
Apresentada como oportunidade de responder à demanda da sociedade por mudanças, a reforma política em discussão na Câmara dos Deputados “estacionou” em apenas um tema relevante – o fim da reeleição para prefeito, governador e presidente.
Dentre nove questões em pauta nos últimos três dias, apenas duas mudam o cenário político nacional: o fim da reeleição e a cláusula de barreira, que estabelece um desempenho eleitoral mínimo para que um partido tenha direitos legislativos. Mas as regras da cláusula foram consideradas brandas demais para dificultar o funcionamento de partidos de aluguel. A Câmara também aprovou a constitucionalização das doações eleitorais de empresas a partidos. Mas isso já é praticado atualmente.
Por outro lado, foram descartadas alterações no sistema de eleições para deputado estadual, federal e vereador. O fim das coligações nas eleições legislativas também não passou. Outros três pontos serão tratados em duas semanas (duração dos mandatos, coincidência de mandatos e cotas para mulheres nas eleições).
O encaminhamento das sessões mostra que os deputados desviaram de praticamente todas as propostas que pudessem modificar o modelo pelo qual se elegeram. Na terça-feira, iniciaram os trabalhos recusando três opções de sistemas eleitorais (listas fechadas, distrital misto e distritão). Mantiveram a regra vigente (de voto proporcional de lista aberta, no qual o eleitor opta por votar apenas no partido ou no partido e candidato ao mesmo tempo).
Nesta quinta-feira (28), derrubaram a possibilidade de acabar com as coligações de partidos nas eleições de deputado e vereador. Com isso, as eleições parlamentares continuam sujeitas ao “efeito-Tiririca”. Em 2010, os votos do palhaço filiado ao PR-SP ajudaram a eleger candidatos do PT, como José Genoino (PT-SP), condenado no julgamento do mensalão. Puxadores de voto – como artistas e ex-jogadores de futebol – vão continuar sendo cobiçados por chapas em que caciques partidários estejam em dificuldades de se eleger.
Também nesta quinta, foi aprovado o estabelecimento de uma cláusula de barreira, que obriga os partidos a ter pelo menos um deputado federal ou senador eleito para ter acesso à propaganda gratuita na televisão e ao Fundo Partidário. O dispositivo, que recebeu 369 votos favoráveis, 39 contra e 5 abstenções, foi considerado muito brando por partidos como o PSDB. “É uma barreira falsa, que não muda absolutamente nada”, disse Samuel Moreira (PSDB-SP).
O fim da reeleição foi aprovado no fim da noite de quarta-feira, em uma votação que surpreendentemente uniu quase todas as legendas, inclusive o PT. Pesou para o resultado de 452 votos a favor, 19 contra e 1 abstenção um mea culpa dos tucanos. “Eu votei pela emenda da reeleição em 1998 e admito que fiquei profundamente arrependido”, disse o paranaense Luiz Carlos Hauly (PSDB).
Nos bastidores do Congresso, líderes partidários admitiram que a reforma só serviu para cumprir o objetivo do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de tornar constitucional as doações de empresas para partidos. Uma proposta similar, que permitia financiamento de pessoas jurídicas para candidatos e partidos foi rejeitada um dia antes. “Estamos transmitindo um recado muito ruim para a sociedade, de que a promiscuidade que vimos nesse escândalo do Petrolão vai continuar firme e forte, dentro da lei”, disse o líder do PPS, Rubens Bueno.



