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Desfile militar: na ditadura, país não estabeleceu gasto mínimo; na Nova República, investimento minguou | Henry Milléo / Gazeta do Povo
Desfile militar: na ditadura, país não estabeleceu gasto mínimo; na Nova República, investimento minguou| Foto: Henry Milléo / Gazeta do Povo

Análise

Falta de interesse político e restrições orçamentárias são maiores obstáculos à modernização militar

O investimento de R$ 397 bilhões em reequipamento das Forças Armadas brasileiras tem dois principais obstáculos a serem vencidos. O primeiro é de orçamento: injetar R$ 20 bilhões ao ano em compra de armamentos e veículos militares seria aumentar a verba de Defesa em cerca de 50% em relação ao que se gasta atualmente com o setor no país.

Barreira talvez maior seja de ordem política. Ninguém sabe dizer ao certo é se o governo brasileiro e o Congresso terão interesse em aprovar gastos deste montante com um setor que não traz benefícios imediatos para a população. O governo de Dilma Rousseff tem maioria no Parlamento, mas a presidente teria de gastar cacife político para aprovar o aumento dos gastos militares.

Para o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília, as despesas com as Forças Armadas não são exorbitantes – embora de início possam parecer. "Gastos militares são sempre altos, portanto os valores sempre parecem absurdos. Mas o valor estimado [no plano de reequipamento militar] não é fora da realidade". Mas isso, segundo ele, não garante aprovação do orçamento pedido. "Se o Congresso vai aprovar? Só testando", diz o cientista político. (RWG)

Uma canetada do general Augusto Pinochet, ditador do Chile entre 1973 e 1991, tornou as Forças Armadas chilenas as mais bem equipadas da América do Sul até hoje. A Lei do Cobre obriga o país a destinar 10% das receitas com exportação do metal, o principal produto do Chile, para a compra de material bélico.

"Os chilenos têm blindados melhores, aviões tecnologicamente mais avançados e uma frota de navios superior à brasileira", afirma Expedito Bastos, especialista em Defesa da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Bastos diz que os chilenos não são os únicos que têm algum tipo de superioridade sobre o Brasil no continente. "A Colômbia está se equipando. O Uruguai tem forças terrestres mais modernas", afirma ele. Apenas a Venezuela, na opinião do professor – e de outros especialistas – blefa ao anunciar compras de mais equipamentos. "Talvez eles até tenham material, mas a dúvida é se sabem usar", afirma.

Erro brasileiro

Para o coronel Geraldo Cavagnari, os presidentes-generais que governaram o Brasil depois do golpe de 1964 erraram ao não criar uma lei semelhante à que vigora no Chile. "Foi a maior bobeada que deram", afirma o pesquisador, lembrando que hoje as Forças Armadas brasileiras não têm orçamento anual garantido para reequipamento.

O modelo chileno, porém, hoje é questionado dentro do próprio Chile. O atual governo, de Sebastián Piñera, cogita anular a Lei do Cobre. A presidente anterior, Michelle Bachelet, tentou o mesmo. A alegação é de que o porcentual fixo destinado às Forças Armadas elimina a possibilidade de crescimento maior da indústria do cobre.

Democracia

Os especialistas em defesa afirmam, porém, que não foi apenas a ditadura brasileira que errou na área militar. Depois do fim da redemocratização, sem lei para garantir investimentos, as compras de novos equipamentos foram minguando e não se investiu no setor. Expedito Bastos, da Universidade Federal de Juiz de Fora, lembra que, com a Nova República, em 1985, tudo que era militar passou a ser malvisto.

Para Bastos, devido à má visão dos militares, o Brasil deixou de se modernizar em um momento importante da evolução do armamento. "Perdemos a nossa indústria da defesa no início dos anos 90. E isso aconteceu exatamente na hora em que a mecânica estava interagindo com a eletrônica."

Apesar dos problemas, a análise dos especialistas é de que o Brasil, por seu tamanho, ainda não tem rivais à altura na América do Sul. "Quem atacar o Brasil vai perder", afirma o coronel Geraldo Lesbat Cavagnari, pesquisador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp. Para ele, a própria ausência natural de inimigos levou o Brasil a ter sempre uma postura pouco ativa na compra de armamentos. "Se você não tem perigo à vista, a tendência é se acomodar. Mas há um velho ditado militar que diz que, se você quer a paz, precisa se preparar para a guerra", diz o coronel, defendendo a necessidade dos novos investimentos.

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