Comportamento

Carolina Werneck

Inspirados em Harry Potter, alunos presenteiam professor daltônico com “óculos de quadribol”

Carolina Werneck
23/01/2018 12:00
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O professor Beau Scott usa seus óculos novos para resolver um cubo mágico. À frente, seus alunos. Foto: Reprodução/Facebook

O professor Beau Scott, da Escola Primária Dayton, em Indiana, Estados Unidos, levou um susto quando foi chamado à sala da diretora em um dia de dezembro do ano passado. Ela pediu que ele se sentasse e esperasse. Minutos depois, quando finalmente vieram pedir que ele fosse até sua sala de aula, as crianças começaram a lhe entregar “ferramentas mágicas” inspiradas no universo de Harry Potter. “Aqui está sua varinha, sua vassoura, seu cachecol e aqui estão seus goggles [óculos] de quadribol”, disseram, pedindo que ele ficasse de olhos fechados.
Quando Beau abriu os olhos, a magia realmente aconteceu. O professor, que é daltônico, conseguiu enxergar as cores da mensagem de “Feliz Natal” que seus alunos seguravam. “Minha nossa, eu consigo ver as cores!“, diz ele, em um vídeo publicado pelo jornal americano Journal and Courier. Acontece que os “goggles” eram, na verdade, óculos especiais comprados pelas crianças.
A iniciativa foi de duas alunas de Beau, Claire De LonNori Patterson. Em entrevista ao Viver Bem, o educador disse que seu daltonismo sempre foi motivo de brincadeiras durante as aulas. Os alunos, que têm entre 9 e 11 anos, ficam curiosos com a alteração na visão do mestre. “Eles sempre acharam isso muito interessante e sempre me pediam para explicar [como o daltonismo funcionava], mas isso é bem difícil.”
Veja o vídeo em que ele aparece recebendo o presente:
O verdadeiro presente
“Mesmo sendo adulto, ainda é um pouco tenso ser chamado à sala da direção”, ri Beau, contando que nem desconfiou da surpresa que as crianças organizavam. “Primeiro eu achei que eles estivessem preparando um chá de bebê, já que minha esposa daria à luz dali a mais ou menos duas semanas.”
Ele diz que os óculos vão ajudar a ver a beleza do mundo à sua volta como ele nunca pode fazer. “Aqui em Indiana é muito frio e cinza em muitos dias de inverno. Mas, como alguém que ama estar ao ar livre, correr e andar de bicicleta, estou realmente ansioso pela primavera e o outono deste ano. Mal posso esperar para ver as lindas cores das flores e a mudança das folhas na chegada do outono.”
Para o professor, entretanto, essa não é a maior beleza desses óculos. Orgulhoso da atitude das crianças, ele diz que o verdadeiro presente foi vê-las exercitando o altruísmo. “Eu realmente teria ficado feliz da mesma forma se eles tivessem feito isso por outra pessoa. Foram mais o pensamento e a ação envolvidos nisso que tornaram o presente tão especial.”
Perceber o impacto da verdadeira bondade mostrou a Beau que ele estava certo em acreditar que seus alunos podiam fazer coisas fantásticas. Ele conta que sempre tentou deixar a criatividade e a imaginação dos pequenos trabalharem.
Educação humana
Nascido em uma família de professores, Beau chegou à profissão, entre outras razões, justamente por causa do daltonismo. Quando entrou na faculdade, ele cursava computação gráfica. Ao entregar a renderização de um personagem, seu professor apontou que o cabelo do desenho tinha sido pintado em verde. O problema é que Beau achou que tinha usado o vermelho. “Esse foi o ponto em que eu percebi que aquilo não estava funcionando muito bem. Meu pai, minha irmã, meu avô, um tio e alguns primos são todos, ou foram em algum ponto, professores. Então, decidi transferir o curso para a área da educação.”
Atualmente ele ensina “altas habilidades“, disciplina que em alguns países é conhecida também como “classes de aceleração” ou “dons e talentos”. Entre outras coisas, durante as aulas ele e seus alunos constroem robôs e praticam programação de computadores. Para isso são usados, além dos conhecimentos técnicos, pesquisas sobre história, cultura, música, gastronomia e outras áreas muito diversas.
No vídeo abaixo, as crianças testam alguns robôs construídos por elas mesmas:
“Agora mesmo estamos trabalhando em um projeto em que eles pesquisam diferentes aspectos culturais dos países participantes dos Jogos Olímpicos de Inverno, que estão chegando. Na próxima semana eles serão responsáveis por criar uma receita para um prato e nós vamos compilar todas elas em um livro de receitas internacional.”
Beau diz acreditar que um dos motivos para que seu sistema de ensino funcione é o fato de que ele acompanha algumas das crianças por até três anos. Além disso, há um relacionamento muito próximo entre ele e as famílias de seus alunos. Claire, uma das meninas que organizaram a surpresa, é a terceira de sua família a ter aulas com ele.
“Minha filosofia educacional pode ser um pouco única nesse sentido. Eu sinto que é meu papel garantir que meus alunos tenham um ótimo fundamento acadêmico, mas também tento fazer com que se tornem indivíduos confiantes e bondosos, e faço isso desenvolvendo relações fortes com eles e com suas famílias.”
A construção dessa parceria faz com que ele se mantenha em contato com estudantes que frequentaram suas aulas ao longo dos anos. “Temos uma oportunidade que nenhuma outra profissão tem. Às vezes leva muito tempo para ver os frutos do nosso trabalho, mas, quando isso acontece, não há melhor sentimento no mundo”, opina ele. Alguns, como os que ele ensinou no período em que trabalhou em Londres, já se preparam para a universidade.
“Se você puder aprender a se interessar pela pessoa a nível individual, suas paixões, seus interesses, seus conflitos, e não simplesmente seu aprendizado acadêmico, você verá que ensinar se torna muito mais que apenas um trabalho. É uma forma de arte, um estilo de vida e uma das coisas mais recompensadoras do mundo.
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