Saúde e Bem-Estar

Amanda Milléo

Médicos prescrevem passeios a museus como parte de tratamento de doenças importantes

Amanda Milléo
10/11/2018 14:14
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Além da caminhada, um passeio pelo museu tira o visitante da rotina e favorece a produção de hormônios da felicidade (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)

Ao pisar em um museu, o visitante adentra um mundo diferente. Lá estão obras de artistas nacionais e internacionais, feitas com diferentes materiais, que provocam sensações ora de conforto, ora de estranheza, mas que geram benefícios importantes para a saúde — embora nem todo mundo se dê conta.
Dentro das células, hormônios como a endorfina e a serotonina (aqueles responsáveis por gerar prazer para o organismo) são secretados com mais afinco quando saímos da nossa correria diária e conseguimos apreciar uma obra de arte ou uma música orquestrada. Uma vez produzidos, esses hormônios colaboram com a sensação de bem estar, reduzindo a produção do hormônio cortisol (ou o culpado pelo estresse) e até mesmo fortalecendo o sistema imunológico.

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Ir a um museu, portanto, pode contribuir com a prevenção de infecções, como um resfriado: 

“Entre grupos de pessoas que têm uma saúde um pouco mais frágil, especialmente os idosos, todas essas atividades [idas a museus ou a concertos de música e arteterapia] acabam fazendo com que eles tenham menos intercorrências de saúde”, explica Myrna Campagnoli, médica endocrinologista e pediatra, e diretora médica do laboratório Frischmann Aisengart. 

Apreciar obras de arte ajudam a saúde de maneiras que nem todo mundo conhece (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Apreciar obras de arte ajudam a saúde de maneiras que nem todo mundo conhece (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Quando descobriram esses benefícios em estudos, médicos canadenses resolveram testá-los na prática e um projeto entre os médicos francófonos do Canadá e o museu das Belas-Artes de Montreal indica a prescrição de visitas gratuitas ao museu como parte do tratamento.
Por lá, desde o dia 1º de novembro, os médicos podem incluir até 50 idas ao museu como parte do tratamento de diferentes doenças. A iniciativa, considerada a primeira do tipo no mundo todo, engloba também os familiares e cuidadores da pessoa doente.
“O projeto se dirige, por exemplo, às pessoas que convivem com distúrbios alimentares, como a anorexia e bulimia, deficiências intelectuais, pessoas dentro do espectro do autismo, arritmia cardíaca, epilepsia, mal de Alzheimer, problemas de saúde mental, bem como as vítimas de câncer e pessoas idosas”, sugere o comunicado enviado pelo museu à comunidade
A confiança no projeto é tamanha, que a diretora geral do museu canadense Nathalie Bondil afirmou, no comunicado enviado à imprensa, que a cultura, no século 21, será para a saúde o que o esporte e as atividades físicas foram no século 20.

“A experiência cultural contribuirá para a saúde e bem-estar da mesma forma como praticar esportes contribui para a nossa aptidão física. Para os céticos, lembrem-se, apenas cem anos atrás dizia-se que o esporte distorcia corpos e ameaçava a fertilidade das mulheres”, lembra Bondil.

Além da caminhada, um passeio pelo museu tira o visitante da rotina e favorece a produção de hormônios da felicidade (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Além da caminhada, um passeio pelo museu tira o visitante da rotina e favorece a produção de hormônios da felicidade (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)

Em busca da tranquilidade

Caminhando devagar e prestando atenção a cada detalha da exposição “Ásia: a terra, os homens, os deuses”, a estudante Kathlen Kose sabe bem o que aquela manhã de sábado no Museu Oscar Niemeyer (MON), em Curitiba, vai lhe causar.
“Acho que o museu me acalma. Você entra em um mundo bem diferente, seja em uma imersão ao passado ou, se é em um museu tecnológico, uma espiada no futuro. Se você está estressado, vir ao museu te deixa mais tranquilo”, explica a jovem de 21 anos, que vive em Blumenau.
Kathlen Kose, estudante de 21 anos, apreciando as obras em exposição no MON (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Kathlen Kose, estudante de 21 anos, apreciando as obras em exposição no MON (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Atrás da tranquilidade também vieram as mulheres Danielle Cardoso, estudante de Direito de 34 anos, com a filha Amanda, de cinco anos, ao lado de Sandra e Elizete Maria da Silva, de 47 e 56 anos, respectivamente, ambas secretárias.
Danielle Cardoso com a filha Amanda e a Sandra Maria da Silva e Elizete Maria da Silva aproveitam a estrutura montada no meio do museu (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
Danielle Cardoso com a filha Amanda e a Sandra Maria da Silva e Elizete Maria da Silva aproveitam a estrutura montada no meio do museu (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
“Eu tinha mais tranquilidade antes, quando não tinha a pequena e não precisava me preocupar com ela correndo por aqui. Mas, no museu, você se concentra e se obriga a focar em uma obra, em uma atividade diferente, e isso ajuda a sair da rotina”, explica Danielle, que estava apreciando a estrutura de estante e livros montada no meio do museu.
Já o carioca João Ataliba, de 52 anos, pensa como todo engenheiro civil: analiticamente racionaliza as suas expectativas com relação aos museus que visita. “Não sei se as obras me tranquilizam, depende do museu e da exposição. Pode ser que ela me traga, depende também da pessoa. O que o museu me proporciona, e isso é fato, é que aqui eu consigo respirar, saio da correria. É, de fato, um lugar tranquilo.”
O carioca João Ataliba sabe que, independentemente das obras expostas, todos os museus que visita lhe trazem tranquilidade (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
O carioca João Ataliba sabe que, independentemente das obras expostas, todos os museus que visita lhe trazem tranquilidade (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
A visão de João explica porque não há como saber quantas idas aos museus são necessárias para trazer um resultado efetivo à saúde: depende de como cada visitante reage às obras, conforme explica Myrna Campagnoli, médica endocrinologista.
“Não há como prescrever uma quantidade geral, porque depende do impacto disso em uma pessoa. Em pessoas mais sensíveis a uma obra específica, uma ida pode ser suficiente, mas para outra pessoa, pode ser preciso uma quantidade maior”, diz.
Mesmo nunca tendo conhecido um museu antes, o casal Maykon Cardoso e Estella Mayara Moreira de Souza sentiram que o local era diferente de tudo que haviam visitado. Moradores de Terra Boa, cidade de 12 mil habitantes, a 81 km de distância de Maringá, o analista de sistemas de 26 anos e a estudante de 21 anos perceberam a mesma característica que os demais visitantes: a tranquilidade.
A visita do casal Maykon e Estella ao MON foi a primeira vez que eles conhecem um museu (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
A visita do casal Maykon e Estella ao MON foi a primeira vez que eles conhecem um museu (Foto: Amanda Milléo / Gazeta do Povo)
“É diferente, é calmo e tranquilo. Não sei dizer se ajuda nos tratamentos a doenças, mas com certeza é um ambiente em que você se sente mais calmo”, diz Estella, enquanto apreciava as peças na exposição Luz ~= (aproximadamente) Matéria.
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