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O ministro do STF Celso de Mello (ao fundo) observado por Cezar Peluso: críticas à decisão do Supremo, por permitir a continuidade da censura | Gervàsio  Baptista/STF
O ministro do STF Celso de Mello (ao fundo) observado por Cezar Peluso: críticas à decisão do Supremo, por permitir a continuidade da censura| Foto: Gervàsio Baptista/STF

Placar

Confira como votaram os ministros do STF:

A favor da censura

Cézar Peluso (relator), Eros Grau, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, José Antônio Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski.

Contra a censura

Celso de Mello, Carlos Ayres Britto e Carmen Lúcia.

Ausentes

Marco Aurélio Mello e Joaquim Barbosa.

Defesa da imprensa

Ministro vê resquícios da ditadura

O ministro Celso de Mello foi o último dos nove ministros presentes na sessão de ontem a votar. E, apesar de vencido, fez uma defesa veemente da liberdade de imprensa. Ao começar o discurso, ele lembrou que ontem era o 61º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ele também citou o Pacto de San José da Costa Rica para dizer que o Brasil é signatário de uma série de acordos internacionais contrários à censura.

"A censura obstrui a nossa mais rica mercadoria, que é a liberdade", afirmou. Segundo ele, qualquer brecha que desestabilize o direito à informação e à liberdade de expressão previstos na Constituição de 1988 remete à ditadura militar brasileira (1964-1985). Ele também lembrou que no próximo domingo há outra data para ser lembrada – mas não comemorada – os 41 anos do Ato Institucional número 5, que fechou o Congresso e acirrou a ditadura militar.

"É particularmente grave que ainda permaneçam no aparelho de Estado certas visões autoritárias." Mello também citou que a maioria das Constituições que vigoraram no Brasil contiveram dispositivos próprios para inibir a censura. Além disso, o ministro citou uma declaração feita pelo ex-presidente dos Estados, Thomas Jefferson (1801-1809). Segundo o norte-americano, é melhor optar por uma imprensa livre sem governo do que por um governo sem imprensa livre. (AG)

Brasília - O jornal O Estado de S. Paulo permanece proibido de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica (rebatizada como Ope­­ração Faktor). A investigação, conduzida em segredo de Justiça pela Polícia Federal, levou ao indiciamento do empresário Fer­­­nando Sarney – filho do presidente do Senado, José Sarney. O Supremo Tribunal Federal (STF) negou ontem, por seis votos a três, uma reclamação movida pelo jornal contra a censura judicial em vigor há 133 dias.

O pedido era baseado na decisão dos ministros que, em abril, extinguiu a Lei de Imprensa, com base nos princípios constitucionais da liberdade de imprensa e de expressão. A maioria dos ministros do STF alegou que os dois julgamentos não têm conexão e, assim, determinou o arquivamente do pedido por razões técnico-processuais, sem entrar no mérito do caso.

Parte dos ministros que votaram pela manutenção da censura, porém, teceu comentários sobre o mérito. Eles entenderam que a proibição de divulgar as reportagens envolvendo a família Sarney protege o direito à intimidade. Fernando Sarney alegou que as reportagens se baseiam em escutas telefônicas feitas pela PF que conteriam diálogos íntimos. Agora, o processo envolvendo a censura volta à Justiça Federal do Maranhão.

Se veicular matérias sobre o assunto, o jornal está sujeito a uma multa diária de R$ 150 mil. A liminar que censurou o Estadão, corroborada agora pelo Supremo, foi do desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF), Dácio Vieira.

Na época, o jornal mostrou em reportagem que o desembargador era amigo da família Sarney. O material, porém, não foi suficiente para que Vieira fosse afastado do caso. A saída dele só ocorreu porque, ao recusar um dos recursos movidos pelo jornal, ele fez duras críticas pessoais à publicação.

Depois do afastamento, o processo foi remetido à Justiça Federal do Maranhão, onde ocorre a investigação. Enquanto isso, o jornal permanece sem poder divulgar reportagens que já estão apuradas sobre o caso. Fernando Sarney foi indiciado no dia 15 de julho por formação de quadrilha, gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.

Discussão de ministros

A ação julgada ontem foi a quin­­ta tentativa do jornal de derrubar a censura. A reclamação solicitava uma decisão liminar contra a decisão do TJ-DF. A argumentação da empresa invocava o acórdão do julgamento da Arguição de Des­­cumprimento de Preceito Fun­­damental (ADPF) 130, na qual o STF entendeu que a liberdade de imprensa deve ser plena, ou seja, sem qualquer tipo de censura.

O relator do processo, Cézar Pe­­luso, puxou os votos contrários à reclamação do Estadão. O ministro discutiu várias vezes com o colega Carlos Ayres Britto, que foi relator da ADPF 130 e admitiu que os dois casos estavam ligados. Britto defendeu que a decisão do TJ-DF está baseada nos velhos conceitos da Lei de Imprensa, derrubada justamente porque não tem amparo na Constituição de 1988.

"Isso aqui não é julgamento de paranormalidade", disse Peluso, referindo-se à tese de que a decisão dos desembargadores do Distrito Federal possa ter sido inspirada em uma lei que não está mais em vigor. "Não é pelo temor do abuso que se vai proibir o uso", rebateu Ayres Britto – que foi seguido apenas por Carmen Lúcia e Celso de Mello, autor do discurso mais duro a favor da liberdade de imprensa (veja quadro ao lado).

O presidente do STF, Gilmar Mendes, foi o primeiro a apoiar Peluso. "Todas as cortes têm grandes dificuldades de estabelecer hierarquias de direitos fundamentais", justificou. Ele comparou os direitos à liberdade de expressão e à inviolabilidade da intimidade presentes no artigo 5.º da Consti­tuição.

Segundo Mendes, ao garantir a inviolabilidade da intimidade, o texto protege esse direito no momento em que ele é colocado em risco. Ou seja, a proi­­­bição da publicação das reportagens seria uma maneira de evitar a violação do direito.

Repercussão

O diretor de Conteúdo do Grupo Estado, o jornalista Ricardo Gan­­­dour, considerou "frustrante" a decisão. Para ele, o STF "deu um passo atrás" ao manter a censura. "Nos preocupam os sinais que o STF pode emitir para o país. Nós entendemos que a liberdade de imprensa é um direito absoluto. Os veículos devem ser acionados pelo que publicam, e não impedidos de publicar", disse Gandour. Segundo ele, o STF "mais uma vez postergou a decisão, e o tempo jornalístico é fundamental", afirmou Gandour. "A nossa preocupação não é com o ‘caso do Estado’ em si. Nos preocupam os sinais que o caso emite para toda a imprensa e para a democracia". O Estadão in­­formou que vai recorrer por meio de um recurso extraordinário.

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