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Concursados exigem nomeação

Brunno Covello/ Gazeta do Povo

Manifestantes "celebraram" dois anos de aprovação em concurso sem nomeação

Taiana Bubniak

No início da manhã de ontem cerca de 15 manifestantes levaram bolo e vela para a sede da Defensoria Pública do Paraná, no Centro de Curitiba. A comemoração – irônica – lembra os dois anos da aprovação de 528 pessoas em concurso público para o órgão em cargos de agentes profissionais (ensino superior) e de técnicos judiciários (ensino médio). A nove dias de expirar o prazo de validade do certame (que já foi prorrogado uma vez), os concursados reclamam da falta de empenho para estruturação do órgão no estado, já que até o momento apenas 105 dos aprovados dentro do número de vagas previsto no edital foram nomeados.

"Nós questionamos o governo, mas eles dizem que não têm previsão por causa do limite prudencial [dos gastos com servidores públicos exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal]", reclama Bruno Cordeiro, um dos organizadores do ato. O grupo agora se organiza juridicamente para garantir a nomeção de todos os aprovados no número de vagas do edital.

O governo do estado, por meio da assessoria de imprensa, confirma que o motivo do atraso nas nomeações é, de fato, o gasto com o funcionalismo, que não pode aumentar. No balanço do segundo quadrimestre deste ano, a folha de pagamento alcançava 48,10% da receita corrente líquida. A assessoria não soube informar qual a saída para que os concursados não percam seus direitos. "O que queremos é simples: que a lei seja cumprida e nosso direito respeitado", diz o texto do manifesto entregue pelos concursados aos usuários da Defensoria que aguardavam atendimento.

"Farra"

Governador determina abertura de investigação

Ontem, enquanto a apuração para esta reportagem era finalizada, o governador Beto Richa emitiu um ofício para o controlador-geral do estado, Carlos Eduardo de Moura, a fim de que um procedimento investigatório sobre a Defensoria Pública seja instaurado para que se apure se foram criadas vantagens salariais sem autorização legal. Beto Richa disse à Gazeta do Povo que considera "inaceitável" a rápida ascensão dos defensores públicos. "Estou perplexo ao receber a informação desses aumentos descabidos, considero isso uma farra." Para ele, o país como um todo passa por um momento em que "é preciso ter austeridade". "Não tenho conhecimento de outra categoria que em menos de um ano teve [quase] 100% de aumento", diz. Ele enfatiza que nenhum servidor do governo tem auxílio-alimentação, já os defensores recebem R$ 710 por mês.

Histórico

A Defensoria Pública do Paraná foi a penúltima a ser criada no Brasil, em 2011, atrás apenas de Santa Catarina. Segundo a Constituição, a instituição deve oferecer orientação jurídica gratuita aos necessitados e a promoção dos direitos humanos.

Aumentos graduais ao longo deste ano levaram os defensores públicos do Paraná a ter um reajuste de 87% na remuneração nesse período. Detalhe: a maioria dos membros da Defensoria – 66 dos 76 – completou um ano de nomeação em outubro. Em dezembro do ano passado, o subsídio recebido era de R$ 10.684,38 e, em setembro deste ano, chegou a R$ 19.997,58.

INFOGRÁFICO: Veja como as remunerações dos defensores públicos do estado evoluíram em um ano

O crescimento nos rendimentos foi feito por meio de diversas manobras jurídicas, decididas em deliberações do Conselho Superior da Defensoria Pública do Paraná e em resoluções da defensora-geral, Josiane Fruet Bettini Lupion. Em abril deste ano, uma resolução promoveu todos os membros da terceira para a primeira categoria na carreira. A interpretação apresentada é que, conforme prevê a Lei Orgânica da Defensoria (Lei 136/2011), se não houver pessoas suficientes na segunda categoria, é possível fazer promoções direto da terceira para a primeira. Assim, todos os defensores foram promovidos de uma só vez. Para a promoção foram intercalados os critérios de merecimento e antiguidade, conforme prevê a lei.

A avaliação de merecimento, segundo a legislação, deve levar em conta itens como eficiência no desempenho, vida funcional, contribuição à organização e atuação em comarca com particular dificuldade. Como não havia tempo de atuação suficiente para fazer esse tipo de avaliação, uma resolução definiu que fossem consideradas as notas do concurso para fazer a classificação do merecimento. De qualquer forma, todos os defensores – a maioria antes mesmo de cumprir o estágio probatório – chegaram ao nível mais alto da carreira.

Equiparação

Após a promoção em massa, em julho, uma nova resolução equiparou os salários dos defensores nivelando por cima. A Lei Orgânica previa um plano com aumento salarial a cada cinco anos na carreira, mas o Conselho entendeu que o "adicional por tempo de serviço é incompatível com o conceito de parcela única" que deve caracterizar o subsídio. Os ganhos extras pelo tempo na carreira passaram, então, pelo que a defensora-geral classificou como uma "adequação constitucional". A Resolução 118/2014 transforma o valor que era adicional em parte do salário sob o argumento de que os ganhos são irredutíveis; o mesmo documento nega que isso seja incorporação ou reajuste.

Mas não foram apenas os defensores mais antigos que tiveram o aumento nos ganhos fixos. Todos passaram a receber o mesmo salário, com a justificativa de que não pode haver diferenças salariais entre membros que estão na mesma categoria da carreira. Ou seja, os subsídios foram nivelados, mais uma vez, por cima.

Matheus Carvalho, procurador da Fazenda Nacional e professor de direito administrativo do Complexo de Ensino Renato Saraiva, explica que o Supremo Tribunal Federal (STF) não admite alteração remuneratória com base no princípio da isonomia. Além disso, uma alteração no valor do subsídio dos procuradores teria de ser determinada por lei e não por uma decisão interna do órgão.

Já Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas, relembra que a Defensoria ainda não está presente em todo o estado justamente por falta de recursos. "Do ponto de vista do interesse público seria melhor implantar a Defensoria em todos os lugares. Até porque essa não era a expectativa dos que foram aprovados no concurso para defensor, eles tinham um subsídio com valor definido [em edital] para receber", avalia.

Subdefensor diz que alterações são legais

A defensora pública-geral, Josiane Fruet Lupion, está em viagem ao interior do estado para o Mutirão Carcerário e, de acordo com a assessoria de imprensa, não poderia responder por telefone aos questionamentos da reportagem. Na ausência dela, o subdefensor público-geral André Ribeiro Giamberardino respondeu pela instituição. Segundo ele, todas as decisões tomadas pelo conselho ou por Josiane estão dentro da legalidade. Ele explica que, segundo o Ipea, o Paraná deveria ter pelo menos 844 defensores e os profissionais estão operando no limite.

Ainda de acordo com o defensor, o aumento nos subsídios em menos de um ano é uma questão jurídica "complexa" porque a Lei Orgânica misturou dois regimes de remuneração e foi preciso fazer uma adequação, já que o subsídio não pode ter adicionais.

Em 22 de outubro, depois de uma consulta da Associação dos Defensores Públicos do Paraná, o advogado Romeu Bacellar Filho emitiu parecer para justificar as decisões anteriores do Conselho Superior da Defensoria. Segundo o parecer, as defensorias têm autonomia funcional e administrativa. No entendimento do jurista, "o ato normativo não promoveu qualquer alteração do valor do subsídio".

Sobre a decisão de promover todos os defensores de uma só vez, Giamberardino argumenta que todas as instituições públicas começam a estruturação pelos cargos mais altos e que os defensores precisavam dar lugar na categoria para os próximos que vão entrar – já há um novo concurso em andamento.

"Isso soa estranho, porque­ a gente não tem o exemplo de nenhuma outra instituição que esteja sendo criada neste momento." Ele diz que os defensores em estágio probatório continuam sendo avaliados.

Concurso

O subdefensor público-geral alega que o único impedimento para a contratação dos servidores é a limitação fiscal do estado, pois, segundo ele, há recursos na Defensoria para contratá-los. "Somos totalmente favoráveis à entrada dos servidores e há previsão orçamentária para que sejam contratados ainda neste ano. Não há nenhuma relação entre o que se gasta com os defensores e algum tipo de óbice à entrada dos servidores." O orçamento da Defensoria para 2014 é de cerca de R$ 90 milhões. Para o próximo ano, ainda não está definido.

Colaborou: Kamila Mendes Martins

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