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Rossoni (esq.) e Justus, atual e ex-presidente da Assembleia: para especialista, gratificação que dobrava o salário dos dirigentes da Casa é inconstitucional, e não apenas o valor que excedia o teto | Albari Rosa/ Gazeta do Povo
Rossoni (esq.) e Justus, atual e ex-presidente da Assembleia: para especialista, gratificação que dobrava o salário dos dirigentes da Casa é inconstitucional, e não apenas o valor que excedia o teto| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

Controle falho

Tribunal de Contas não percebeu erro

O Tribunal de Contas do Paraná (TC), responsável por fiscalizar a aplicação do dinheiro público no estado, não percebeu nenhuma irregularidade no pagamento da verba de representação que permitia que os presidentes da Assembleia Legislativa ganhassem mais do que o teto constitucional. A gratificação começou a ser paga em 1992. E, pelo menos desde 1998, com a Emenda Constitucional nº 19, com a definição do teto legal, a remuneração dos presidentes pode ter extrapolado o permitido.

"Isso nunca foi identificado", admitiu Fernando Guimarães, presidente do TC. O motivo de o TC não ter detectado a irregularidade, segundo Guimarães, é que a Assembleia não presta informações detalhadas da remuneração dos 54 deputados.

Segundo ele, o tribunal analisa somente a aplicação global do orçamento da Assembleia porque o Legislativo não repassa informações específica sobre quanto foi pago de remuneração a cada deputado e servidor da Casa.

Guimarães disse que o pagamento irregular das aposentadorias na Assembleia é um caso semelhante ao da gratificação, já que antes deste ano o TC não era informado sobre os benefícios específicos. "Nós não tínhamos um trabalho [de controle] de folha. O caso das aposentadorias é a mesma coisa."

Mas, segundo Guimarães, essa situação deve mudar. A Lei nº 131/2009, em vigor desde este ano, determina o detalhamento de todos os salários. O presidente do TC disse ainda que determinou a apuração do caso da gratificação paga aos presidentes da Assembleia. "A 5ª Inspetoria de Controle Externo do TC, que é a responsável pela fiscalização da Assembleia neste ano, já foi informada sobre a questão e irá adotar os procedimentos de controle."

Heliberton Cesca

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Ex-presidente

Valor era menor, diz Hermas

Daniel Derevecki/ Gazeta do Povo

Presidente da Assembleia entre 2001 e 2006, o ex-deputado e atual conselheiro do Tribunal de Contas Hermas Brandão disse não se lembrar do quanto recebia por meio da gratificação, mas garantiu que o valor não ultrapassava o teto constitucional. "Já deixei a Assembleia há praticamente cinco anos e não lembro o valor exato [da gratificação], mas não era tudo isso [equivalente a um outro salário] e não ultrapassava o teto legal. Que eu me lembre, era algo em torno de R$ 3 mil e pouco, mas não tenho certeza", afirmou. "Na segunda-feira, vou requerer à Assembleia uma certidão dos meus vencimentos, que estará à disposição da imprensa. Não tenho nada a esconder."

Procurado por telefone, o ex-presidente da Assembleia Nelson Justus – que comandou a Casa de 1999 a 2000 e de 2007 a 2010 – não retornou às ligações da reportagem. (ELG)

Verba extra é paga no TJ e no TC, mas valor não excede o teto

Diante da afirmação do deputado Valdir Rossoni de que os chefes dos outros poderes do estado também recebem uma gratificação para ocupar o cargo, o TC e TJ informaram que, de fato, seus presidentes contam com uma verba de representação – o que pode ser questionado com base na Emenda Constitucional n.º 19, de 1998.

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Leia coluna na íntegra

O presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, deputado Valdir Rossoni (PSDB), anunciou ontem que vai devolver aos cofres públicos os R$ 160 mil recebidos como gratificação especial pelo exercício da presidência da Casa. O valor da gratificação, paga mensalmente, equivalia a um salário de deputado (R$ 20 mil) e, na prática, dobrava a remuneração do tucano – extrapolando o teto constitucional, que é de R$ 26,7 mil. A devolução do dinheiro, no entanto, não afasta a possibilidade de Rossoni sofrer sanções administrativas e judiciais. O tema divide especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo.

Rossoni disse que pretende apresentar na sessão da Assembleia da próxima segunda-feira o comprovante da transferência para a conta do Legislativo dos R$ 160 mil referentes aos oito meses de gratificação (fevereiro a setembro) em que recebeu o benefício.

O privilégio foi criado em dezembro de 1992 pelo então presidente da Casa, Aníbal Khury, e, desde então, todos os deputados que passaram pela presidência da Assembleia o receberam. Na última terça-feira, diante da repercussão negativa por estender a gratificação do primeiro e ao segundo-secretário – Plauto Miró (DEM) e Reni Pereira (PSB) –, Rossoni decidiu revogar o decreto.

"Quando assumimos, tomamos medidas de controle dos gastos públicos e, para continuar esse processo, estou devolvendo os valores", disse Rossoni. Ele alegou ainda que o pagamento da verba de representação – nome oficial da gratificação – é uma prática comum nas assembleias estaduais e em outros poderes.

Ministério Público

Antes de Rossoni anunciar a devolução dos valores, a Federação das Associações de Moradores de Curitiba havia solicitado ao Ministério Público Estadual (MP) que o deputado fizesse o ressarcimento da verba aos cofres públicos. Mas o pedido não pede que a devolução seja feita pelos outros ex-presidentes que receberam a gratificação após uma emenda constitucional ter tornado, em 1998, o benefício irregular: Hermas Brandão e Nelson Justus, além de Aníbal Khury, que morreu em 1999. A reportagem procurou o MP, mas recebeu a informação de que o promotor, Paulo Ovídio dos Santos Lima, que poderia responder pelo caso, estava viajando e não foi localizado.

Inconstitucionalidade

Especialistas em Direito Admi­­­nistrativo divergem quanto à responsabilidade de Rossoni e a possibilidade de punição ao tucano e a outros ex-presidentes da As­­­sem­­­bleia pelo recebimento de remuneração acima do teto constitucional. Para o diretor do Instituto Gamma de Assessoria a Órgãos Públicos (Igam), André Barbi, a devolução do dinheiro elimina o dolo de Rossoni em permanecer com o dinheiro, mas não descaracteriza o ilícito administrativo.

Ele explica que o pagamento de qualquer gratificação é vedado pela Emenda Constitucional n.º 19, de 1998. "Ele [o presidente da Assembleia] é um ordenador de despesas e tem a obrigação de conhecer a inconstitucionalidade da gratificação que recebia", analisa. Para Barbi, o MP tem legitimidade para abrir um inquérito civil e responsabilizar administrativamente todos os presidentes que receberam a gratificação. Além disso, outra ilegalidade é o recebimento de valores acima do teto.

Já para o advogado Rodrigo Matheus, especialista em Direito do Estado e conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo, o fato de Rossoni ter revogado o decreto que criou o benefício e garantir que vai devolver aos cofres públicos os R$ 160 mil recebidos como gratificação isentaria o tucano de eventuais punições na Justiça.

O advogado ressalta, no entanto, outra irregularidade em relação ao pagamento do benefício aos presidentes da Assembleia entre janeiro de 1993 e setembro deste ano. "Na origem, haveria de fato um vício na estipulação do benefício por ter sido feito por decreto, de maneira pouco democrática, sem a aprovação efetiva dos membros da Casa", diz ele.

Interatividade

O MP deveria abrir investigação contra os ex-presidentes da Assembleia? Ou a devolução do dinheiro os isenta de culpa?

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