Comportamento

Talita Boros Voitch

Clube incentiva autonomia das mulheres através do bordado

Talita Boros Voitch
18/04/2017 20:00
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A paranaense Amanda Zacarkim é uma das seis fundadoras do Clube do Bordado. (Foto: Gustavo Velho)

Dois corpos entrelaçados. Entre eles, algumas flores coloridas brotam. A aquarela marrom dá a cor dos cabelos da moça. Ou melhor, o contorno de um corpo feminino nu. Sozinho. Nos braços cruzados acima da cabeça pode-se ler “love yourself” (ame você mesma). Estes são alguns dos bordados do Clube do Bordado, coletivo feminino que usa e promove o bordado como ferramenta de independência e empoderamento de mulheres.
É isso mesmo. O bordado, prática comum das nossas avós, explorando temas pouco ortodoxos como a sexualidade feminina. As seis fundadoras do Clube têm cerca de 30 anos e se conheceram pelos corredores da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Cinco cursavam design de moda, e uma jornalismo, a paranaense Amanda Zacarkim. Dali nasceu a amizade, que levou todas para São Paulo. Na metrópole, os empregos superconectados e o pouco tempo para elas mesmas incentivaram o começo dos encontros semanais.
Uma das seis – Camila Lopes – era quem dominava a técnica do bordado. Informalmente, as amigas começaram se reunir para aprender a bordar, tomar vinho e conversar sobre a vida. Dos encontros nasceu oficialmente o Clube. Um convite para participar de uma feira com a temática PopPorn inspirou a primeira coleção com a temática soft porn. A partir dela, vieram novas coleções com outros temas contemporâneos do gosto pessoal das meninas, como filmes, cosmos e botânica.
“Acho que foi uma grande surpresa para o público da feira ao ver algo mais lúdico e menos explícito. Pensamos em algo como gostar do próprio corpo. Nossa ideia foi sempre valorizar a mulher, tanto é que nessa coleção havia vários tipos de corpos. Dos mais gordinhos aos super magros”, conta Amanda.
É importante mesmo dizer que a delicadeza tradicional do bordado não fica fora do trabalho do clube. Nenhum dos bastidores traz algo agressivo ou explícito. Muito pelo contrário. Elas usam linha e agulha para fazer um trabalho autoral, cheio de referências e com cara de arte, mas renegam essa diferenciação. “Nunca vimos problema em ter a pegada do artesanato. Inclusive eu desconfio muito da diferença entre o que é considerado arte e o que é artesanato. Essa distinção funciona para colocar as mulheres no seu devido lugar”, diz Amanda.
É nisso que está a graça do trabalho do Clube. Redescobrir o bordado e usá-lo para fortalecer as mulheres é um modo de subverter o preconceito que aponta o dedo para a “coisa de mulher submissa”. “O bordado nunca deixou de ser feito, mas como ferramenta de empoderamento é recente. E começamos a fazer sem muita teorização”, diz Amanda.
Algumas das criações do Clube do Bordado.
Algumas das criações do Clube do Bordado.
Do hobby ao negócio
Em 2015 o Clube começou a tomar corpo e virou oficialmente o trabalho oficial das seis. No ano seguinte, um coaching ajudou a dar a direção para onde elas deveriam caminhar. Passaram então a ministrar cursos de bordado para mulheres pelo Brasil, criaram um canal no Youtube e uma loja online para venderem os bordados produzidos. A loja ainda não está no ar, mas deve entrar a partir de maio. O canal já tem cerca de 14.700 inscritos e disponibiliza uma série de tutoriais e outras dicas para quem quiser começar a bordar.
Ainda neste mês o clube vai colocar no ar o “Gente que borda”, que pretende contar histórias de mulheres que mudaram a vida por causa do bordado. “Temos relatos de pessoas que saíram da depressão com o bordado ou conseguiram uma renda extra. É uma técnica muito simples, mas que pode fazer diferença para muitas mulheres. Queremos dar esse outro olhar para o bordado”, conta Amanda.
Amanda hoje está passando uma temporada na Holanda, onde faz mestrado em indústrias criativas. Sua tese vai (claro) falar do bordado e como a técnica pode ajudar na construção de identidades pessoais e coletivas. “O bordado tem a ver com o feminismo que não está só panfletando, mas que é uma prática. Pode ser algo útil na medida em que você se empodera e coloca ali aquilo que você gosta, a sensibilidade que você tem.”
As seis fundadoras do Clube.
As seis fundadoras do Clube.