
Após pautar o debate eleitoral paranaense, o desgaste entre os governos estadual e federal vai exigir uma discussão de relacionamento da presidente Dilma Rousseff (PT) e do governador Beto Richa (PSDB). Um dos principais temas da campanha do tucano foi a suposta perseguição promovida pela gestão petista ao Paraná, pela demora na aprovação de empréstimos que totalizavam R$ 1,9 bilhão e pelos baixos investimentos federais na comparação com outras unidades da federação. O discurso da discriminação emplacou e ajudou a consolidar a vitória expressiva de Aécio Neves (PSDB) no estado, com 60,98% dos votos válidos contra 39,09% da adversária petista.
Um dia após o resultado do segundo turno, Richa convocou uma entrevista coletiva no Palácio Iguaçu em que falou sobre o futuro da relação com a presidente reeleita. O tucano não voltou atrás nos temas que abraçou na campanha, mas acenou com o desejo de diálogo. Ele afirmou que o governo federal dedicou ao Paraná "um tratamento indigno para a um estado que tanto contribui para a formação da economia nacional".
Durante o período de propaganda eleitoral, o PSDB paranaense veiculou um vídeo em que criticava os repasses feitos pela União ao Paraná. O material citava que a cada R$ 42,60 pagos em tributos federais pelos paranaenses, somente R$ 1,00 retornava ao estado e que a eleição era a hora de "dar o troco" ao PT.
Embora não citasse a fonte, os números eram os mesmos apurados anteriormente em um reportagem publicada pela Gazeta do Povo. A propaganda tucana não explicava as contas. Já o cálculo da matéria era apenas sobre investimentos federais (não contava transferências obrigatórias, que são o grosso dos repasses) e incluía uma média de mais de uma década. Ao final, o levantamento mostrava que os investimentos federais foram ainda mais baixos em 2002, último ano da gestão Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Abertura
Durante o discurso da vitória, Dilma falou em "unir o país". A citação foi entendida por Richa como a abertura para um nova fase de entendimento. "Eu acredito que, passada a eleição, todos devem descer do palanque. O momento de embate de ideias é durante o período eleitoral", afirmou.
Ex-ministra da Casa Civil e acusada de ser peça-chave do "boicote" ao Paraná, a senadora Gleisi Hoffmann (PT) afirma que a declaração de Richa é um "bom sinal". "Fico feliz com esse novo posicionamento do governador. O que eu puder fazer para ajudar, vou fazer. E tenho certeza que, da parte da presidenta, será a mesma disposição."
Coordenador da bancada federal do Paraná, o deputado Assis do Couto (PT) diz que vai procurar o governador nos próximos dias para articular um realinhamento. "Quem perdeu com essa relação foi o Paraná. Não é mais questão de achar culpado. Cabe a todos nós nos esforçarmos para melhorar", acenou o petista.
Vice-líder do governo federal na Câmara e aliado de Richa no Paraná, o deputado Alex Canziani (PTB) diz que agora há mais espaço para a construção de uma nova relação até porque Dilma e Richa não poderão disputar a reeleição em 2018. "Só o fato de haver essas rusgas mostra que havia algo de errado. É algo que se resolve com a união de todos", diz Canziani.
Richa negocia empréstimo de US$ 150 milhões
Principal ponto de atrito entre os governos estadual e federal, os empréstimos negociados pela gestão Beto Richa continuarão em cena pelos próximos meses. Na segunda-feira, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) começou a análise de um financiamento de US$ 150 milhões (R$ 360 milhões) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) ao estado. Os recursos serão aplicados em obras de desenvolvimento urbano, de acordo com o secretário do Escritório de Representação do Paraná em Brasília, Amauri Escudero.
Outras duas negociações, mais antigas, também estão sendo avaliadas pela STN. O Paraná tenta um empréstimo de US$ 557 milhões (R$ 1,337 bilhão) do Credit Suisse para quitar uma dívida adquirida com a Copel no início dos anos 1990. E outros R$ 427 milhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para quitar uma dívida do extinto Banco de Desenvolvimento do Estado do Paraná (Badep).
Entre 2013 e 2014, o tucano conseguiu o aval para cinco financiamentos que somam R$ 2 bilhões. Três deles foram negociados com o BID, um com o Banco Mundial e o mais polêmico, de R$ 817 milhões, com o Banco do Brasil. Esse empréstimo fazia parte de uma linha de crédito oferecida para todos os estados e o Paraná foi o último a receber. A autorização só saiu após o governo estadual entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF). A corte mandou a STN acatar os pareceres do Tribunal de Contas do Estado que avalizavam os gastos com pessoal da gestão Richa, dentro dos limites previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Com isso, o dinheiro foi liberado.
Pauta conjunta
O que a gestão Richa considera prioritário na relação com o governo federal para os próximos quatro anos:
1 - Novo Pacto Federativo, para melhorar a distribuição dos recursos públicos arrecadados por meio de impostos, taxas e contribuições.
2 - Renegociar a dívida dos estados para permitir que os governos locais possam retomar investimentos em infraestrutura.
3 - Acelerar a execução do projeto e construção da nova linha da Ferroeste, entre Maracaju (MS) e Paranaguá.
4 - Retomar a discussão sobre os arrendamentos de áreas para expansão das atividades portuárias em Paranaguá (foto).
5 - Mudança da poligonal para viabilizar o porto de Pontal do Paraná.
6 - Mais investimentos na melhoria das rodovias federais que cortam o Paraná e que não compõem o Anel de Integração. Término da pavimentação da Estrada Boiadeira (de Cruzeiro do Oeste a Porto Camargo); construção da BR-101 no Litoral (da divisa de Santa Catarina até a divisa com São Paulo); término da BR-153(Ventania até Imbituva), da BR-158 (pavimentação de Campo Mourão a Palmital) e da BR-272 (de Iporã a Goioerê, não pavimentada).
7 - Agilizar a federalização da PR-280 (que corta o Sudoeste e concentra tráfego pesado em direção ao Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Argentina).
8 - Ampliar as parcerias com a União e agilizar a transferência de recursos para projetos de habitação a cargo da Cohapar, com financiamentos de bancos federais.
9 - Ampliar e agilizar o aporte de recursos federais (financiamentos do BNDES) para obras de saneamento (água e esgoto).
10 - Integrar o Paraná no plano de implantação dos aeroportos regionais.
11 - Desapropriação de áreas e aporte de recursos para terceira pista do Aeroporto Afonso Pena.
12 - Rediscutir a Medida Provisória 82, que transfere mil quilômetros de rodovias federais para a malha estadual.




