Brasília - Sob pressão do próprio partido e dos ruralistas, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes (PMDB), deve contrariar o presidente Lula e vetar as mudanças no índice de produtividade agrícola. O cálculo é utilizado como critério para desapropriação de terras para a reforma agrária e deveria ser atualizado nos próximos dias (o que não ocorre desde 1980). Na prática, a revisão faria com que os agricultores tivessem de produzir mais para não correr o risco de terem suas terras desapropriadas. O posicionamento pode prejudicar a permanência do paranaense no governo.
Stephanes participou ontem de uma reunião com a bancada peemedebista na Câmara dos Deputados. Parlamentar licenciado, ele ouviu dos colegas apelos para não aceitar mudanças no índice. "Respaldado pelo partido, vou levar ao presidente a recomendação de que o momento não é adequado", prometeu.
A alteração nos índices de produtividade depende do aval conjunto de Stephanes e do ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, que assinou a decisão na semana passada. A alteração ainda precisa ser levada ao Conselho Nacional de Política Agrária, que não tem poder de veto. Stephanes indicou que só mudará de ideia caso seja forçado por Lula.
Segundo ele, a atualização do índice não foi uma exigência do presidente. "Não houve uma determinação (do presidente) no sentido de eu determino. É claro que se ele tivesse feito isso não haveria outra posição para mim. Seria assinar ou deixar o cargo."
O ministro, entretanto, declarou que um pedido de demissão está "fora de cogitação". De acordo com parlamentares que participam das negociações, Lula já sabia do posicionamento de Stephanes. A expectativa deles é que o presidente não repreenda a decisão do paranaense, que seria tratada como técnica.
A tese dos ruralistas, respaldada pelo PMDB, é de que a mudança traria mais insegurança aos produtores rurais brasileiros em um período de instabilidade provocado pela crise econômica mundial. "Seria muita irresponsabilidade da nossa parte não interferir nesse assunto", justificou o líder da legenda na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN). Ele entrou em contato ontem com o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, para comunicar o apoio do PMDB a Stephanes.
Além disso, o ministro da Agricultura afirmou que os índices utilizados para o reajuste são simplistas e não condizem com a realidade do setor rural brasileiro.
O discurso técnico, no entanto, não será suficiente para convencer congressistas e entidades que defendem a reforma agrária, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). "Manter o mesmo índice de três décadas atrás é um retrocesso para o país. Se o ministro não cumprir o que o presidente defende e é justo, é bem melhor pedir as contas", disse o deputado paranaense Dr. Rosinha (PT), presidente da Frente Parlamentar da Terra.
Impacto
Embora contraponha ideologicamente MST e ruralistas, a mudança no índice deve ter pouco impacto para a reforma agrária. De acordo com estimativas do Ministério da Agricultura, o estado com maior número de propriedades afetadas seria o Mato Grosso 12% das áreas estariam abaixo do novo índice. No Paraná, essa porcentagem seria de 2% e, em Santa Catarina, de 1%.
Líder da bancada ruralista no Congresso Nacional, o deputado paranaense Abelardo Lupion (DEM) afirmou que a proposta é uma afronta a todos os produtores. "Como é que o governo pode ter credibilidade se baseia suas ações no que propõe o MST?"
Apesar das pressões, qualquer decisão sobre o assunto só deve ser anunciada na semana que vem. Após a reunião de ontem, Stephanes disse que ainda pretende ter uma conversa com Lula para explicar os motivos contrários à mudança no índice. O encontro, porém, ainda não tem data para acontecer.
* * * * *
Interatividade
É justo atualizar o índice de produtividade que determina quais terras podem ser desapropriadas?
Escreva para leitor@gazetadopovo.com.br
As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor.



