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Brasília

PF identifica suspeitos de incendiar quartos de africanos na UnB

A Polícia Federal (PF) identificou suspeitos e intimou oito estudantes e seguranças para prestar depoimentos no inquérito sobre o incêndio em três apartamentos da Casa do Estudante Universitário (CEU) da Universidade de Brasília (UnB) , ocupados por estudantes africanos. O episódio foi condenado nesta quinta-feira pelo chanceler Celso Amorim, que classificou "o atentado" como "algo muito grave". Em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado, o ministro garantiu que o Itamaraty vai acompanhar as investigações sobre o caso, que não deixou feridos. Na opinião dele, o ato envergonha o Brasil, que nos últimos quatro anos desenvolveu toda uma política de aproximação com os países africanos.

- O Itamaraty emitiu nota de repúdio e temos de acompanhar de perto as investigações. Isso é algo muito grave, vergonhoso. Há poucos momentos na vida em que sentimos uma vergonha coletiva - lamentou o chanceler.

O incêndio aconteceu na madrugada de quarta-feira e também mobilizou um grupo de parlamentares, que visita a UnB nesta quinta-feira, para levar solidariedade à instituição. O grupo, formado pelos senadores Paulo Paim (PT-RS), Cristovam Buarque (PDT-DF) e Cesar Borges (DEM-BA) e os deputados Fernando Gabeira (PV-RJ) e Janete Pietá (PT-SP), pretende levar a discussão aos poderes Executivo e Judiciário. Na próxima terça-feira, a Comissão de Direitos Humanos do Senado, presidida por Paulo Paim, instalará um grupo de trabalho para discutir o problema.

Para o reitor da UnB, Timothy Mulholland, o incêndio foi um ato terrorista:

- A UnB foi alvo de um atentado nesta madrugada. A democracia brasileira sofreu um atentado e os estudantes africanos sofreram um atentado de homicídio - afirmou o reitor, para quem o Brasil é um país racista e a UnB é uma universidade "de alma racista".

Mulholland conversou por telefone com diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, e disse esperar que a investigação identifique os responsáveis pelo ato. Os estudantes que moram nos três apartamentos atingidos deverão mudar-se para outros imóveis da UnB em endereço que não será divulgado.

Segundo a PF, o incêndio foi criminoso. Já estão sendo analisadas as impressões digitais encontradas no local e, na sexta-feira, o delegado Francisco Serra Azul vai começar a ouvir funcionários, alunos e seguranças da universidade.

Estudantes cobram punição dos autores do ataque

Segundo moradores da Casa do Estudante, foi achada no prédio uma garrafa vazia, na qual teria sido levada a gasolina para atear o fogo às portas dos apartamentos.

Cerca de 300 estudantes protestaram na tarde de quarta-feira contra o ataque em passeata pelo campus. Eles caminharam até a reitoria, onde foram recebidos pelo reitor em um auditório da universidade. Os estudantes cobraram a punição dos culpados e medidas para dar segurança aos alunos estrangeiros, assim como a criação de um centro de convivência para estudantes africanos na UnB e a oferta de mais disciplinas que tratem da história da África nos currículos dos cursos de graduação.

- Nossos pais, no passado, trabalharam gratuitamente para construir este país. Nenhum estrangeiro se sente seguro para caminhar neste centro universitário, nem sequer para dormir - discursou o ex-aluno de mestrado Lino Moniz, de 31 anos, natural de Cabo Verde.

O incidente da UnB ocorre um dia após a ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, ter afirmado que "é normal um negro se insurgir contra um branco".

O reitor disse não ver ligação entre os dois episódios. "Isso seria uma ilação irresponsável", afirmou ele em entrevista à BBC Brasil.

Em entrevista nesta quarta, a ministra afirmou que fez a declaração "num contexto de uma resposta muito mais ampla", mas que, de qualquer forma, gostaria de se "reposicionar" .

Também em entrevista à BBC Brasil, o antropólogo João Batista Borges Pereira diz que a polêmica provocada a partir das declarações da ministra desmascara a ilusão de que existe no país uma harmonia racial.

Segundo Mulholland, é inaceitável que estudantes não possam conviver em paz numa universidade. A UnB foi a primeira universidade federal a criar cotas para negros. Desde 2004, 20% das vagas dos vestibulares são reservadas para alunos negros.

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