O Ministério da Cultura preparou um projeto para mudar a Lei Rouanet que promete provocar polêmica no meio artístico. O texto, que aguarda apenas o aval da Casa Civil para ir a consulta pública, abre brecha para a criação de contribuições e taxas que seriam cobradas dos produtores culturais. Esse dinheiro será uma das fontes de renda de fundos setoriais que serão criados, segundo a proposta do ministério.
O governo quer instituir esses fundos para poder destinar recursos a quem não tem acesso aos grandes patrocinadores. Segundo a proposta do ministério, cada fundo terá um comitê gestor formado por representantes do governo e do setor. Caberá a esse comitê decidir se será necessário ou não criar as novas contribuições.
Além do fundo setorial do Audiovisual, serão criados outros quatro: das Artes, do Patrimônio, do Livro e da Diversidade Cultural. As contribuições são novas taxas negociadas pelo comitê gestor, que deverá ter pelo menos metade de seus membros da sociedade civil. No caso do Fundo Setorial das Artes, por exemplo, poderá ser cobrado dos produtores teatrais um porcentual do dinheiro arrecadado nos espetáculos. O dinheiro iria para o fundo e o governo poderia aplicá-lo em projetos fora do eixo Rio-São Paulo, que têm dificuldade de atrair o interesse dos patrocinadores.
Hoje, enquanto o Sudeste recebe 55% dos investimentos por meio da Lei Rounet, a Região Norte recebe apenas 4%. Com a nova legislação, a sociedade e a classe artística poderão ajudar a definir critérios para estimular o financiamento de projetos desinteressantes comercialmente. O novo Fundo das Artes poderá então definir que um evento de música erudita na Paraíba tenha 100% de isenção, enquanto uma apresentação em São Paulo conte com isenção menor. Ou seja, o patrocionador do evento na Paraíba poderá abater no Imposto de Renda tudo o que aplicou. "Tem uma demanda reprimida em todo o território nacional. Uma das distorções é a concentração regional na Avenida Paulista", diz Roberto Nascimento, secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do ministério.
Outra meta do governo é aumentar a arrecadação de recursos privados nos investimentos culturais. Para isso, o projeto estabelece a criação de várias faixas de isenção fiscal para a verba destinada ao patrocínio. Hoje, só há duas faixas: teatro, livros de valor artístico, música erudita e instrumental, exposições de artes visuais, doações para bibliotecas e documentários e curtas e médias metragens dão direito a 100% de renúncia fiscal. Os projetos das demais áreas têm 30% de isenção no Imposto de Renda.
A reforma da Lei Rouanet, que tem 17 anos, foi apontada pelo ministro da Cultura, Juca Ferreira, como prioridade de sua gestão logo no discurso de posse. Nos encontros que teve com empresários e artistas, Juca afirmou que o Brasil vive um "apartheid cultural". Com dados de uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) na ponta da língua, o ministro diz que 92% dos brasileiros nunca frequentaram museus, 93% jamais foram a uma exposição de arte e 78% não têm acesso a espetáculos de dança. Apenas 10% dos municípios possuem teatro, cinema, museus ou espaços multiusos.
O ministério também briga para engordar seus recursos. Atualmente com orçamento equivalente a 0,6% do PIB, a pasta quer contar com, no mínimo, 1% do total dos bens e serviços produzidos no Brasil.
O projeto deve ser submetido a consulta pública na próxima semana. Serão 45 dias para a sociedade civil apresentar críticas e sugestões ao texto. Só então a redação final será enviada ao Congresso para votação.



