especial

Crianças à mesa

Amanda Milléo
25/05/2014 03:04
Thumbnail
Se o espinafre, cenoura e tomate botam medo no seu filho, uma parte da solução pode ser levá-lo para frequentar a cozinha. Convidá-lo a ajudar no preparo das refeições e deixá-lo escolher frutas e legumes pode despertar nele o interesse por experimentar coisas novas.
Ir junto ao mercado, à feira, ver o que são as frutas, os legumes, o que é mais colorido, mais bonito, faz parte desse processo. "Ele vai comer melhor quando vir o que ele escolheu, o que ele preparou sendo colocado para a família", explica a professora Claudia Bettega de Almeida, da disciplina de nutrição materno infantil da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
A dificuldade em aceitar alimentos novos ocorre principalmente com as crianças até os 6 anos, pois a fase pré-escolar é também conhecida como "neofobia alimentar". "A criança rejeita novos alimentos e só come aquilo que lhe é familiar. Se nesse período ela se acostumou apenas com o arroz, feijão e carne, não vai querer outro prato", diz Claudia. Deixar à disposição da criança os alimentos que ela rejeita é uma das táticas que os nutricionistas indicam, seja no armário com fácil acesso ou mesmo no prato do almoço e do jantar. Mesmo que a criança não goste, em algum momento ela pode ceder, seja porque viu algum colega comendo ou resolveu dar uma chance à salada. Nesse momento, é importante que os pais mostrem como foi gostoso e apresentem outros alimentos que ela rejeita, sem forçar. "É preciso paciência, educar com carinho e não com o chinelo sobre a mesa", diz a docente de nutrição da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Norka González.
Alguns artifícios podem causar mais dores de cabeça do que trazer soluções duradouras. Ao esconder a beterraba na massa da panqueca ou colocar o tomate no meio da carne que ela adora, os pais devem cuidar para não deixar resquícios. "Sempre é melhor negociar com a criança, pois uma vez descoberto o alimento ‘escondido’, a chance de rejeitá-lo para sempre é maior. A melhor forma de inserir sem que se perceba é em uma sopa, vitaminas ou nos recheios de massas, sempre junto a alimentos que a criança tenha preferência, para que a refeição seja mais atrativa", sugere a nutricionista associada à Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica, Flávia Sguario.
Fora de casa
Se o dia a dia impede que a maioria das refeições seja feita em casa, mudar os hábitos alimentares dos pequenos nos restaurantes não é impossível. Em vez de esperar na mesa enquanto os pais escolhem o que a criança vai comer, ir junto ao bufê e negociar o prato traz mais satisfação e vontade. "A interação ajuda na educação nutricional, pois ela vai ter o poder de decisão, vai saber o que é melhor para a sua saúde, vai escolher aquilo que gosta e o que deve comer, além de se sentir independente e importante", explica Flávia Sguario.
Deixar o prato bem colorido também ajuda a chamar a atenção, especialmente dos menores de 6 anos. "O mundo imaginário da criança é muito rico. Sempre coloque algo da cor verde escura, laranja e amarelo que são as principais fontes de vitamina A e C, fundamentais para o desenvolvimento", sugere Norka González.
Ao redor do mundo
Os brasileiros têm muito a aprender com os hábitos de franceses e norte-americanos
A dieta brasileira parece se situar bem no meio de duas culturas, entre os hábitos europeus e norte-americanos. E é na organização das refeições que reside a principal diferença entre a rotina alimentar de crianças norte-americanas e francesas, segundo a escritora canadense Karen Le Billon, no livro Crianças Francesas Comem de Tudo, pela Editora Alaúde.
"Na França, as crianças comem de três a quatro refeições por dia e em horários fixos, enquanto que em países de influência anglo-saxônica, os horários são indefinidos, ao longo do dia. Assim, não são feitas refeições, mas lanches", diz ela.
Refeições diferentes modificam também a forma de participação das crianças à mesa. Na França, comer junto é sagrado. "Sempre que a família pode, compartilha as refeições", diz a nutricionista francesa Paule Neyrat. "Nos Estados Unidos isso é raro, também pelo excesso de atividades extraescolares das crianças, que complicam os horários", conta Le Billon.
Para o pediatra americano e professor na Universidade de Stanford Neville Golden, isto tem feito os norte-americanos abolirem a necessidade de sentar para comer. "As crianças têm comido no sofá, na frente da televisão, sendo ainda expostas à publicidade de industrializados de altas calorias", diz.
Com colaboração de Tatiana Marotta