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“O Código Penal já teve uma alteração grande em 1984. Surgiram uma série de alterações ao longo do tempo. Se a gente ficar falando que a legislação é ultrapassada e velha vamos fazer um código novo a cada dez anos. Esse é que é o problema.” -Félix Fischer, novo presidente do STJ | Wenderson Araújo/ Gazeta do Povo
“O Código Penal já teve uma alteração grande em 1984. Surgiram uma série de alterações ao longo do tempo. Se a gente ficar falando que a legislação é ultrapassada e velha vamos fazer um código novo a cada dez anos. Esse é que é o problema.” -Félix Fischer, novo presidente do STJ| Foto: Wenderson Araújo/ Gazeta do Povo

Perfil

Veja quem é Félix Fischer, o novo presidente do STJ:

• Nasceu no dia no dia 30 de agosto de 1947 em Hamburgo (Alemanha). É naturalizado brasileiro.

• Bacharel em Ciências Econômicas pela UFRJ e em Direito pela UERJ.

• Fez carreira no Ministério Público do Paraná entre 1974 e 1996, quando foi nomeado ministro do STJ.

• Foi professor de Direito Penal da UEL, PUCPR e Faculdades Curitiba.

• É o atual vice-presidente do STJ e assume a presidência do tribunal no dia 31 de agosto.

Nascido na Ale­­­manha, naturalizado brasileiro e "paranaense de coração" (como se autodefine), o ministro Félix Fischer toma posse no próximo dia 31 como presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Fischer, que atuou por 23 anos no Ministério Público do Paraná e está no STJ desde 1988, também vai assumir o comando do Conselho de Justiça Federal. Ambos os mandatos têm duração de dois anos.

Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o ministro fala sobre as principais polêmicas do momento no Judiciário brasileiro. Disse que vai entrar na briga por aumento para juízes e defendeu o pagamento de adicional por tempo de serviço. Também faz críticas à divulgação individualizada dos salários dos magistrados: "A diferença entre divulgação para efeitos de transparência e invasão de privacidade é bem tênue. Por exemplo: se ele paga pensão, é desagradável [a divulgação integral]. Qual é o interesse geral sobre isso?", questiona Fischer. Na entrevista, ele diz ainda ser contra a reforma integral do Código Penal.

O sr. vai entrar na discussão sobre o aumento para juízes e funcionários do Judiciário federal?

Tanto quanto eu puder ser útil para essa reivindicação. Há muito tempo os vencimentos estão congelados. Na sistemática atual, há muita limitação entre um nível e outro de carreira. Não tem mais a questão do tempo de serviço. Então quem entra num concurso agora tem uma diferença mínima em relação a quem já está há muito tempo na carreira.

A Lei de Acesso à In­­formação mostrou disparidades enormes entre os salários de juízes e o teto constitucional. Há desembargadores no Rio de Janeiro, por exemplo, que apareceram com salários superiores a R$ 100 mil. Como resolver essa situação?

Parece-me que está havendo um pequeno equívoco na imprensa. Às vezes há certos [pagamentos] atrasados em alguns tribunais que os juízes estão recebendo ainda, que vêm na folha junto com o salário. Não é que ele ganha isso aí sempre. Há casos de divulgação errada inclusive de informações do STJ. No período de julho, os tribunais superiores entram em férias coletivas e aí os juízes têm direito a receber o terço de férias. Alguns pedem adiantamento do 13.º [salário] também. Neste mês eles recebem bastante, só que no mês seguinte eles ganham bem pouco. Mas esse engano é até justificado. Minha mulher é procuradora de Justiça aposentada e, quando ela viu essa notícia, virou para mim e perguntou: "Como esses caras estão ganhando muito mais do que você?". Aí eu expliquei para ela. É uma coisa que, digamos assim, não é de conhecimento comum. Não é nenhuma aberração porque está dentro da lei.

Como o sr. vê a polêmica gerada entre os juízes por causa da divulgação individualizada dos salários?

Há um problema. Divulgar o quanto ele ganha, com todos os descontos... A diferença entre divulgação para efeitos de transparência e invasão de privacidade é bem tênue. Por exemplo: se ele paga pensão, é desagradável [a divulgação integral]. Qual é o interesse geral sobre isso? Na minha opinião, o que poderia haver é a divulgação de quanto é que a categoria ganha por mês. Quanto esse salário é a mais, se não houver justificativa, aí tudo bem: faz-se um carnaval. Mas sem saber a origem desse dinheiro, sem verificar, sem ter informação, é perigoso.

Então o sr. acha que deveria haver novos critério de divulgação?

Para divulgar tem que ter critério. E a imprensa tem que ter cuidado. Eu não posso nem defender nem acusar quem está ganhando isso ou aquilo. Mas acho que, para divulgar se o salário é grande, tem que verificar se todo mês ele ganha aquilo – e o que é aquilo ali.

Não dá para deixar tudo claro no instrumento de divulgação?

É isso aí que tem dado muita confusão interna. Tem gente que acha que quando se divulga deveria se dar uma nota explicando [qual é o embasamento legal do vencimento].

O Congresso intensificou nos últimos meses a discussão sobre mudanças no Código Penal. O sr., como ministro do STJ e especialista em Direito Penal, acha que ele precisa mesmo ser totalmente modificado?

O Código Penal já teve uma alteração grande em 1984. Surgiram uma série de alterações ao longo do tempo. Se a gente ficar falando que a legislação é ultrapassada e velha vamos fazer um código novo a cada dez anos. Esse é que é o problema. Acho que poderia ser adaptado, mas já que resolveram fazer um novo... Sempre tem polêmica, cada um tem sua opinião. Eu acho problemático, pelo que vi na imprensa, acabar com o crime de desacato [à autoridade]. Eu não sou muito apegado a posições religiosas no caso do aborto, mas abrir demais é perigoso. Eles tomaram algumas medidas muito boas, mas em outras eu tenho uma posição um pouco divergente.

Então o sr. acha que não é necessário criar integralmente um novo Código Penal?

Eu achava que poderia dar uma modernizada. Não é um código ruim. Em outros países há códigos bem mais antigos. Um código inteiramente novo precisa de uma discussão bem mais ampla. Só sessão pública não resolve.

O que o sr. pretende implantar de novo em sua gestão como presidente do STJ?

Uma série de coisas. Vou tentar aperfeiçoar o que já existe e manter com magistrados e servidores um ambiente de motivação para atender aos anseios de quem recorre ao tribunal. E também trabalhar para modernizar sempre as instalações dos serviços internos, dentro do possível na previsão orçamentária.

Do ponto de vista dos tribunais superiores, o que é possível fazer para tornar a Justiça brasileira mais ágil? O excesso de recursos é um problema?

Existe uma distorção. Os tribunais superiores não deveriam existir como tribunais de apelação. Seria um demérito. A Justiça tem dois graus: primeira instância e segunda instância. Dali para cima, o que existe na verdade são tribunais superiores para padronizar entendimentos quando há divergências. Eles não estão ali para rever matéria de fato. Isso é pacífico na Constituição. O que aconteceu depois de 1988, mais por interpretação, é que abriram demais as portas dos tribunais e o volume de serviço tem aumentado em progressão geo­­métrica. Quando entrei no tribunal, meu gabinete era da metade do tamanho de hoje. Se não limitarem legalmente o acesso aos tribunais não tem como enfrentar esse problema – e isso não é deixar de prestar jurisdição, porque até segundo grau você tem todo tipo de recurso imaginável. É como enxugar gelo. E não é só uma questão de aumentar o tribunal para atender à demanda. Em pouco tempo precisaríamos ter um tribunal superior com mais de mil magistrados. Isso não existe em lugar nenhum.

Por essa lógica é normal um tribunal superior como o STF julgar um caso criminal como o mensalão?

O mensalão tem previsão constitucional para ser julgado pelo STF porque uma parcela dos réus tem foro privilegiado [três dos 38 acusados]. Só que tem muitos réus. Vai ser um problema para julgar tudo isso aí. Na prática, o que a gente tem feito aqui no STJ é desmembrar esse tipo de processo. O STF também tem feito isso, mas nesse caso não fez. É um processo complicado para julgar. Bem complicado.

Um tema sensível ao Paraná é a aprovação da PEC dos Tribunais, bandeira do meio jurídico no estado e que cria mais cinco Tribunais Regionais Federais no país, um deles em Curitiba. O sr. é a favor?

Eu acho que é muito importante a criação desses novos tribunais. Mas tem de ser feito com cuidado para não gerar um efeito dominó e daqui a pouco tem um tribunal regional por estado. O que me parece mais adiantado é o de Minas Gerais.

Agora também há uma outra PEC do senador Sérgio Souza (PMDB-PR) para a criação de um TRF apenas no Paraná. É boa ideia? Só no Paraná? Isso aí é mais difícil passar. A pessoa pode desejar, mas é mais difícil.

Há uma polêmica sobre a PEC dos Tribunais porque há estados que não gostariam de perder força, como seria o caso do Rio Grande do Sul. Inclusive o atual presidente do STJ, Ari Pargendler, é gaúcho.

O Rio Grande do Sul quer manter a situação em que está. Entre ampliar o tribunal de lá e criar um novo, é melhor criar um novo. Mas precisa ser feito com muito cuidado para não virar a reivindicação de um estado só.

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