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Lula na África: países do continente são foco de interesse de empreiteiras que financiaram viagens do ex-presidente | Ricardo Stuckert/Presidência
Lula na África: países do continente são foco de interesse de empreiteiras que financiaram viagens do ex-presidente| Foto: Ricardo Stuckert/Presidência

Foco de problemas

Confira alguns escândalos recentes da política brasileira envolvendo empreiteiras:

Grupo OK

Em 2000, um escândalo de desvio de verbas colocou fim à carreira política de Luís Estevão (PMDB-DF). Na época, foi revelado que o grupo OK, de propriedade do então senador, esteva por trás de um esquema de corrupção que envolveu desvios de R$ 170 milhões na construção do prédio novo do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo.

Lobista

O atual presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB- AL), foi acusado em 2007 de manter relações pouco republicanas com a construtora Mendes Júnior. Um lobista ligado à empreiteira pagaria despesas mensais de Renan, entre elas a pensão de uma filha do senador fora do casamento. Desdobramentos do caso fizeram Renan deixar a presidência do Senado, na época, e resultaram em um processo no STF no qual o senador é réu atualmente.

Gautama

Também em 2007, uma operação da Polícia Federal desmantelou um esquema de pagamento de propina para servidores públicos. Segundo as investigações, empresários ligados à construtora Gautama pagavam propina para que licitações de obras fossem fraudadas. A operação Navalha na Carne chegou a prender 46 pessoas ligadas ao esquema.

Metrô

Em 2010, o jornal Folha de S.Paulo antecipou as empresas vencedoras de uma licitação para obras de ampliação na Linha Lilás do Metrô em São Paulo. No ano passado, a Justiça aceitou a denúncia oferecida contra 14 executivos de ao menos 12 construtoras acusados de fraude.

Delta

Uma das construtoras que mais recebeu recursos do PAC, a empreiteira Delta ficou sob suspeita depois das revelações da Operação Monte Carlo, no ano passado. A investigação, inicialmente destinada a mostrar as conexões do bicheiro Carlinhos Cachoeira com a classe política, chegou até a Delta. Com o escândalo, a empresa acabou perdendo contratos e sendo vendida.

A oposição acusou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de misturar interesses "nacionais com empresariais" ao viajar para o exterior bancado por empreiteiras que têm interesses nos locais de suas viagens. Reportagem de ontem do jornal Folha de S.Paulo mostrou que quase metade das viagens internacionais feitas pelo ex-presidente Lula após deixar o governo foi bancada por essas empresas. De acordo com documentos obtidos pela publicação, o foco são países da América Latina e da África, regiões que foram prioridades da política externa do petista em seus dois mandatos.

Apesar de congressistas da oposição admitirem que o pagamento das viagens não é ilegal, eles dizem que Lula deveria agir "às claras" em relação aos seus patrocinadores. "Se ele quer fazer lobby, que faça às claras, que receba honorários para isso. Feito por baixo dos panos é indecoroso. O problema é confundir o interesse de uma empresa com os interesses do país", disse o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP).

Na noite de ontem, o presidente do PSDB, deputado Sérgio Gerra (PE), divulgou nota pedindo explicações sobre o comportamento do ex-presidente. "Para que não pairem dúvidas sobre o tipo de interesses que estariam levando empreiteiras a custear essas viagens internacionais, o ex-presidente Lula deve vir a público esclarecer os motivos que o levaram a aceitar essa oferta tão generosa", afirmou o tucano, em nota. "O Brasil aguarda que o ex-presidente Lula revele qual a remuneração que recebeu para fazer lobby em favor de empreiteiras brasileiras, conforme atestam documentos oficiais emitidos pelo Itamaraty", completou.

Líder do PPS na Câmara, o deputado Rubens Bueno (PR) disse que Lula manteve "relações incestuosas" com as empreiteiras no governo e que trabalha agora para beneficiar o PT, defendendo os interesses de financiadores de campanha. "O Lula está agindo nessas viagens não como defensor dos interesses da nação, mas como mercador do PT e de seus financiadores de campanha", disse o deputado.

"Interesses da nação"

A assessoria do ex-presidente diz que Lula trabalha para promover "interesses da nação" e não das empresas que bancam suas atividades. Mas políticos e empresários familiarizados com as andanças de Lula afirmam que o ex-presidente ajudou a alavancar interesses de gigantes como Camargo Corrêa, OAS e Odebrecht.

Um telegrama diplomático de novembro do ano passado, enviado ao Itamaraty pela embaixada do Brasil em Moçambique após uma visita de Lula, diz que ele ajudou empresas brasileiras a vencer resistências locais ao "associar seu prestígio" a elas.

Desde 2011, Lula visitou 30 países, dos quais 20 ficam na África e América Latina. As empreiteiras pagaram 13 dessas viagens. Na última terça-feira, Lula iniciou novo giro africano, começando pela Nigéria, e patrocinado por Odebrecht, OAS e Camargo Corrêa.

AnáliseConstrutoras e classe política mantêm relação de proximidade

Guilherme Voitch

Empreiteiras e a classe política brasileira mantêm um relacionamento próximo e intenso, fruto do sistema de financiamento de campanha praticado no Brasil. O custeio das viagens do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por construtoras é um reflexo dessa proximidade, dizem especialistas.

Ricardo Oliveira, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e cientista político, diz que todos os partidos competitivos brasileiros gravitam sob a área de influência das empreiteiras. "Além desse caso do ex-presidente Lula, tivemos um exemplo que para mim é ainda mais significativo, que é o do deputado André Vargas (PT-PR) homenagear o empreiteiro Cecílio do Rego Almeida [fundador da C.R Almeida] com um nome de estrada", diz Oliveira.

Ele lembra ainda da ex-senadora Marina Silva, que, ao definir as regras de funcionamento do seu novo partido, afirmou que não aceitaria doações de empresas da indústria da bebida e do cigarro, mas não negou eventuais doações de construtoras.

Doutor em Ciências Sociais pela Unicamp e professor da UFPR, Fabrício Tomio tem visão semelhante. "Como ele [Lula] não ocupa cargo público, não temos uma ilegalidade, mas é óbvio que há interesse das construtoras. Elas têm interesse na figura do presidente", diz Tomio, que cita o exemplo do ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair. "Ele foi adotado quase como um RP de diversas empresas".

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