sala de visita

Uma má notícia

Adriano Justino
18/04/2013 03:24
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Além do doloroso processo de aceitação da condição de portador de uma doença grave, pais que se descobrem nesta situação têm também de enfrentar o desafio de comunicar aos filhos sobre o processo pelo qual passam e os tratamentos que irão atravessar.
Segundo a psicóloga Luciana Ma­­zorra, doutora em Psicologia Clínica pela PUCSP e co-organizadora do livro Luto na Infância: Inter­­venções Psicológicas em Dife­­rentes Contextos, o melhor a fazer, em todos os casos, é falar, mesmo às crianças de menor idade:
Por que muitos pais decidem esconder dos seus filhos a notícia de que têm um câncer ou doença grave?
Os pais temem assustar seus filhos e que eles possam não suportar a dura realidade. Pode ser ainda uma tentativa de evitar entrar em contato com os sentimentos que o fato de ter uma doença grave e potencialmente fatal provoca. Ao contar para os filhos os pais têm de contar para si mesmos e olhar seus próprios medos. Esse olhar para dentro pode ajudar a sentirem-se mais capazes de lidar com os seus sentimentos e de seus filhos.
Esconder o fato é uma atitude positiva? Quais os erros mais comuns dos pais nessa situação?
Esconder dos filhos que se tem uma doença grave e construir um segredo em família dificulta o enfrentamento da situação por todos e a descoberta de seus recursos para lidar com o fato. Ao omitir a verdade da criança, a mensagem é que esta realidade é tão terrível, que nem eles, nem a criança, são capazes de lidar com ela. Pelo contrário, quando a verdade é dita, os pais mostram que, por mais difícil que seja uma situação, é possível enfrentá-la, vivenciar os sentimen­tos que a doença provoca e descobrir recur­sos para encará-la e manter a esperança.
O que é importante que elas saibam sobre a doença? E o que não é importante que elas saibam?
Quando os pais são receptivos às perguntas das crianças, elas mesmas vão mostrar o quanto querem saber e se são capazes de entender a respeito da doença. É importante que elas saibam que embora seja uma doença grave, os pais estão em tratamento e lutando pela sua cura. Expectativas não realistas não devem ser dadas, mas assim como deve haver espaço para que o medo de perder os pais possa ser expresso, também deve haver espaço para a esperança de que eles fiquem bons.
Bebês conseguem entender quando algo não vai bem?
Mesmo para os bebês é importante que os pais contem a verdade a respeito de sua saúde. Os bebês são muito sensíveis às mudanças em sua família, especialmente ao estado emocional de sua principal cuidadora, geralmente a mãe. Quando os pais podem falar a respeito, inclusive de seus medos, embora os bebês não sejam capazes de compreender da mesma forma que a criança mais velha, haverá menos risco de ele apresentar alterações de comportamento ou adoecer em decorrência de sentimentos e angústias não verbalizados e aceitos na família.
A mesma orientação vale para crianças mais velhas?
Ao se falar com a criança deve-se sempre levar em conta seus recursos cognitivos e de comunicação. A criança pequena é muito egocêntrica e tende a achar que seus pensamentos podem causar ações na realidade. Por esta razão, tendem a se sentir mais culpadas em situações de doença ou morte na família. É importante que os pais deixem claro que sua doença não foi provocada por ninguém e que ela não deve se sentir culpada.Crianças em idade escolar, entre 6 e 9 anos de idade aproximadamente, entendem a causalidade das doenças e da morte e costumam ser muito interessadas em compreender o funcionamento do corpo e a origem das doenças. Caso elas manifestem este interesse, é importante que os pais possam explicar em uma linguagem simples e clara, não além do que elas desejam saber. Como já têm uma vida social própria e está mais em contato com a mídia, dependendo da doença é possível que tenha ouvido falar a respeito ou sobre pessoas que a tiveram. É importante explorar o que ela sabe a respeito e quais são seus medos e expectativas.
Pré-adolescentes e adolescentes devem saber de tudo?
O pré-adolescente e o adolescente, embora tenham mais recursos cognitivos para compreender a doença e acesso a ainda mais informação, estão passando por um momento mais sensível, de transição, o que pode deixá-los mais resistentes a conversar a respeito. Além disso, o próprio fato de terem uma maior compreensão a respeito e consciência dos riscos, pode provocar maior angústia e resistência. O ideal é respeitar o que ele deseja saber sobre a doença e o quanto quer falar a respeito.
A preocupação dos pais pode refletir negativamente na saúde dos filhos?
As preocupações dos pais que estão enfrentando uma doença grave são impossíveis de serem evitadas: Como será a nova etapa do tratamento? Haverá muitos efeitos colaterais? Irei sobreviver? Como meu filho ficará se eu morrer? Quem cuidará dele? Quando os pais mostram para os filhos que embora tenham medo, preocupação e tristeza diante da doença, também têm força, determinação, esperança e estão lutando pela vida, transmitem segurança e ensinam que diante de situações muito difíceis como uma doença grave, é normal e esperado ter medo e ficar triste, mas também temos força pra lutar e descobrimos recursos antes desconhecidos.
A criança pode "participar" de algum modo no tratamento?
A criança pode participar sempre se respeitando aquilo que ela pode fazer, não sobrecarregando- a ou invertendo os papéis, ou utilizando-a como fonte de apoio principal. Ao ajudar com pequenas coisas, a criança sente-se útil e importante no processo de tratamento do genitor.
Os pais devem envolver a escola neste processo?
Sim, é importante que a escola saiba que a criança e sua família estão enfrentando um momento difícil, que possa acolhê-los e estar atenta para possíveis mudanças de comportamento, humor e queda no desempenho escolar. É muito importante que a criança não se sinta só, isolada na sua dor e até mesmo discriminada.