegal. Para Villa, as leis brasileiras são boas na teoria, mas não funcionam na prática. "A impunidade é o maior mal da democracia brasileira. O máximo que os escândalos geram é um pedido de demissão, eventualmente a anulação de um contrato, mas não mais que isso", ressalta.
Soluções
O historiador afirma ainda que a oposição tem um papel importante para evitar que o poder familiar continue prevalecendo na política nacional. "Quem estiver na oposição precisa associar atos de corrupção à falta de determinado serviço público. Quando um buraco na pista provocar quatro mortes num acidente, por exemplo, é preciso mostrar que isso está na conta do ministro dos Transportes e da presidente, que o nomeou", defende.
"Todos esses problemas não são para desestimular, mas para estimular o aprimoramento da democracia e o aperfeiçoamento das instituições", afirma Oliveira. "Precisamos tirar do papel princípios constitucionais da impessoalidade, transparência, probidade. Precisamos de um país real e não de um país legal, que só existe no papel e na cabeça dos juristas."
Interatividade
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