Brasília - O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), recorreu à própria biografia para defender-se da série de pelo menos 14 escândalos que atingem o senador e a Casa ao longo de 2009. Sarney negou a existência de atos secretos e disse que a polêmica sobre a contratação de parentes dele é "falta de respeito". "A crise não é minha, é do Senado", declarou, sem anunciar punições pelos boletins sigilosos editados no Senado nos últimos 14 anos.
Sarney discursou ontem em plenário e protelou a apresentação das respostas sobre os cerca de 300 atos secretos da Casa que não foram publicadas nos últimos 14 anos os quais serão investigados pelo Ministério Público Federal (leia mais na página seguinte). Ele prometeu um relatório sobre o assunto para a próxima segunda-feira. A demora seria por causa da ausência do primeiro-secretário Heráclito Fortes (DEM-PI), responsável pela administração do Senado ele recupera-se de uma cirurgia de redução do estômago.
"Eu não sei o que é ato secreto. Aqui, ninguém sabe o que é ato secreto", disse o peemedebista. Segundo Sarney, o que pode ter ocorrido são problemas relacionados à publicação dos textos desses atos na intranet (rede interna de internet) do Senado. "Mas isso tudo é relativo ao passado, nada em relação ano nosso período."
Cercado de expectativa, o discurso do presidente do Senado demorou 40 minutos e reuniu 65 dos 81 senadores. Sarney preferiu falar do púlpito e não da cadeira de presidente. Ao final, foi aplaudido e abraçado por quase todos os colegas o primeiro da fila foi o também ex-presidente da República Fernando Collor de Melo (PTB-AL).
A estratégia foi idêntica ao do ex-presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao defender-se das acusações de que um lobista pagava as despesas com a filha fora do casamento com a jornalista Mônica Veloso, em 2007. Antes do discurso, Calheiros teria sugerido ao colega que usasse o ataque como defesa. Não houve, porém, agressões ou intimidações nas palavras de Sarney.
O senador emocionou-se ao falar da doença da filha, Roseana Sarney (PMDB-MA), que passou por uma cirurgia de retirada de um aneurisma cerebral há duas semanas. Segundo ele, os problemas recentes na administração da Casa são "uma penitência" após a "libertação" da enfermidade enfrentada por Roseana, que acaba de assumir o governo do Maranhão.
Sarney também apelou à família para se defender das acusações de nepotismo. Entre os atos secretos, estavam a nomeação de duas sobrinhas e um neto para cargos comissionados em gabinetes da filha Roseana (enquanto senadora) e dos colegas Delcídio Amaral (PT-MS), e Epitácio Cafeteira (PTB-MA). Sarney disse que vai devolver a sobrinha lotada no gabinete de Delcídio, Vera Borges, para o Ministério da Agricultura, órgão no qual ela é servidora de carreira.
"Não posso ser julgado assim. É uma injustiça julgar um homem como eu, com tantos anos de vida pública, vida austera, família bem composta, que preza a dignidade na carreira, que nunca um colega não teve gesto de cordialidade, nunca neguei voto no sentido de avançarmos na melhoria da Casa."
Sarney fez uma lista de ações biográficas que não poderiam ser manchadas pelas denúncias recentes. Entre elas estaria o desafio de assumir a Presidência da República durante a transição para o regime democrático.
Sarney também ressaltou que crises similares à do Senado transformaram-se em algo comum nos parlamentos de vários países. Ele citou casos recentes de escândalos na Argentina e na Inglaterra. "O problema mais sério é a crise da democracia representativa. Essa é a grande crise no mundo inteiro."
Redução de gastos
Em conversas com senadores após o discurso na tribuna do plenário, Sarney assegurou que pretender apresentar nos próximos dias medidas administrativas como resposta à crise no Senado. O peemedebista disse a um grupo de senadores que estuda anunciar um corte de 40% nos gastos da instituição e que pretende reduzir os poderes da diretoria-geral do Senado para evitar que o órgão concentre os poderes administrativos da Casa.



