
Não há dúvida de que o Brasil está experimentando uma boa dose de mobilização social desde a última semana. As manifestações contra o aumento da passagem de ônibus que começaram em São Paulo ganharam proporções nacionais. A ampliação do debate para outras áreas sociais reflete o momento de insatisfação generalizada da população em relação à política, na opinião dos especialistas. Mas é certo também que outras forças, aliadas ou alheias ao Movimento Passe Livre (MPL), têm procurado se apropriar dos fatos. Inclusive os partidos, que vêm usando o fenômeno das ruas em sua disputa político-eleitoral inicialmente na forma de ataques aos adversários e, em um segundo momento, para se defender de possíveis prejuízos a sua própria imagem.
Na semana passada, o PT do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, acusou o PSDB do governador Geraldo Alckmin de ter cometido excessos na repressão aos manifestantes pela Polícia Militar. O governo do estado, por sua vez, reagiu inicialmente atribuindo um caráter político aos protestos. E tratou de pôr o aumento das passagens de ônibus na conta da inflação causada pelo PT de Dilma Rousseff.
Uma carta da Juventude Paulistana do PSDB também responsabiliza Haddad pelo caos do transporte urbano. "A superlotação no metrô e na CPTM [companhia de trens metropolitanos] está diretamente ligada à incapacidade do prefeito de assumir suas responsabilidades e fazer funcionar devidamente os ônibus da cidade, e a um preço justo", diz a carta.
Já os partidos de extrema esquerda, que têm participado ativamente dos protestos, acusam tanto petistas como tucanos pela falência geral do Estado. É o caso do PSol, por exemplo. João Victor Pavesi de Oliveira, integrante do diretório estadual da legenda, diz que tanto Haddad quanto Alckmin resistem à pressão popular para baixar a tarifa: "Desde um primeiro momento há o entrelaçamento dos governos, e fica explícita a posição do PSDB e do PT. Eles não estão apresentando políticas públicas que favoreçam a população. Pelo contrário, estão a onerando cada vez mais, sem garantir direitos sociais ao público."
Mudança de postura
Com a ampliação das multidões nas ruas, o discurso e atitude dos políticos mais diretamente envolvidos foi mudando. Alckmin proibiu a PM de usar balas de borracha nas manifestações. Haddad recebeu líderes dos protestos. E a presidente Dilma Rousseff, que estava se mantendo distante dos fatos, percebeu o potencial do estrago político que as manifestações poderiam lhe causar, sobretudo em sua tentativa de reeleição, no ano que vem. E começou a agir.
Elogiou os manifestantes: "O Brasil hoje acordou mais forte. A grandeza das manifestações (...) comprova a energia da nossa democracia". E tirou da gaveta um novo projeto para desonerar as tarifas de ônibus.
Outros pré-candidatos à Presidência também correram para celebrar a voz das ruas. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), disse que é preciso que os governos "abram os ouvidos à sociedade" e aceitem dialogar para ouvir a pauta de reivindicações dos manifestantes, a quem chamou de "brasileiros que querem melhorar o Brasil". "É fundamental saber dialogar. É fundamental que os governos abram os ouvidos à sociedade, sentem e possam encontrar os caminhos e entendimentos."
Paranaense comandou reação do Congresso à "invasão"
André Gonçalves, correspondente
Vice-presidente da Câmara e do Congresso Nacional, o deputado federal André Vargas (PT-PR) foi o responsável pela reação à tentativa de invasão do Congresso Nacional durante o protesto da última segunda-feira em Brasília. Com as ausências dos presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-RN), coube a Vargas negociar a estratégia de policiamento do prédio com o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT).
O paranaense disse que a estratégia foi tentar "pacificar" os manifestantes, que ocuparam todas as áreas externas do Congresso. Vargas só entrou no Congresso às 21h30, quando houve a tentativa de entrar no edifício pela entrada principal, ocupada pela polícia de choque.
O deputado disse que o comando do Parlamento está preparado para novas manifestações, programadas para ocorrer em Brasília amanhã e no domingo. "Não vamos preparar nada de especial, não tem necessidade", disse.
Durante o protesto, o único ato de vandalismo foi a quebra de vidros da janela da vice-presidência da Câmara, sala ocupada pelo próprio Vargas. "No fundo o mais importante agora não é a segurança pública, é entender esse movimento, que é legítimo, que é democrático."




