
Por meio de um "tratoraço", a Assembleia Legislativa do Paraná aprovou ontem em definitivo a criação do auxílio-moradia para juízes e desembargadores e o projeto que institui a Fundação Estatal de Saúde (Funeas) entidade do governo paranaense que será responsável por gerir o sistema de atendimento médico no estado. As duas votações ocorreram sob regime de comissão geral, manobra regimental que apressa a apreciação de um projeto. Por meio dela, uma proposta que deveria ser discutida em diversas comissões temáticas segue diretamente ao plenário. Para agilizar ainda mais a tramitação dos projetos, a Assembleia realizou três sessões plenárias no mesmo dia (normalmente faz apenas uma). Com isso, as propostas passaram em três votações e agora seguem para a sanção do governador Beto Richa (PSDB).
INFOGRÁFICO: Veja como votou cada deputado
Verba de habitação é cheque em branco para o Judiciário
O projeto de criação do auxílio-moradia para juízes e desembargadores do Paraná foi aprovado sem emendas pela Assembleia. Na prática, os deputados paranaenses deram um cheque em branco para o Tribunal de Justiça (TJ), autor da proposta. Isso porque o valor do benefício e quem terá direito a ele serão definidos pelo próprio Judiciário estadual posteriormente, por meio de decreto. O projeto também deixa em aberto a possibilidade de o auxílio ser pago a magistrados que têm residência na comarca onde trabalham.
A bancada do PT chegou a apresentar um substitutivo geral ao projeto com três emendas. Uma restringia o pagamento apenas a magistrados que não têm residência na comarca onde trabalham proposta que a maioria dos deputados era contra. Outras duas emendas tinham a concordância da maior parte dos parlamentares: uma impedia o pagamento de benefícios retroativos e outra a aposentados. Mas como o substitutivo não podia ser votado de forma fatiada, o plenário o rejeitou para que juízes da ativa com casa própria possam receber o benefício.
O deputado Tadeu Veneri (PT) criticou o auxílio: "É absolutamente imoral votarmos um projeto que não diz em momento algum se esse valor pode ser estendido para aposentados e pensionistas". Líder do governo, Ademar Traiano (PSDB) defendeu o pagamento. "Entendo que [o gasto] é do orçamento do Judiciário, e o juiz tem que ter a autonomia necessária", disse.
Cortejado pelo governador, PMDB racha na votação da Funeas
Aprovado por 37 votos a favor e 14 contra, o projeto de criação da Fundação Estatal de Saúde (Funeas) revelou um racha no PMDB estadual. Metade dos 12 deputados do partido votou a favor da proposta, de autoria do governo do estado. Os outros seis foram contra. A divisão peemedebista foi interpretada nos bastidores como um alerta para as pretensões do governador Beto Richa (PSDB) de conseguir o apoio da sigla à sua campanha de reeleição. Richa conta com os deputados peemedebistas para derrotar a ala da legenda que pretende lançar candidatura própria ao Palácio Iguaçu.
A criação da Funeas fundação pública com natureza de direito privado é o principal projeto de 2014 do governador até agora. A entidade, que deve começar a operar em quatro meses, às vésperas do início da campanha eleitoral, é vista como alternativa para solucionar dois problemas crônicos da saúde pública: a falta de médicos nas áreas de urgência e emergência e nas especialidades. A aposta é que, sem as amarras da administração direta, o estado poderá contratar mais facilmente esse tipo de serviços, além de agilizar compras de insumos para o setor.
Líder do governo na Assembleia, Ademar Traiano (PSDB) argumentou ontem que a fundação servirá para melhorar a administração da saúde no Paraná. O deputado disse ainda esse modelo de fundação conta com o apoio do secretário da Saúde de Curitiba, Adriano Massuda, e do ministro da Saúde Arthur Chioro, ambos filiados ao PT. Afirmou ainda que existem fundações semelhantes em estados governados pelo PT e que, portanto, a oposição petista estaria equivocada ao criticar o projeto.
Já Tadeu Veneri, líder do PT, disse que a experiência das fundações de saúde nos governos estaduais, inclusive petistas, foi um "fracasso" facilitando o superfaturamento de compras, o aumento dos custos operacionais e a precarização do trabalho de médicos e de outros profissionais da saúde. Nas galerias, servidores estaduais faziam coro aos petistas e criticavam o projeto, que em seu entendimento vai promover a privatização da saúde pública.Emendas
A proposta aprovada ontem teve emendas apresentadas pelo próprio governo. Elas vedam a possibilidade de a Funeas administrar hospitais universitários e o Hospital da Polícia Militar. Também passou uma modificação que especifica que a entidade será fiscalizada pela Secretaria Estadual da Saúde.
Entrevista - Frederico Mendes Júnior, presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar)
Por que o Judiciário deve pagar auxílio-moradia?
O auxílio existe na Lei Orgânica da Magistratura. No Paraná, não consta esse inciso no Código de Organização e Divisão Judiciárias. Consta, porém, na Lei Orgânica do Ministério Público. Ele existe também em 13 estados e em todos os tribunais superiores, além do Conselho Nacional da Justiça. Não estamos criando nada de novo ou ilegal.
Mas o salário já não é alto o suficiente?
O juiz tem uma boa remuneração, mas estamos falando de profissionais altamente qualificados. Muitos desses profissionais, por causa da remuneração, estão deixando o Judiciário. Nos últimos dois anos, quase 20 jovens juízes deixaram a magistratura paranaense. Foram para outros estados, onde vão realizar a mesma função, ocupar o mesmo cargo, mas terão uma remuneração melhor.
Há uma reação negativa da sociedade? Não é difícil justificar esse benefício?
A renda da magistratura não é ruim. Mas esse é um direito e prerrogativa da lei federal, pago em metade dos estados da federação e em todos os tribunais superiores. Não acho isso injusto. Se você pegar profissionais do mesmo nível, a remuneração é igual ou superior.
Mesmo no serviço público? O teto do funcionalismo é o salário dos ministros do STF.
Não somos mais o paradigma, nem no serviço público. Estamos correndo atrás de benefícios que o Ministério Público já tem. Estamos correndo atrás de outras categorias que tem o adicional por tempo de serviço. Magistrado também não recebe hora extra, embora fique 24 horas por dia à disposição. Não temos viatura especial. Acho que nosso benefício é previsto em lei e está em sintonia com o momento atual com vivemos.





