
Em 1965, a imprensa brasileira ainda estava se adaptando à cobertura do regime militar, quando o presidente Humberto de Alencar Castello Branco resolveu fazer uma visita fora da agenda ao bispo de Brasília. Todos os fotógrafos do jornal Última Hora, um dos principais da época, estavam ocupados em outras pautas e não tinham como chegar ao encontro em tempo. O jeito foi apelar para o moleque que trabalhava no laboratório de revelação de imagens.
Foi assim que, aos 15 anos, Orlando Brito começou no fotojornalismo: com a imagem de um presidente da República. "Dei sorte de morar do lado do arcebispado", brinca. Quase cinco décadas depois, ele fotografou todos os 11 chefes de Estado do país que se seguiram (o número fica ainda maior se levar em consideração a junta militar de 1969).
O currículo de Brito inclui passagens pelo Jornal do Brasil e O Globo, além de duas décadas na revista Veja, quando produziu 130 capas segundo ele, um recorde até para padrões internacionais. Além disso, trabalhou para o PSDB nas duas campanhas presidenciais de José Serra (2002 e 2010), na segunda de Fernando Henrique Cardoso (1998) e na de Geraldo Alckmin (2006). Na década passada, abriu a agência fotográfica Obritonews, especializada na cobertura de política, e manteve-se no front diário de Brasília.
O conjunto de experiências aguçou os sentidos e a forma de encarar a imagem "real" dos políticos. Brito diz que procura agir como o que chama de "leitor ausente", o sujeito comum que está distante do cotidiano do poder. "Não me basta uma imagem ser agradável, bonita ou feia. Ela tem que ter notícia, tem que representar aquilo que aconteceu."
A lapidação do trabalho, segundo ele, depende do grau de conhecimento que o profissional tem dos políticos. "No passado, nós tínhamos uma proximidade tão grande com os presidentes que você sabia o dia que eles trocaram de perfume."
Brito é parcimonioso ao fazer um balanço de como os presidentes que fotografou se comportam diante das câmeras. A opinião chega a ser surpreendente. O "mais sensacional no quesito visual", nas palavras dele, foi João Figueiredo o último dos presidentes militares que ficou famoso por dizer que preferia o cheiro de cavalo ao do povo.
"Com ele era zero de cascata", explica. No jargão do fotojornalismo, cascata é quando o fotografado topa combinar uma pose ou uma cena. O único que teve uma personalidade tão forte quanto a de Figueiredo, para Brito, foi Itamar Franco (que curiosamente também é lembrado pela foto na Sapucaí ao lado da modelo Lilian Ramos, sem calcinha).
Claro, também houve os que sempre se dispuseram a montar os próprios cenários. "Se você espremer as fotos do período Collor, percebe que não têm conteúdo nenhum."
Foi a cobertura diária dos quatro meses de campanha do ex-presidente, em 1989, que fez Brito mudar a percepção do próprio trabalho. "Passei a perceber que não podia deixar a minha fotografia terminar na revista que iria sair na segunda-feira. Eu estava registrando a história, não apenas um acontecimento jornalístico factual."
E, dentro da perspectiva histórica, qual foi a diferença entre acompanhar os presidentes da ditadura e os do período democrático? "Na ditadura, você podia fotografar tudo, mas não podia publicar nada porque a censura não deixava. Hoje é diferente, você pode publicar tudo, mas não tem acesso a nada." Segundo Brito, que teve laços profissionais com os tucanos, a situação se agravou nas gestões de Lula e Dilma Rousseff.
O alvo principal da crítica é a tentativa de assessores de criar cenários de propaganda para encaixar os presidentes. "Alguém inventou que o presidente não pode ter mais uma aparição normal em qualquer evento que seja. Em toda cerimônia, ele aparece com alguma placa atrás, o que tira a naturalidade da foto." Se continuar assim, nas previsões de Brito, vai ser cada vez mais difícil distinguir os perfumes dos presidentes. Assim como o estado de espírito de cada um no comando da nação.
Presidentes
Serviço
Mais do trabalho de cobertura política de Orlando Brito pode ser conferido no livro Poder, Glória e Solidão (Editora Terra Virgem) e em www.obritonews.com.br.








